Valor Econômico
Invasão provoca horror na comunidade
internacional e desvia foco para política
A violência dos extremistas bolsonaristas
em Brasília chocou o mundo e provocou um rechaço monumental na cena
internacional. A reação foi muito rápida e forte de apoio à democracia
brasileira, com enorme
quantidade de declarações vindas de Joe Biden, Emmanuel Macron, dos
presidentes latino-americanos e outros, sem importar a cor partidária.
De toda maneira, a invasão de prédios dos três poderes, com cenas assustadoras e sem precedentes, e suspeita de conivência ou passividade de forças de segurança, desvia a atenção na cena internacional sobre o país no começo do novo governo. Como nota um interlocutor, era hora de transmitir estabilidade e confiabilidade ao mundo, mas as conversas agora são sobre a invasão sem precedentes em Brasília.
Assim, quando o ministro da Fazenda,
Fernando Haddad, aparecer no Fórum Mundial de Economia, em Davos, na semana que
vem, interlocutores poderão se mostrar mais ansiosos em ouvir sobre a situação
política e a enorme polarização. Rumos da economia e planos para combater o
desmatamento estão evidentemente no radar, mas a prioridade nas conversas
parece mudar.
‘O que aconteceu em Brasília não leva a
nada, mas cria um ambiente de insegurança interna e a perceção no exterior de
vulnerabilidade do novo governo’, resume Alfredo Valladão, reconhecido analista
internacional, em Paris.
‘Acho
que, à luz do que está acontecendo no Brasil, o lado político vai predominar
completamente. Os investidores, mais do que nunca, vão adotar um compasso de
espera’’, opina um diretor de grande multinacional com mais de US$ 200 bilhões
de capitalização de mercado.
Um diretor de grande banco internacional,
que também prefere não ter o nome mencionado, por não ter autorização da
instituição para falar, diz estar prestando muita atenção aos detalhes do
programa econômico do novo governo ‘que ainda não dão tranquilidade em termos
de estabilidade fiscal e crescimento de longo prazo’. Mas completa que sempre
achou que a economia na eleição no Brasil era secundária, ainda que importante,
em relação ao risco de deterioração política. A questão é o que vai acontecer a
partir de agora.
Para o professor Gaspard Estrada, da
Universidade Science Po, de Paris, Lula tentou desde o início isolar o bolsonarismo
e focar na economia. ‘Agora, isso vai tomar mais tempo. Mas as duas prioridades
agora são restabelecer a normalidade democrática, e isso tem a ver de acabar
com qualquer tipo de insubordinação no Exército, nas polícias e atos de
vandalismo. E dar respostas efetivas na economia’.
Na imprensa internacional, as manchetes se
acumulam sobre a invasão em Brasília. O jornal Le Monde, de Paris, fala de
ataque à democracia. O popular Bild, da Alemanha, menciona cenas de caos que
lembram a vergonha do que aconteceu no Capitólio, em Washington, há dois anos.
O jornal Le Temps, da Suíça, aponta ‘o Exército cúmplice da tentativa de
golpe’’, e acha que ‘o governo do Brasil parece mais frágil que nunca’’.
Há indagações sobre a facilidade com que os
bolsonaristas extremistas invadiram a capital federal e fotos de alguns
policiais passivos na Esplanada dos Ministérios. Ao mesmo tempo, não passou
despercebido relato, por exemplo, de que o Exército não deixou a polícia
militar do Distrito Federal entrar no acampamento em frente ao quartel-general
para cassar extremistas bolsonaristas de volta da quebradeira na Esplanada.
Para Gaspard Estrada, o governo Lula
precisa de vez acabar com a posição dúbia sobre esses acampamentos, e fazer o
ministro da Defesa desmontá-los rapidamente.
Para outro importante interlocutor, o
terrorismo registrado em Brasília uniu a comunidade internacional em torno do
governo de Lula de maneira muito forte. Acha que essa ajuda vai ser
determinante nos próximos meses porque a tarefa agora também terá de ser de
limpar as forças de segurança que em parte atuaram com negligência, quando não
com apoio. Também vai ter que por em ordem os serviços de inteligência.
‘Creio que reforça Lula no campos
partidários da democracia, mas o obriga a gastar muita energia política em
questões de política interna e de segurança’, completa esse interlocutor.
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