Defender a democracia nos dias que correm será missão prioritária para o novo presidente do Supremo
É inevitável que as severas crises que o país enfrenta na política e na economia, com trágicos reflexos sociais, pairem sobre a troca, na presidência do Supremo, de Dias Toffoli por Luiz Fux. Toffoli, que passa o cargo a Fux amanhã, conviveu com a face mais extremista de Bolsonaro, o tempo das interjeições golpistas e das insanidades proferidas diante do cercadinho da claque à porta do Alvorada. O STF, alvo predileto nessas horas, jamais sofreu tantos ataques populares.
Toffoli foi criticado por ter tentado, para driblá-los, abrir um canal de diálogo com Bolsonaro. Sempre poderá dizer que teve sucesso, afinal o país resistiu às iniciativas de ruptura que rondaram o Planalto. Mas não é possível dizer que a iniciativa do presidente da Corte tenha funcionado como calmante institucional. Ao contrário. Nunca o STF foi tão desafiado — balançou, mas resistiu. Basta lembrar a marcha de empresários, comandada por Bolsonaro, a fim de tentar reverter a decisão da Corte que garantiu autonomia a estados e municípios para manter o distanciamento social na epidemia (o presidente só recuaria das investidas com a prisão do ex-PM Fabrício Queiroz).
Por tudo isso, a mudança na presidência da Corte vai além de uma mera troca de guarda. Fux, não bastasse ter de operar na conjunção das crises econômica e política, enfrentará um contencioso com o Executivo ainda amplo. Assume num momento de grande pressão contra a Lava-Jato. Em oposição a Toffoli, um “garantista”, Fux tem o perfil mais “punitivista”. É reconhecido como um dos maiores defensores da operação anticorrupção no Supremo.
Encontrará de cara sobre sua mesa o problema da substituição de Celso de Mello na Segunda Turma, onde tramitam os processos da Lava-Jato. Com a licença médica de Celso, a turma passou a ter a configuração ideal para a defesa dos denunciados: os “punitivistas” Edson Fachin e Cármen Lúcia, de um lado; os “garantistas” Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski do outro. Como o empate nos julgamentos garante por lei a absolvição dos acusados, os advogados de condenados por corrupção ganharam esperanças. Não se sabe se fundadas. Sob Fux, o plenário poderá voltar ainda a discutir a prisão na condenação em segunda instância, rejeitada em novembro por um voto.
O novo presidente terá também o desafio de lidar com os dois primeiros ministros indicados por Bolsonaro para o Supremo. O primeiro para o lugar de Celso, que se aposentará em novembro. O segundo, em junho do ano que vem, quando Marco Aurélio Mello atingirá a idade limite de 75 anos.
O maior desafio, Fux herdará de Toffoli: o relacionamento com o Executivo. O STF se tornou o maior esteio para garantia do estado democrático de direito, diante dos arroubos autoritários do presidente e de seus seguidores. Para detê-los, será importante Fux apaziguar as divergências numa Corte que, de tantas decisões monocráticas, foi apelidada “11 Supremos”. A busca pela unidade institucional é o princípio que deve guiá-lo. O bom relacionamento com os demais poderes será essencial para preservar a autonomia do STF.
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