sábado, 25 de fevereiro de 2023

Hélio Schwartsman - Repressão e regulação

Folha de S. Paulo

Necessidade de reprimir golpistas não deveria contaminar regulação das redes sociais

Uma coisa é definir estratégias para combater o golpismo e a radicalização política e outra é criar regras racionais e coerentes para o funcionamento de algoritmos e redes sociais. No Brasil, precisamos fazer as duas coisas, mas não deveríamos permitir que uma contamine a outra.

Uma das formulações de Immanuel Kant para o imperativo categórico é "Age de acordo com uma máxima tal que possas querer, ao mesmo tempo, que ela se torne lei universal". Simplificando um pouco, teríamos o "Não faças aos outros o que não gostarias que te fizessem". E o imperativo categórico é algo que precisamos levar em conta em propostas de regulação, já que, idealmente, elas devem fazer sentido nos mais diversos lugares, épocas e contextos políticos.

Trocando em miúdos, uma regra que facilite a punição de quem atentou contra a democracia hoje, mas não proteja a livre manifestação de ideias de um regime autoritário futuro, deveria ser rejeitada, pois não satisfaria ao imperativo categórico. Para tornar a discussão mais concreta, uma regra que obrigasse uma empresa global a entregar o cidadão russo ou chinês que tivesse falado mal do governo às autoridades de seu país não poderia ser considerada uma boa regra, mesmo que, num contexto diferente, ela ajude a localizar golpistas que participaram do 8 de janeiro.

Um exemplo? Vejo com preocupação a decisão do STF de dispensar o pedido de cooperação internacional nos casos em que autoridades brasileiras desejam acessar dados de usuários armazenados fora do Brasil. Quando você é perseguido por ter criticado uma ditadura, não há melhor boia de salvação do que ter seu caso apreciado, ainda que superficialmente, por um juiz americano.

Essas considerações são até meio óbvias para quem já tenha lido um pouco sobre a liberdade de expressão. Mas, lamentavelmente, essa é uma garantia fundamental que vem sendo maltratada, na prática e na teoria.

2 comentários:

Anônimo disse...

O Hélio não estava inspirado ao escrever esta coluna. Acontece com os melhores escritores... Faltou espaço pra explicar melhor as suas ideias.

ADEMAR AMANCIO disse...

Faltou espaço e talvez ideias,rs.