O Globo
Lira dá ao presidente eleito a PEC da
Transição e recebe, em troca, a manutenção do 'orçamento secreto'
Liga Nacional pelo Gasto (Linaga) — eis um
nome apropriado para o novo partido articulado entre Lula e Arthur Lira.
É um partido único, que reúne todos os partidos, da esquerda à direita,
reconciliados em torno do populismo fiscal. Sua ata de fundação prevê um
intercâmbio: o presidente da Câmara dá ao presidente eleito a PEC da Transição
e recebe, em troca, a manutenção do “orçamento secreto”, com o apoio velado à
sua reeleição.
A PEC da Transição é, de fato, uma PEC Kamikaze 2. Sua versão original, aprovada em julho com os votos indispensáveis da maioria da oposição, inclusive do PT, conferia a Bolsonaro o direito de perfurar o teto de gastos. A adesão da coalizão lulista à emenda (in)constitucional destinava-se a estabelecer um precedente: se o presidente pode perfurar o teto para nutrir suas chances de reeleição, por que o presidente eleito não poderia arrombá-lo para cumprir suas promessas de campanha?
A PEC Kamikaze original continha uma
armadilha: a validade do auxílio de R$ 600, que caduca em dezembro. Lula
poderia contorná-la pelo atalho de usar os recursos orçamentários para pagar o
valor ao longo do primeiro semestre de 2023, enquanto negociaria despesas
extraordinárias com o Congresso. A negociação envolveria uma nova âncora
fiscal, em substituição ao teto de gastos desmoralizado pela PEC Kamikaze. A
hipótese, porém, foi descartada pelo presidente eleito, em nome das suas
exorbitantes promessas de campanha.
Lula prometeu leite e mel desde o primeiro
ano. Os R$ 600 eram obrigatórios, tanto no plano social quanto no político. Mas
ele adicionou benefícios extras para filhos pequenos e, ainda, isenção de IR
até R$ 5.000, além de diversas outras despesas menores.
O suplemento para crianças do novo Bolsa
Família deriva da função que o programa desempenha na concorrência política:
cada presidente deve deixar sua própria marca, ampliando os valores
transferidos, a fim de extrair vantagens eleitorais. A isenção de IR obedece ao
objetivo de recuperar eleitores de classe média perdidos para o bolsonarismo.
O presidente eleito rebatizou praticamente
todos os gastos como “investimentos”. Na campanha, classificou Lira como
“imperador do Japão”, referindo-se ao “orçamento secreto”. Hoje, nos círculos
petistas, o mecanismo escandaloso recebe a denominação eufemística de emendas
de relator — e falta apenas aplicar também a tais recursos o nome de
“investimentos”. Tudo pelo social — eis a mensagem ilusória inscrita na PEC
Kamikaze 2.
Na declaração de apoio a Lula publicada
pelos economistas do Plano Real, eles expressaram a esperança de que o novo
governo seguiria o rumo da responsabilidade fiscal. Em princípio, não era prova
de ingenuidade: Lula 1 fez isso, adiando o populismo fiscal para o segundo
mandato e a farra da gastança para Dilma 1. Contudo a grande conciliação
Lula-Lira evidencia que o presidente eleito escolheu o caminho trilhado por
Lula 2.
Tudo pelo social? A explosão do teto de
gastos embutido na PEC Kamikaze 2, financiada por dívida pública, provocará
elevação dos juros e retração dos investimentos privados, reduzindo a taxa de
crescimento econômico. Os pobres perderão duas vezes. Numa ponta, pela
transferência invisível de renda para os detentores de títulos do Tesouro. Na
outra, pela inevitável austeridade contratada para o futuro próximo. A PEC
Kamikaze 2 também pode ser batizada como PEC da Crise Fiscal.
A fundação da Linaga separa a massa de
compromissos de campanha do presidente eleito em dois hemisférios. O primeiro
contém o verdadeiro programa de governo: a restauração de um projeto de
crescimento baseado no gasto público e na expansão descontrolada dos
investimentos das estatais. O segundo abriga as promessas vazias e o
ilusionismo: responsabilidade fiscal, previsibilidade de política econômica,
fim do “orçamento secreto”.
O imperativo democrático de derrotar
Bolsonaro determinou o apoio dos economistas do Plano Real à candidatura de
Lula. O advento da Linaga é o primeiro teste de fogo da aliança excepcional
cristalizada na equipe de transição.
8 comentários:
Muito bom !
Como sempre, parecer com gabarito de um mestre.
Mais uma vez, perdeu oportunidade de ficar quieto! Mas, como deve ganhar por coluna escrita, independente da qualidade, embolsou mais uns reais pra espalhar sua incompetência...
Veja o q diz Celso Rocha de Barros, hoje, neste blog, e perceba o quão subjetivos podem ser os analistas, neste caso o Magnoli:
"Todo mundo sabe que é impossível governar o Brasil com o Orçamento que Paulo Guedes mandou para o Congresso.
O próprio Bolsonaro já havia admitido que, se eleito, tentaria o que o PT está fazendo agora"
Magnoli sabe o q Barros sabe. Ambos têm suas ideologias, q transparecem nos seus escritos.
De minha parte, fico com Barros. Q cada um escolha o seu.
O ''anônimo'' sabe das coisas.
Excelente
todo anônimo é um covarde; o daqui é burro. Demétrio perfeito.
MAM
Uma perguntinha ao Demétrio. O governo da Frente Democrática tem musculatura para peitar o Centrão? Já que insinua que a PEC, possível no momento, é inconstitucional, cabe ao Supremo decretar isso. E creio que o companheiro articulista erra ou mente ao dizer que foi coisa do PT chamar o "orçamento secreto" de "emendas do relator". Não gosto desses articulistas que se referem ao novo governo como um governo do PT. Isso interessa ao boçal. "Petismo" é um irmão gêmeo do "Comunismo". O "Bolchevismo" foi o fantasma usado pelo nazi-fascismo. O "petismo" é a joia da coroa do fascismo bundalelê do boçal.
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