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Vivandeiras – Editorial | O Estado de S. Paulo
Ao invocar a possibilidade de edição de um “novo AI-5”, Eduardo Bolsonaro externou o que pensa o grupo que ora está no poder, a começar pelo seu pai, o presidente Jair Bolsonaro
O arroubo do deputado Eduardo Bolsonaro, que invocou a possibilidade de edição de um “novo AI-5” para enfrentar opositores, não foi um exagero retórico. Ele externou o que pensa o grupo que ora está no poder, a começar pelo pai, o presidente Jair Bolsonaro, que passou toda a sua vida como político a lamentar o fim da ditadura.
O objetivo é claro: dar vida ao que deveria estar morto e enterrado. O bolsonarismo desde sempre pretende acostumar os ouvidos da sociedade a ideias autoritárias como solução para os problemas nacionais. O método é escorar-se na liberdade de expressão e na imunidade parlamentar, dois dos pilares da democracia liberal, para acalentar a possibilidade de instalação de um regime de exceção, em que essas mesmas liberdades, entre outras tantas, são sumariamente cassadas.
De certa forma, a eleição de Jair Bolsonaro à Presidência da República, mesmo depois de décadas defendendo reiterada e inequivocamente o regime militar, a tortura, o banimento (e até o fuzilamento) de opositores e o silenciamento da imprensa, é um preocupante indicativo de que parte da sociedade já se deixou seduzir pelo discurso antidemocrático.
Para a parcela mais radical dos eleitores de Bolsonaro, que o trata como “mito” e o segue fanaticamente, o pacto pela transição para a democracia foi imperdoável traição aos ideais da ditadura militar. Graças ao sucesso eleitoral de Bolsonaro, essas vivandeiras não se sentem mais constrangidas em demandar abertamente o fechamento do Congresso, sob o argumento de que se trata de um valhacouto de corruptos que tramam contra o Brasil; exigir a interdição do Supremo Tribunal Federal, visto como um antro de advogados que defendem petistas e minorias em geral; e torcer pela asfixia da imprensa livre, considerada veículo de esquerdismo e imoralidade. Em resumo, nutrem a esperança delirante de que o presidente Bolsonaro se aventure num golpe de Estado e consequentemente estabeleça uma ditadura.
Nesse sentido, a ordem do presidente Bolsonaro para que o filho pedisse desculpas por suas declarações não tem valor nenhum. É o presidente, afinal, quem desde sempre incita essa retórica autoritária, elogiando ditadores, fazendo apologia de torturadores e ameaçando sistematicamente a imprensa. Os filhos, entre eles Eduardo, só agem – e só existem politicamente – em nome do pai.
Não se trata de relativizar a responsabilidade do deputado Eduardo Bolsonaro por seu discurso antidemocrático – que ademais, enquanto repugna o País, serve também para desviar a atenção da ainda nebulosa menção ao nome do presidente no caso do assassinato da vereadora Marielle Franco. Trata-se, sim, de perceber que o problema vai muito além do palavrório autoritário de um político medíocre.
Há hoje no País uma atmosfera cada vez mais pesada, fruto do extremismo, à esquerda e à direita, que tenta inviabilizar a política e, consequentemente, a democracia. É contra essa ameaça, cada vez mais concreta, que as forças democráticas devem se mobilizar. Laivos golpistas não podem ser tratados como manifestações anedóticas ou inconsequentes. Devem ser denunciados de forma resoluta por todos aqueles que prezam a liberdade.
Por esse motivo, é alvissareiro que as lideranças institucionais do País tenham se manifestado tão prontamente para condenar, de forma cristalina e nos mais duros termos, a manifestação irresponsável do deputado Eduardo Bolsonaro, mostrando rejeição absoluta a qualquer possibilidade de retrocesso em nossa democracia.
Que a Câmara dos Deputados, ao lidar com o caso, não reaja com a pusilanimidade demonstrada em 1999, quando apenas advertiu o então deputado Jair Bolsonaro depois que este defendeu o fechamento do Congresso, disse que “o erro do regime militar foi torturar, e não matar” e lamentou que a ditadura não tivesse fuzilado vários políticos, a começar por Fernando Henrique Cardoso, então presidente da República.
Na ocasião, exatamente como agora, Jair Bolsonaro, ante a repercussão negativa, disse que havia “exagerado”. Mas a mensagem já estava dada – e, ante a complacência dos democratas, ajudou a manter vivo o ânimo reacionário que tantos votos rendeu e, lamentavelmente, continua a render aos liberticidas.
Em nova fase – Editorial | Folha de S. Paulo
Com mais produção no pré-sal, Brasil deve evitar risco ambiental
Se tudo ocorrer conforme o esperado, o leilão dos excedentes de petróleo na área do pré-sal em 6 de novembro, a chamada cessão onerosa, poderá garantir a arrecadação de R$ 106 bilhões e viabilizar significativo crescimento da produção nacional nos próximos anos.
Com 12 empresas inscritas até agora, o sucesso do leilão firmaria a perspectiva de o país figurar entre os cinco maiores produtores em uma década. A extração de óleo e gás poderá atingir ao menos 5 milhões de barris/dia, cerca de 75% a mais que hoje —e há estimativas de até 7,5 milhões de barris/dia.
Com isso, acredita-se que o país poderá gerar 400 mil empregos no setor nos próximos dois anos.
Ao contrário da década passada, quando a Petrobras centralizava quase todo o investimento, com montantes além de sua capacidade, desta vez haverá divisão de riscos entre várias empresas.
Com regras de conteúdo nacional mais flexíveis e maior atenção a custos, o crescimento promete ser mais sustentável. As mudanças regulatórias para garantir maior concorrência na extração e distribuição de gás natural podem ainda ampliar o impacto econômico.
Em todas as frentes vão se acumulando sinais de que o colapso do modelo anterior está sendo superado. A Petrobras segue em rápido processo de saneamento financeiro e a produção atingiu o recorde de 2,9 milhões de barris/dia no terceiro trimestre, 14,6% a mais que no mesmo período de 2018.
Com o acelerado programa de desinvestimentos, a dívida caiu para 2,6 vezes o resultado operacional no período, metade do nível de 2014, auge da crise da empresa.
Evidências positivas são notáveis também nos royalties transferidos a estados e municípios e a esperada elevação da produção nos próximos anos deve garantir rápida expansão desses volumes, cuja destinação precisa ser bem pensada.
Além de evitar que a arrecadação vire despesas de custeio e benesses para a elite do funcionalismo, como é tradição no Brasil, o foco deve ser o investimento em educação, saúde e saneamento, para que se quebrem os mecanismos que reproduzem a pobreza.
Também é fundamental reforçar a proteção ambiental. Como o vazamento recente demonstra, qualquer acidente pode ter consequências catastróficas, ainda mais considerando o tamanho da produção na costa brasileira e o aumento sensível que deve ocorrer no trânsito de navios.
O país deve adotar desde logo um plano ambicioso de prevenção, com recursos suficientes e as melhores práticas internacionais.
O pré-sal é uma realidade que garantirá preciosas somas por algumas décadas à frente. Usá-las de forma responsável é o desafio.
Economia avança, apesar da política – Editorial | O Globo
O crescimento, porém, precisa de um ambiente de segurança para animar o investimento e o consumo
No espaço da política há alto vozerio, mas no da economia existe uma safra de boas notícias. Não seriam espetaculares num país normal. Mas em um que enfrentou a mais profunda recessão já registrada, um tombo acima de 7% em 2015/16, e mal consegue sair de um ciclo de virtual estagnação, em que o PIB não passa do 1% de crescimento anual, os tênues sinais de vida causam um mínimo de distensão no ambiente crispado de empregadores e desempregados.
A manutenção da taxa de desemprego em 11,8%, no trimestre encerrado em setembro, que expressa uma população de 12,5 milhões de pessoas sem trabalho, indica pelo menos alguns movimentos positivos abaixo do índice. Há mais pessoas procurando emprego, saídas do desalento, e que, segundo as normas técnicas, passam a ser captadas pela pesquisa como desempregadas. Mesmo assim, a taxa se mantém no mesmo lugar.
É verdade que razoável parcela dos empregos preenchidos é de informais, sem garantias, e com remuneração baixa. Mas é assim que um ciclo de aumento da oferta de postos de trabalho começa, principalmente depois da profunda recessão por que se passou, seguida da estagnação. O empregador não se sente seguro para assinar carteiras de trabalho, comprometendo-se com um pesado custo trabalhista. Em comparação com o mesmo trimestre de 2018, aumentou em 1,5 milhão o contingente de pessoas ocupadas. Sintomático que a parcela da população economicamente ativa que contribui para o INSS, os trabalhadores formais, tenha caído no ano passando.
Por isso, o governo Bolsonaro prepara medida para incentivar a contratação de jovens inexperientes, com a redução de 30% desses encargos. Não é o ideal, o melhor seria cortar este custo sem transferi-lo para o Tesouro. Mas como isso depende de reformas a serem submetidas ao Congresso, o que demanda tempo de negociação, não há alternativa melhor. O dinheiro da nova medida viria do corte de despesas do INSS permitido pelo pente fino passado em benefícios previdenciários, campo fértil para fraudes.
Os mercados financeiros procuram se antecipar às mudanças de fase da economia. A perspectiva da retomada do crescimento brasileiro, mesmo que ela venha ser ainda lenta, já foi detectada, e a aprovação da reforma da Previdência reforçou a percepção
O risco-país do Brasil, acompanhado pela cotação do CDS (Credit Default Swap), um seguro contra calotes, tem caído sucessivamente. Na terça-feira, chegou a 117 pontos, o mais baixo patamar desde maio de 2013, quando o Brasil ainda ostentava o carimbo de bom pagador (“grau de investimento”). No mesmo dia, a cotação da Argentina era 4.412 pontos, líder do ranking.
Não se deve, porém, achar que possa haver crescimento sustentado e duradouro sem que a política garanta estabilidade e segurança aos investidores e consumidores.
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