quinta-feira, 16 de março de 2023

Cora Rónai - Os diamantes e o poder

O Globo

Fui cobrada por um leitor na semana passada por falar sobre as joias milionárias interceptadas pela Receita Federal:

“Oi, Cora. Essas bolsonarices ajudam os petistas a esconder os presentes que Lula e outros petistas receberam das empreiteiras. (Lembra dos relógios do Jacques Wagner?) Abs.”

O missivista (ainda se usa essa palavra?) não é, a rigor, um desconhecido; é um leitor que me escreve rotineira e educadamente, em geral enviando links para colunas e matérias com um certo viés. Ele sabe que não pensamos da mesma forma e não pretende me converter, apenas apontar o que lhe parece mais sensato do que o que eu escrevo. Respondi:

“Não estou elogiando os petistas. O que você chama de ‘bolsonarice’ atende por corrupção, e corrupção por parte de uma das piores ditaduras atuais. Duvido que os sauditas tivessem coragem de oferecer tais mimos a Angela Merkel ou a Jacinda Ardern. Não ser petista não faz do Bolsonaro um ser humano ou um governante minimamente aceitável.”

Ele replicou:

“Não está elogiando os petistas, mas ao não criticar Lula e o PT (sim, o governo deles já começou!) e ao fazer de Bolsonaro alguém ainda pior do que ele é, torna o efeito parecido. O governo Lula usa o Bolsonaro como ‘seguro’. O mesmo ditador daria o presente ao Lula, que o aceitaria. P.S. aceitar aquele presente é moralmente errado, talvez mesmo algo ilegal, mas não é propriamente corrupção, de acordo com nossa Lei.”

Meu leitor ignora que é impossível fazer de Bolsonaro alguém ainda pior do que ele é, e aí está, a meu ver, a sua maior falha filosófica. O governo Lula, ao contrário, sabe bem disso (razão pela qual, justamente, o usa como “seguro”).

Acho importante o que ele me escreveu porque revela como parte ponderável do país pensa sobre o assunto, a saber: 1) Lula teria feito o mesmo, e 2) aceitar milhões em joias talvez seja ilegal, embora não seja propriamente corrupção.

Tecer considerações no subjuntivo é um exercício inútil, mas duvido que Lula fizesse o mesmo — não por ser a “viva alma mais honesta do Brasil”, mas por ter inteligência política para perceber o potencial de estrago de um certo tipo de “presente”. Em 2003, sua falecida esposa Marisa Letícia fez questão de doar ao Fome Zero, muito publicamente, um colar que recebeu nos Emirados Árabes.

(A política é feita tanto de símbolos quanto de fatos.)

Duvido, sobretudo, que a Arábia Saudita tivesse a audácia de oferecer um presente tão insultuoso para o atual governo, ainda mais por baixo dos panos. No cenário internacional, goste-se dele ou não, concorde-se ou não com a direção da nossa política externa, o Brasil de Lula é protagonista, enquanto o de Bolsonaro era pária — e assombração sabe para quem aparece.

Isso não quer dizer que Lula seja um santo. Ele está longe disso, muito, muito longe. Mas de todos os políticos da História recente do país, ele é o mais ambicioso, e o que melhor entendeu o seu papel: a sua obsessão é pelo poder, e não por quinquilharias, rachadinhas ou cargos para a parentalha.

Por isso, aliás, foi para a prisão, e não para Orlando; mas aí já são outros quinhentos.

3 comentários:

Fernando Carvalho disse...

Pelo visto Cora Rónai está desinformada quanto ao caso da refinaria. Coloco aqui um trecho de notícia: Chupado da mídia: "A FUP revelou apurar possível relação entre a venda da refinaria Landulpho Alves, na Bahia, e as joias que o ex-presidente Jair Bolsonaro tentou se apropriar. Os árabes pagaram US$ 1,8 bilhão pela RLAM, negócio que foi concluído em dezembro de 2021. No entanto, o Ineep) apontou, que a RLAM valia entre US$ 3 e 4 bilhões. As joias foram o capilé.
Por isso o Código de Conduta da Alta Administração Federal é claro quanto ao recebimento de presentes e brindes. Se o presente tiver valor histórico, cultural ou artístico este presente não pode ser recebido. O presidente só pode receber itens personalíssimos como medalhas personalizadas ou bens de consumo direto como bonés, camisetas e chinelos. E mesmo um simples "brinde" não pode ter valor superior a R$ 100,00 (cem reais). Dura lex sed lex.

Lula ganhou um trono de verdade dado por um ex-presidente de país africano. Falou-se também que a polícia federal descobriu num cofre com pertences de Lula um faqueiro de ouro. Presente que fora dado pela Rainha da Inglaterra ao ditador militar Costa e Silva.
O general Figueiredo apesar de não ter sido tão popular quanto Lula também ganhou muitos presentes. E vários desses presentes vieram ao conhecimento público. Dona Dulce Figueiredo, já na condição de viúva, vendeu centenas de peças do espólio do marido. Entre elas duas telas de Di Cavalcanti. Uma bandeja presenteada pelo colega chileno, o gorila Pinochet, alcançou no leilão no qual foi vendida o preço de R$ 6.200. Mas a peça mais famosa do acervo de Figueiredo foi um cavalo em tamanho natural esculpido em pinho de riga que ele ganhou não se sabe de quem, provavelmente um potentado árabe.

Reagan quando visitou Figueiredo no sítio em que morava, ficou encantado com o cavalo de madeira. Figueiredo ao saber disso chegou a oferecer ao presidente americano um cavalo de verdade. Mas Reagan recusou o presente porque pelas leis americanas qualquer presente oferecido ao chefe de governo de lá não pode ultrapassar o valor de US$ 150 (cento e cinquenta dólares). Por outro lado Figueiredo aceitou um cavalinho de bronze, oferecido por Reagan, do escultor americano Harry Jackson. Essa pequena escultura de um cowboy, montado num cavalo a galope, dando tiros de revólver em quem vinha atrás dele (provavelmente índios) foi vendida no mesmo leilão por 300 mil reais.

Quem comprou? O bilionário gaúcho Lirio Parisotto, ele mesmo, o que deu um soco no olho de Luiza Brunet. Já o famoso cavalo de pau foi vendido pela bagatela de 14 mil reais para o lojista de antiquários, Manuel Machado. O cavalo para quem quiser ver, está na vitrine da loja de Machado no Shopping de antiguidades na rua Siqueira Campos, em Copacabana. Diz o lojista que já ofereceram pela peça a fábula de um milhão e meio de reais. Mas ele diz que quanto mais oferecem pela peça, menos ele tem vontade de vender.

Para concluir, Bolsonaro escalou um caminhão da Aeronáutica para ir a Porto Alegre buscar os presentinhos que Dilma levou para casa. Tem que ver se Collor, Itamar, Sarney e FHC também não levaram. Bolsonaro fecha essa história, levando para casa a escultura em madeira de uma moto Harley Davidson em tamanho real denominada de "Harley Mito". Todos eles furtaram, na mão grande, objetos que pertencem ao povo brasileiro. E agora essa notícia sobre joias que o governo da Arábia Saudita teria dado de presente à Micheque no valor de milhões de euros. Só pode ser tentativa do boçal de roubar o país se aproveitando da condição de presidente.

Sobre se presente caro é coorrupção ou não também escrevi sobre isso aqui neste blog maravilhoso:

julio saboya disse...

Cora tem um viés petista com Alzheimer, o colar de D. Mariza ela não queria devolver alegando ser um presente pessoal após o burburinho da imprensa foi feita a doação ao fome zero, logo doaram o que não era deles e sim da união, não sei se Bolsonaro pretendia ficar com as joias mas igualmente pela repercussão da imprensa devolveu, logo empatou.

Fernando Carvalho disse...

Li aqui neste espaço que o boçal levou pra casa mais de 7 mil presentes. Ele ficou quatro anos apenas que dá 1.460 dias. Acho que Biroliro levou pra casa até presente que foi de Deodoro da Fonseca e quiçá de Dom Pedro Segundo.