Folha de S. Paulo
Ação do movimento na Bahia coloca um dilema
para o governo Lula no início do mandato
Ao invadir
terras produtivas da Suzano na Bahia, o MST testa as águas do
novo governo para ver o quanto consegue obter. As invasões, que já começaram a
aumentar ano passado, devem crescer ainda mais. Se forem premiados pela
invasão, é evidente que dobrarão a aposta. Inclusive é o que já promete.
Para a Suzano, é péssimo. Milhões de reais perdidos e mais dor de cabeça. Para o governo Lula, então, nem se fala. Essa invasão é concretização —em meros dois meses de mandato— dos piores fantasmas projetados pela extrema direita em 2022. A cereja no bolo é que o presidente da Suzano foi se engajou publicamente na defesa da democracia em 2022, ou seja, contra o projeto bolsonarista. Parece ser punido por suas virtudes.
Para o próprio movimento, é uma estratégia
arriscada. Ao longo dos últimos anos, o MST vinha
construindo uma imagem muito positiva junto à opinião pública.
Não era mais visto como os encapuçados armados de foices e tochas, prontos a
destruir fazendas, da caricatura dos anos 90. Agora o MST se mostra como a
grande promotora dos orgânicos e da agricultura familiar, dona de quitandas
conscientizadas e doadora de alimentos para os necessitados. A invasão e
depredação de uma terra produtiva é a volta do antigo fantasma revolucionário,
querido por uma certa militância, mas rejeitado pela maioria da sociedade, que
acredita em ordem e trabalho.
A invasão de propriedade, se generalizada,
é profundamente desestabilizadora para a sociedade. Gera imprevisibilidade,
seca investimentos, dificulta planejar o futuro, reduz vagas de emprego.
Segundo entrevista dada por Evanildo Costa,
membro da direção do MST na Bahia, para a Carta Capital, a invasão (ou, como ele
prefere, "ocupação") de terras produtivas é "um instrumento que
os trabalhadores têm de pressionar". É verdade. Eles nem têm interesse nas
terras que foram invadidas, e sim em outras, que já foram separadas para
assentamentos no passado que nunca foram efetuados. Quem sabe agora finalmente
agilizem o processo.
A lógica do protesto disruptivo das leis da
sociedade é perigosa. No mínimo, quem nele se engaja deve ter a coerência de
aceitar as consequências legais de seu ato. E se cada grupo com uma demanda
legítima resolvesse invadir e depredar empresas ou vias públicas, impedindo a
vida normal de milhões? Está instalado o caos. Todos saem perdendo.
A questão é como empresa, governo estadual
e governo federal responderão a essa pressão. Da parte da Suzano, a resposta
foi clara e correta: negociação só depois da total desocupação. As decisões
judiciais de reintegração de posse já estão aí, falta serem
cumpridas pelo governo.
Já o governo
Lula ou dá um sinal claro de que o MST só tem a perder
—inclusive na Justiça— com essa estratégia de invasões, ou estará contratando
mais desordem para o futuro próximo.
A demanda por justiça social no campo
brasileiro é justa e histórica. Para quem duvida, basta ver a outra notícia
sobre o trabalho rural que tomou a imprensa nas últimas semanas: centenas de
trabalhadores no RS mantidos em regime análogo à escravidão, com
direito a surras e choques. A maioria é baiana. É difícil não nutrir algum tipo
de ímpeto revolucionário frente a uma notícia dessas.
Em ambos os casos, que se cumpra a lei.
Empresários criminosos têm que saber que suas práticas criminosas serão
duramente punidas, e empresários honestos precisam ter a segurança para seguir
investindo, contratando trabalhadores em regime justo e gerando valor.
2 comentários:
Apoiado.
"Terras produtivas" foi a solução mágica que os latifundiários colocaram na Constituição para impedir uma reforma agrária num país divido em bilionários e moradores de rua.
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