Valor Econômico
Se fizer o presidente do BC, ministro, além
100% da equipe, recupera a política monetária
A indicação
de Gabriel Galípolo para a
diretoria de política monetária do Banco Central coloca Fernando Haddad na rota
para se transformar como o ministro da Fazenda mais poderoso das últimas duas
décadas. Desta lista exclui-se Fernando Henrique Cardoso, que, indicado para o
cargo há exatos 30 anos, começou a subir a rampa do Planalto com o lançamento
do Plano Real.
Se a construção da moeda ficou a cargo
de André Lara Resende e Pérsio Arida, as
condições políticas para sua implantação foram garantidas pelo ministro FHC,
condição ainda por ser provada por Haddad com a chancela, guardadas as devidas
proporções, do arcabouço fiscal e da reforma tributária.
Tem uma pedreira sem fim até que o
ex-número 2 de Haddad se transforme em presidente do BC e retome, para o
governo Luiz Inácio Lula da Silva, a condição usufruída nos seus dois primeiros
mandatos com um nome de sua escolha para o cargo. Primeiro o Senado tem que
aprovar Galípolo para a diretoria de política monetária. Depois a gestão de
Haddad na Fazenda tem que se provar bem-sucedida para emplacar sua indicação
para o lugar de Roberto
Campos Neto.
Com a opção de Lula por um discurso mais à esquerda, batendo dia sim e no outro também no Comitê de Política Monetária, tem cabido a Haddad exercer a moderação que, nos primeiros governos lulistas, coube ao titular. O papel tem permitido que o ministro se aproxime do mercado financeiro e contenha sua precipitação por nomes à direita para suceder Lula.
Esta aproximação,
inclusive com o presidente do Banco Central, porém, não passa por um time
liberal. Nem tampouco de servidores de carreira. É uma equipe que pode chamar
de sua. O ministro pôs seus auxiliares na Prefeitura de São Paulo numa nave e a
aterrissou no Planalto Central.
O secretário da Receita, Robson Barreirinhas, foi o
chefe da Procuradoria da Fazenda da gestão municipal na gestão de Haddad como
prefeito. E foi investido pelo ministro da missão de desmontar os arranjos
infralegais de benefícios fiscais sedimentados há décadas.
O secretário do Tesouro, Rogério Ceron, foi secretário
de Finanças da mesma gestão. Galípolo não havia trabalhado com Haddad na
prefeitura, mas aproximou-se do ministro por meio do economista Luiz Gonzaga Belluzzo, com quem
escreveu três livros.
O governo Lula é o primeiro a assumir sem a
prerrogativa de indicar o presidente do BC, em função da autonomia aprovada no
primeiro ano da gestão Bolsonaro. Não há precedente, porém, para uma equipe de
porteira fechada como esta que Haddad indicou.
Pedro Malan ficou oito
anos no cargo (1995-2002). Emplacou três secretários do Tesouro, mas não fez o
da Receita. O igualmente longevo Everardo
Maciel não era de carreira da Receita e teve o beneplácito
do vice-presidente, Marco
Maciel, de quem era primo. Malan ainda enfrentou, de saída, as
discordâncias intrépidas do ministro do Planejamento, José Serra.
Antonio Palocci, primeiro ministro
da Fazenda de Lula, também enfrentou a retranca do ministro do
Planejamento. Guido
Mantega chegou ao cargo como economista das campanhas
presidenciais do presidente petista. E, ao contrário da relação de Malan com
Gustavo Franco, não dá pra dizer que Palocci tinha ascendência sobre Henrique
Meirelles, o presidente do BC de Lula. Tampouco se pode dizer que Jorge Rachid,
funcionário de carreira e mais longevo secretário da Receita de gestão petista
(2002-2008), fosse um nome seu.
Como ficou oito anos no BC, Meirelles
também colocou freios sobre a gestão do sucessor de Palocci, Guido Mantega. O
ex-ministro permaneceu na gestão Dilma Rousseff mas foi sucessivamente
atropelado pela ex-presidente, como bem relata o jornalista Thomas Traumann, em
“O pior emprego do mundo” (Planeta, 2018).
Dilma falava diretamente com o secretário
do Tesouro, Arno
Augustin, e com a Receita, tanto na gestão Mantega quanto
naquela de seu sucessor, Joaquim
Levy. Este, ao longo do ano em que ficou na Fazenda, enfrentou
as resistências do ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, que acabaria
por assumir o cargo até o impeachment.
Meirelles voltou à Fazenda com Michel Temer
presidente. Não foi de sua equipe, porém, que saiu o presidente do Banco
Central, Ilan
Goldfajn, ou os secretários do Tesouro, Otávio Ladeira, ou da Receita,
Jorge Rachid, que voltou ao cargo que ocupara na gestão petista.
Paulo Guedes incorporou as
pastas do Planejamento e do Trabalho num superministério da Economia. Só
conseguiu manter quadros como Mansueto
Almeida, ex-secretário do Tesouro, na primeira metade do
governo. Bruno
Funchal, seu sucessor, ficou menos de um ano, e os dois
seguintes foram recrutados na autarquia.
Na Receita, a situação foi mais dramática.
A gestão Marcos
Cintra foi abortada em nove meses. Seu sucessor, José Roberto Tostes Neto,
servidor de carreira da Receita, caiu em 2021 por resistir à pressão de Flávio
Bolsonaro pela troca na corregedoria do órgão.
Julio Cesar Vieira Gomes, sucessor de
Tostes, foi recrutado na carreira da Receita, o que não o impediu de
interceder, junto à alfândega do aeroporto de Guarulhos, para a liberação das
joias sauditas.
Se o retrospecto confirma a força com a qual o ministro da Fazenda foi investido, tampouco deixa dúvidas de que todos os erros desta equipe “100% Haddad” serão debitados do titular da pasta e de suas ambições futuras.
Um comentário:
Sim,a mulher entende do riscado!
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