Valor Econômico
Ibovespa costuma ter altas excepcionais no
início de governos
O tema Shein, sobre a intenção do
Ministério da Fazenda de taxar compras no exterior com valor inferior a US$ 50
praticamente saiu do noticiário com o recuo do governo após repercussão
amplamente negativa nas redes sociais.
Mas dona Ana ficou intrigada com o assunto
depois de uma experiência própria. Semanas atrás, ela viu um anúncio nas redes
sobre um “sutiã invisible, o queridinho das blogueiras”. Gostou do produto
porque a lingerie é das que não aparecem mesmo quando se usa vestido com
profundo decote nas costas.
Sem hesitar, Ana clicou no link e foi
direcionada a um marketplace provavelmente chinês, mas vai saber. O fato é que
ela comprou uma peça e ganhou outra de graça, tudo por R$ 140.
Na semana passada, Ana nem se lembrava mais da compra, feita há quase um mês, quando recebeu em casa um saquinho cinza com as duas peças. Não nega, gostou do sutiã, mas viu coisas estranhas na etiqueta colada na encomenda. A (ou o) remetente do produto era uma pessoa física da China que dona Ana, naturalmente, desconhecia. Na declaração para a alfândega brasileira, um dos itens da etiqueta, o valor das duas peças, com frete e seguro de US$ 0,5, somava US$ 5,5. Algum imposto pago no Brasil? Nenhum centavo.
Dona Ana não é economista nem advogada, mas
sem recorrer a ninguém chegou a uma óbvia conclusão: havia sido ponta
involuntária de duas supostas fraudes. A primeira estava estampada no nome do
remetente, que não era o da loja vendedora (pessoa jurídica) e sim de uma
pessoa física chinesa, que pode existir ou não, sabe-se lá. A segunda via-se no
valor da venda. Ela havia pago o equivalente a US$ 30 pelas duas peças, mas a
declaração na etiqueta mostrava apenas US$ 5,50.
A pessoa remetente era tão “despojada”,
pensou dona Ana, que abriu mão de receber o produto de volta em caso de “não
nacionalização” da mercadoria na alfândega brasileira. A instrução na etiqueta,
caso isso ocorresse, era para “tratar como abandono”.
Milhares de vendas como essas - melhor
talvez seria chamá-las de operações - ocorrem diariamente, chegando ao
consumidor brasileiro sem pagar nenhum imposto.
Everardo Maciel comandava a Secretaria da
Receita Federal em 1995, no governo Fernando Henrique Cardoso, quando foi
criada essa isenção para envio de mercadoria custando menos de US$ 50 de pessoa
física para pessoa física. Em entrevista à jornalista Sonia Racy, Maciel explicou
que a intenção era isentar pequenos presentes enviados por amigos ou parentes
do exterior para brasileiros. Mas hoje “não faz mais sentido”, disse. Não havia
na época marketplace nem comércio eletrônico globalizado e, desde então, o
mundo mudou, observou.
O governo perdeu a batalha da Shein, cujo
objetivo era obter uma receita tributária de R$ 6 bilhões por ano? Não se sabe
ainda. Segundo a ministra do Planejamento, Simone Tebet, houve, no caso, recuo
“na forma, mas não no conteúdo”. A oposição, porém, ganhou de lavada a batalha
nas redes sociais, criou memes, disse que se pretendia taxar até blusinhas
baratinhas chinesas em vez de grandes desvios de sonegadores. Lula então mandou
trocar a medida por uma fiscalização mais rigorosa dessas operações - esse
seria o recuo “na forma”.
Ainda que, no caso da dona Ana, o sutiã
chinês invisível tenha agradado, entre parênteses, é preciso observar que no
site Reclame Aqui, a “store” vendedora é classificada como “não recomendada”,
porque deixa de responder a pelo menos 50% das reclamações recebidas.
O fato é que as varejistas chinesas, ao
vender produtos no país sem pagar imposto e com dados aparentemente fictícios,
sejam blusinhas, meinhas ou sutiãs, lesam o fisco e fazem concorrência desleal
aos fornecedores e varejistas brasileiros.
“Pode isso, Arnaldo?”, perguntaria o
renomado narrador esportivo.
Putin, senhor da guerra
Na semana passada, a Rússia acusou a
Ucrânia de tentar matar Vladimir Putin. Verdade ou não, vale mudar de assunto
para relembrar o temperamento brigão do presidente da Rússia, relatado no livro
“Putin: a face oculta do novo czar” (2012), da jornalista russa Masha Gessen.
Desde criança, conta Gessen, Putin sempre
reagiu com violência a qualquer provocação. Baixinho, aos 11 anos saiu à cata
de um lugar para aprender a arte das lutas. Escolheu o sambo, que mescla golpes
de judô, caratê e luta livre. Ganhou musculatura e passou a se meter
regularmente em brigas na escola e nas ruas, batendo até em grandalhões. Foi
descrito como alguém impulsivo, fisicamente violento e que mal conseguia
controlar o próprio gênio. Ele mesmo se descreveu para um de seus biógrafos
como “vândalo e delinquente” na infância/juventude.
“Imagine um garoto que sonha se tornar
oficial da KGB quando todos os demais querem ser cosmonautas”, observou um
biógrafo. De fato, ele acabou fazendo carreira na KGB durante o regime
soviético e depois na agência secreta que a sucedeu, a FSB.
Tendo como padrinhos políticos o então
presidente da Rússia Boris Yeltsin e o bilionário oligarca Boris Berezovsky,
Putin foi eleito presidente e assumiu em maio de 2000. Seu primeiro decreto
dava imunidade judicial a Yeltsin. E o segundo estabelecia uma nova doutrina
militar, abandonando a velha política de não agressão com armas nucleares e
enfatizando o direito de usá-las “se outros meios de solução do conflito se
esgotarem ou se revelarem ineficazes”.
Antes de se candidatar e assumir a
Presidência, Putin foi presidente interino após a renúncia de Yeltsin, em 1999.
Masha Gessen, em seu livro, observa que, se alguém na Rússia ou no exterior
prestasse atenção, teria percebido que as semanas em que ele esteve no seu
trono temporário já davam todas as pistas sobre o novo regime autoritário. “Mas
o país estava ocupado demais elegendo um presidente imaginário, e o resto do
mundo só começaria a questionar sua escolha anos mais tarde.”
Tanto quanto as divergências geopolíticas,
sabem russos e ucranianos, o temperamento brigão e autoritário de Putin é um
impulsionador de conflitos e guerras.
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