- O Globo
Paulo Guedes tem falhado na comunicação. Tem falado muito, mas sempre de improviso e sem contraditório. Em vez de esclarecer, provoca ruídos
O ministro Paulo Guedes terá que mudar radicalmente sua forma de se comunicar se quiser convencer os brasileiros das muitas reformas que planeja conduzir no país. Durante a transição, e em pouco mais de um mês de governo, ele não deu qualquer entrevista coletiva organizada. Fala em rápidas intervenções quando parado pelos repórteres. Faz apresentações a empresários e nelas solta frases fortes. Pela falta do contraditório, consegue apenas gerar mais confusão.
Foi assim com o Sistema S, com as reformas da previdência, trabalhista e a da desvinculação. A da Previdência permanece envolta nas brigas internas do governo. Não se sabe o que ela será, mas o que tem vindo a público está desconjuntado. Pode ser ou não aproveitada a reforma do governo Temer, pode ser idade mínima igual para homens e mulheres, ou diferente, pode haver um estímulo à natalidade embutido na reforma, os militares podem ou não ser incluídos. Quando há informação para todo o gosto, o nome disso é ruído.
Na quarta-feira, ao falar para uma plateia de empresários reunidos pelo site Poder 360, ele disse que conhece mais viúva que viúvo. “Elas duram mais”. Então concluiu: a idade tem que ser igual. Mas pode também ser diferente, pelo que explicou. “Se teve um filho, fica um ano a menos. Um ano a menos até determinado limite. Tem que tomar cuidado com Dona Maria que pode ter 13 filhos, não queremos estimular isso.”
A proposta é toda ruim. Confirma a ideia de que cuidar dos filhos é obrigação da mulher e não do casal, como modernamente se entende. O subsídio beneficiará a classe média, que tem menos filhos e tem registro profissional. “O Bolsonaro acha que as mulheres deveriam ter 60 anos”, disse o ministro, nessa mesma apresentação. Isso é pior do que a reforma do governo Temer. Vários países hoje igualam a idade de aposentadoria.
Sobre a reforma trabalhista, o ministro da Economia repetiu ao Poder 360 o que tem dito a empresários. Que o jovem poderá escolher: “porta da esquerda: Carta del Lavoro, Justiça Trabalhista, sindicato, você tem proteção, você tem tudo, as empresas têm que pagar, mas quase não tem emprego. É o sistema atual. Porta da direita: novo regime trabalhista e previdenciário, não tem nada, se seu patrão fizer alguma besteira com você e te tratar mal, vai para a Justiça comum, é privado, privado, privado.”
Falta explicar muita coisa. E é nisso que faz falta o contraditório, para que ele informe melhor. O que acontecerá com os direitos trabalhistas que estão em cláusula pétrea da Constituição? Quem mandará todos os juízes trabalhistas fecharem as portas dos tribunais para os jovens que entrarem pela “porta da direita”?
O ministro continuou com sua sequência de improbabilidades: “com um ano e meio todo mundo vai olhar e ver que, ao contrário do que acontece no mundo inteiro, com 50% dos jovens desempregados, aqui vai ter 100% de jovens empregados.”
O mundo não tem 50% de jovens desempregados. O desemprego é sim maior entre jovens. Em alguns países como Espanha, Grécia e Itália chega a níveis altíssimos, na casa de 30%, mas na própria zona do euro a média é bem menor, 16%. Na Alemanha (6%) e nos EUA (8,8%) o sistema trabalhista é mais flexível, e isso poderia confirmar a tese do ministro se ele não exagerasse tanto ao prometer o impossível: desemprego zero em um ano e meio e um mercado de trabalho sem leis.
O que foi explicado aos jornalistas, depois, é que o ministro está pensando em copiar a forma de entrada no FGTS, que foi opcional. Na verdade, era uma opção compulsória. O jovem trabalhador chegava no seu primeiro emprego, nos anos 1970, e era obrigado a optar pelo FGTS em vez do sistema antigo de estabilidade. O sistema anterior estava de fato ameaçando as empresas, mas quem não aceitasse “optar” não era contratado. Isso foi na ditadura. Na democracia, tudo passa pelo convencimento e pelo sistema de pesos e contrapesos. Menos de 24 horas depois, Guedes teve que explicar que a reforma trabalhista virá depois de aprovada a Previdência. Ao mesmo tempo, o ministro tem falado com prefeitos e governadores que apresentará uma PEC para desvincular e desindexar receitas e despesas.
São várias as batalhas na economia. As chances de sucesso aumentam com uma comunicação mais organizada, clara e, principalmente, democrática.
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