quinta-feira, 18 de maio de 2023

Maria Hermínia Tavares* - O ambiente no governo

Folha de S. Paulo

Não faltará ocasião para testar a firmeza dos compromissos ambientais

A ministra Marina Silva tem insistido no que considera a principal diferença entre os dois períodos em que comandou o Ministério do Meio Ambiente. O primeiro, entre 2003 e 2008, ao ocupar um nicho no governo, a partir do qual construiu boa parte das instituições que regem a proteção de nossas florestas e a biodiversidade.

Hoje a questão ambiental se destaca entre os compromissos do governo Lula, com espaço próprio em distintas áreas da administração, entre elas nada menos de 19 ministérios e bancos públicos, assegurando-lhe fortes ferramentas de ação.

Os ventos do mundo e a intensa atividade de grupos da sociedade organizada —que denunciaram e resistiram ao desmonte das políticas e órgãos federais promovido pelo desgoverno Bolsonaro— foram responsáveis por essa mudança, cujo alcance não deve ser subestimado.

Com ela vai ganhando corpo a ideia de desenvolvimento sustentável que entrelaça tarefas imediatas e preparação para um futuro assentado no uso de energias renováveis; exploração econômica das florestas em pé; infraestruturas mais resistentes a desastres naturais; indústrias menos poluidoras e serviços inteligentes; produção e consumo de alimentos com menor pegada de carbono; e, por último, mas não menos importante, redução das distâncias sociais.

No fecundo debate em curso, emergem numerosas propostas a serem testadas para combinar enfrentamento dos riscos presentes —exploração predatória das matas e dos recursos naturais, avanço do crime organizado na Amazônia, ameaças às populações indígenas e tradicionais— com escolhas que assegurem um futuro menos cinzento para o país e para o planeta.

Se a longo prazo a agenda ambiental é um jogo de ganha-ganha, no imediato ela necessariamente impõe perdas e contraria interesses —e não só os ilícitos— e visões enraizadas na sociedade e no próprio governo.

Não faltam exemplos: a linha de transmissão de eletricidade que atravessará terra indígena para ligar Manaus a Boa Vista; a Ferrogrão, que beneficiará os produtores do Centro-Oeste, ao custo de afetar um parque nacional; projetos de rodovias no Norte, Nordeste e Centro-Oeste cuja construção põe em perigo espécies animais ou terras demarcadas; e o arriscado plano da Petrobras de explorar petróleo e gás no mar, do Amapá ao Rio Grande do Norte.

Sem contar pelo menos 22 projetos em tramitação no Congresso que decerto tornarão inviável o controle do desmatamento.

Assim, não faltará ocasião para testar a firmeza dos compromissos ambientais do governo e sua aptidão para arbitrar conflitos, a fim de criar condições políticas a iniciativas sustentáveis.

*Professora titular aposentada de ciência política da USP e pesquisadora do Cebrap.

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Artigo pra lá de bom.