Popularidade em queda: Editorial | O Estado de S. Paulo
A nova pesquisa CNT/MDA, divulgada ontem, mostrou que mais da metade dos brasileiros – 54% – desaprova o desempenho pessoal de Jair Bolsonaro. É a primeira vez que esse patamar majoritariamente negativo em relação à atuação do presidente da República é atingido.
A avaliação do governo tampouco é alvissareira. Dobrou o porcentual dos que o classificam como “ruim ou péssimo”, saltando de 19% em fevereiro para 39% em agosto. No início do ano, de acordo com a mesma pesquisa, 39% dos entrevistados consideravam o governo “ótimo ou bom”. O número de satisfeitos caiu para 29% em agosto.
Esses resultados são particularmente preocupantes porque Jair Bolsonaro tem apenas oito meses de mandato e a curva histórica das pesquisas realizadas no período lhe é bastante desfavorável. Em outras palavras: à medida que o tempo passa e o presidente é instado a agir diante das mais variadas questões que lhe são postas, cada vez mais brasileiros parecem se dar conta de que à frente do governo está alguém inapto para apresentar as soluções para os graves problemas nacionais.
Para qualquer governante minimamente sensato e cioso de seu papel numa República democrática, pesquisas de opinião deveriam servir de base para uma reflexão honesta sobre os rumos do governo. Eventuais percepções negativas da sociedade deveriam ser tomadas como sinais de alerta. No entanto, o presidente Jair Bolsonaro não tem se notabilizado por ser um arguto leitor dos vários sinais emitidos pela população. Ao que parece, optou por fechar-se em suas próprias convicções e preconceitos e fazer deles o critério único para seu processo de tomada de decisão. Não surpreende, portanto, que a opinião pública reaja negativamente.
Se a pesquisa CNT/MDA diz muito sobre o desempenho do presidente Jair Bolsonaro, diz igualmente sobre a abissal distância que separa os fatos e a sua percepção pela sociedade. O levantamento mostrou que 31,3% dos respondentes avaliam que a melhor área de atuação do governo é o combate à corrupção. Ora, se há uma área hoje em que o presidente Jair Bolsonaro tem sido criticado com bastante ênfase é justamente o combate à corrupção. O presidente tem sido pessoalmente acusado de usar o poder do qual está revestido para interferir na administração da Polícia Federal, da Receita Federal e de órgãos de controle como o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), agora vinculado ao Banco Central.
Por trás de todas essas ações do governo – particularmente do presidente Jair Bolsonaro – estaria uma tentativa de dificultar a apuração de supostos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e outros ligados às atividades de milícias no Rio de Janeiro que teriam sido cometidos por membros de seu círculo mais próximo, incluindo membros de sua família.
É curioso ainda que 8% dos respondentes avaliem como uma das melhores práticas do atual governo a política de privatizações, já que são escassas as estatais privatizadas na gestão de Jair Bolsonaro. Ao que parece, intenções ou meros comunicados são tomados como fatos consumados por uma parcela da população. Isso é um perigo porque quanto menor a capacidade da sociedade de discernir o que são fatos – e seus desdobramentos na vida prática da Nação – e o que são versões, mais sujeita à manipulação ela estará.
É improvável que o presidente Jair Bolsonaro receba o resultado da pesquisa CNT/MDA como um sinal de alerta sobre sua forma de governar. Um sinal de que fora eleito não apenas pelo nicho de apoiadores mais aguerridos de sua agenda extremada, mas por uma parcela mais ampla de brasileiros há muito descontentes com os desmandos dos governos do PT e ávidos por um governo que resgatasse os valores republicanos perdidos em nossa história recente. É de esperar que Jair Bolsonaro continue a crer que sua eleição representou tamanha ruptura com a “velha ordem” que a ele é dado governar desconsiderando o conjunto de brasileiros, que nem sempre endossam suas ideias. Resta saber por quanto tempo durará a ilusão.
Questão ambiental está oculta na disputa comercial: Editorial | O Globo
Macron situou livre comércio com Mercosul como problema real de competição para a França
A dimensão da crise ambiental brasileira não pode ser subestimada. É uma fragilidade antiga, realçada agora no governo Jair Bolsonaro com a multiplicação de incêndios na Floresta Amazônica. Novidade é o uso desses problemas ambientais em disputas político-comerciais com o Brasil, como fez o presidente Emmanuel Macron no fim de semana.
Macron levou o desmatamento crescente na Amazônia para debate na reunião de cúpula do G-7 (Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido). Em público, citou a possibilidade de uma recusa da França a ratificar o recém-assinado acordo da União Europeia com o Mercosul.
Macron, dessa forma, situou o livre comércio com o Mercosul como um problema real de competição no agronegócio para a França. Foi ironizado pelo líder britânico Boris Johnson. E contraditado pela chanceler alemã Angela Merkel.
Ela viu no acordo UE-Mercosul uma chance política: usá-lo, sim, mas para delimitar a liberalidade da política ambiental do governo Bolsonaro, sobretudo na Amazônia.
Com maestria diplomática, Merkel completou sua proposta com o anúncio de que procuraria o presidente brasileiro para uma conversa sobre possível colaboração europeia na política para a Amazônia.
O problema é que se em Brasília existe um plano para a Amazônia, nem o Congresso conhece. O governo apenas reage. No sábado, enquanto o G-7 debatia, anunciaram-se as primeiras medidas contra os múltiplos incêndios que devastam a floresta e a imagem do Brasil. Entre as iniciativas, o emprego das Forças Armadas, o uso de aeronaves da FAB para combate ao fogo e a promessa de desbloqueio de R$ 28 milhões previstos no Orçamento para suporte à operação militar.
Medidas necessárias, e tardias, para debelar o fogo gerado pelo próprio governo na sua errática política ambiental, comandada pelo ministro Ricardo Salles.
Desde a campanha eleitoral, Bolsonaro anunciava uma liberalização extremada, por isso mesmo perigosa, na área de meio ambiente, com redução do ritmo de fiscalização do Ibama e do Instituto Chico Mendes (ICMBio). “Essa festa vai acabar”, disse, ao prometer oxigenar um setor onde há tempos estão alinhados ONGs, burocratas e organizações de esquerda. Assumiu e deu curso a um desmonte dos órgãos de controle ambiental.
Em sua cruzada, Bolsonaro já propôs transformar a Estação Ecológica de Tamoios, um santuário em Angra dos Reis, na Costa Verde fluminense, numa Cancún brasileira. E demitiu o diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Ricardo Galvão, depois de discordar de dados divulgados pelo órgão sobre aumento do desmatamento na Amazônia. Acabou cercado pelos incêndios na floresta.
Para europeu ver: Editorial | Folha de S. Paulo
Bolsonaro aviva entrevero com Macron, enquanto surgem paliativos para o desmate
O governo de Jair Bolsonaro (PSL) colhe o que plantou, no terreno da Amazônia, desde sua grosseria inicial a um dignitário francês —poucas semanas atrás, o presidente desmarcou em cima da hora uma reunião com o chanceler da França e foi cortar o cabelo, o que fez questão de divulgar.
O desmate já se alastrava, então, pela floresta amazônica, mais valorizada por europeus que por certos brasileiros. E com razão se incomodam os estrangeiros, porque o carbono nela estocado, ao chegar à atmosfera por queima ou apodrecimento da mata derrubada, agrava o aquecimento global.
Bolsonaro milita nas fileiras obscurantistas que negam ou desdenham a mudança climática. Agastado com estatísticas de devastação apuradas por satélite pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), acusou especialistas de mentir e exonerou seu diretor.
O presidente e seu cúmplice no Ministério de Meio Ambiente, Ricardo Salles, já haviam posto sob suspeita e ameaça o relevante Fundo Amazônia, formado com doações da Noruega e da Alemanha. Bastou somarem-se a essas provocações algumas imagens fortes de queimadas para o circo pegar fogo.
Emmanuel Macron, o presidente francês, aproveitou a oportunidade de perfilar-se na cúpula do G-7 como líder esclarecido. Felizmente, havia na sala de reunião políticos mais moderados, como a chanceler alemã Angela Merkel, para pôr panos quentes na proposta de rever o acordo UE-Mercosul.
Nos salões da diplomacia, o presidente brasileiro se comporta como um valentão de redes sociais. Parece acreditar que tudo se resolve com impulsividade.
No poder, demonstra que não aprende nem com a experiência: reincidiu na grosseria atingindo novo patamar de baixeza, ao zombar da esposa de Macron.
Ao menos Bolsonaro ensaia um recuo e mobiliza o Exército para combater incêndios cuja existência faz pouco punha em questão. Antes tarde do que nunca.
Cabe lembrar, porém, que o governo federal vinha ignorando apelos do Ibama e do ICMBio por reforços para impedir algo como o “dia do fogo” convocado por ruralistas na área conflagrada de Novo Progresso (PA). E, ainda, que Salles muito tem feito para desacreditar, desaparelhar e incriminar esses dois institutos de sua pasta.
Não fica tanto atrás, em matéria de hipocrisia para as câmeras, a oferta primeiro-mundista de aviões para apagar queimadas. Não faltam homens e aeronaves; falta uma política consistente de combate ao desmatamento, que se concentra em apenas 0,5% das propriedades rurais e raramente se faz com o devido licenciamento.
Faltam, enfim, consistência, veracidade e consequência no Planalto. Com Bolsonaro, viraram fumaça.
Atividade fraca mantém a inflação sob controle: Editorial | Valor Econômico
A inflação deixou de ser foco de preocupação dos economistas nos últimos meses. Os índices de preços vêm se mantendo bem-comportados, apesar das turbulências nos mercados financeiros, ao contrário do que ocorria no passado. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo-15 (IPCA-15), prévia da inflação oficial do país, surpreendeu ao desacelerar para 0,08% em agosto na comparação com 0,09% registrado no mês anterior, informou na semana passada o IBGE. Foi a menor variação para o mês em nove anos e ficou no piso das estimativas dos analistas, balizando as expectativas para o IPCA do mês fechado. No acumulado em 12 meses, a variação também está em baixa, e ficou em 3,22%.
A queda de 0,45% do preço dos alimentos surpreendeu e foi explicada por uma temporada favorável de chuvas, que aumentou a oferta dos produtos. Ficaram mais baratos alimentos importantes na mesa brasileira como o feijão-carioca e o tomate, que contribuíram para reduzir os gastos da alimentação dentro de casa. Gasolina caiu 1,88%; e as passagens aéreas, passado o período de férias, despencaram 15,57%. A queda do combustível reduziu o IPCA-15 em 0,08 ponto percentual, e a das passagens aéreas em mais 0,07 ponto percentual.
Esses itens serviram de contrapeso ao aumento da conta de luz, que subiu 4,91% com o acionamento da bandeira tarifária vermelha, depois de ter subido 1,13% em julho. Desta vez, o reajuste foi mais intenso em São Paulo, onde alcançou 7,51%. Em consequência, a região metropolitana de São Paulo apresentou o índice mais alto de inflação das 11 regiões pesquisadas, de 0,31%. O menor índice foi registrado em Goiânia, onde houve deflação de 0,29%, em função da queda nos preços da gasolina. Outras cinco regiões metropolitanas das 11 pesquisadas registraram deflação em agosto.
O resultado do IPCA-15 contribuiu para influenciar a revisão para baixo das previsões para o IPCA do mês fechado de agosto, chegando a reduzir pela metade o número esperado por algumas instituições. O IPCA de julho já havia surpreendido com a variação de 0,19%, a menor taxa para o mês em cinco anos. No acumulado em 12 meses, ficou em 3,22%, 1 ponto percentual abaixo do centro da meta de inflação, fixado em 4,25%. Houve revisão também dos resultados esperados para o ano. Pesquisa Focus divulgada nesta segunda-feira mostrou a redução da mediana da inflação prevista pelas instituições financeiras e consultorias ouvidas de 3,71% para 3,65%, mais de meio ponto abaixo do centro meta da inflação, de 4,25%. As top 5 que mais acertam os prognósticos falam em 3,5%.
A recente estirada do dólar chegou a levantar a preocupação com o impacto da pressão do câmbio na inflação. Mas os registros do IPCA-15 indicam que esses temores são infundados. No período em que o IPCA-15 de agosto foi apurado, de 13 de julho a 13 de agosto, o dólar subiu cerca de 7%, passando de R$ 3,73 para pouco mais de R$ 4. Mas não teve espaço para mudar a trajetória do índice. Desde 1 de agosto, quando o IPCA começa a ser calculado, o dólar já avançou perto de 8%, e a cotação supera os R$ 4,15. Economistas discutem a partir de qual nível o dólar levaria à alta da inflação. Esse, porém, é um fator fora de controle, atrelado ao cenário internacional, determinado pelos rumos da briga comercial entre os Estados Unidos e a China.
Por outro lado, as forças que seguraram o IPCA-15 em agosto seguem atuantes, entre elas o recuo dos preços dos alimentos. Mas sobressaem os motivos negativos: a demanda fraca, que não abre espaço para o repasse de preços, consequência da economia estagnada e do desemprego ainda elevado. Há ainda a capacidade ociosa das indústrias, situação agravada pela crise na Argentina. O endividamento das famílias parece ter voltado a crescer e também restringe o consumo. Nem mesmo a liberação do saque de R$ 500 das contas do FGTS deve mudar significativamente esse quadro. O Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre, a ser divulgado nesta semana, vai dimensionar o tamanho do problema. O consumo equivale a 63% do PIB.
O patamar atual da inflação, porém, ao lado do andamento das reformas econômicas, mantém aberto o caminho para o Banco Central (BC) continuar cortando os juros, o que pode resultar em ânimo para o nível de atividades. Um fator de risco no horizonte é uma escalada na crise internacional que acentue a saída de capital estrangeiro e pressione mais o câmbio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário