sábado, 25 de fevereiro de 2023

João Gabriel de Lima - Uma nova revolução no campo é necessária

O Estado de S. Paulo

No século 21, não é mais possível pensar a produção agrícola dissociada do meio ambiente

A primeira fake news produzida no Brasil foi, provavelmente, o trecho da carta de Pero Vaz de Caminha do qual se extraiu a máxima “em se plantando tudo dá”. Na verdade, um estudo do economista Eliseu Alves mostrou, no fim da década de 1960, que o principal problema da agricultura brasileira era a ausência de técnicas adaptadas às nossas condições: na maior parte do território brasileiro a terra é ruim, e o clima tropical não ajuda.

A solução encontrada foi enviar nossos agrônomos às principais universidades do mundo para “inventar” um jeito de plantar em solo ruim e clima tropical. “Formar técnicos é como dar tiros de cartucheira, um grão de chumbo vai atingir a caça”, costumava dizer Alves, citado num artigo do economista Marcos Lisboa. Alves participou da criação da Embrapa e de todas as etapas que transformaram o Brasil – graças a pesquisa e conhecimento – em potência agrícola.

No momento em que o planeta vive a revolução da economia verde, precisamos novamente reinventar nossa agricultura. “Não há nada errado em ser produtor de commodities, mas poderíamos dar um grande salto se exportássemos mais produtos agrícolas industrializados”, diz Marcello Brito, um dos principais líderes do agronegócio brasileiro. Ele é o entrevistado no minipodcast da semana.

“Dizer que o mundo não quer comprar nossos produtos industrializados, porque querem industrializar lá fora, é uma meia-verdade”, afirma Brito. Para ele, precisamos de mais acordos internacionais para ter acesso aos mercados – e tal acesso está condicionado a nos tornarmos também uma potência ambiental. “Cuidar da Amazônia é fundamental para isso”, diz Brito. “Nosso trabalho na área ambiental tem sido pífio e ruim.”

A solução, novamente, está no mundo do conhecimento. A ciência já demonstrou que podemos aumentar nossa produção agrícola sem cortar uma única árvore a mais, e ainda reflorestando área vastíssimas na Amazônia. Poderemos igualmente cumprir nossa obrigação ética – que o mundo cobra com razão – de proteger os territórios dos povos originários.

Vários centros de estudos no País já se dedicam à pesquisa de agricultura sustentável. Brito estará à frente de um deles: o Centro Global Agroambiental, que deverá iniciar suas atividades nos próximos meses na Fundação Dom Cabral. Ele já dirige, na mesma escola, a Academia Global do Agronegócio.

No século 21 não é mais possível pensar a produção agrícola dissociada do meio ambiente. É este o salto que o Brasil terá de dar. Precisaremos, como sempre, de conhecimento. E, talvez como nunca antes, de diplomacia e vontade política.

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Concordo com a coluna do colunista.