Folha de S. Paulo
Presidente vai ter que entregar pastas para
o centrão se quiser governar
Lula deve
anunciar seu novo ministério nesta semana. É possível que seja um ministério
pior. Também é possível que, exatamente por isso, o governo se torne mais capaz
de aprovar seus projetos no Congresso.
Quando Lula anunciou o atual ministério,
achei bom demais para ser verdade. No presidencialismo de coalizão brasileiro,
o presidente monta
sua base de apoio no Congresso distribuindo, entre outras coisas, ministérios para
os partidos que têm muitos parlamentares. A soma dos votos que os atuais
ministros de Lula garantem no Congresso não é suficiente para governar no
sistema brasileiro.
Eleito pela frente ampla de 2022, o governo
Lula tem um perfil ideológico mais centrista do que o de outros governos
petistas. Mas o Congresso atual tem maioria de partidos que apoiaram Bolsonaro por
ideologia e/ou por orçamento secreto.
A correlação de forças é o que é. Lula vai ter que entregar ministérios para o centrão se quiser governar.
Na reforma desta semana, Lula deve indicar
dois ministros originários do centrão: André Fufuca (PP-MA) e Silvio
Costa Filho (Republicanos-PE).
Fufuca tem grandes chances de ganhar o Ministério de Portos e Aeroportos,
atualmente com Márcio França (PSB-SP). Talvez
haja desmembramento de ministérios para acomodar Costa Filho. Se Márcio França
for realocado em outro ministério, as mudanças em cascata podem ser ruins para
a esquerda.
Torço para que seja possível evitar isso.
Se eu pudesse escolher, preferiria entregar ao centrão o comando de órgãos ou
autarquias que satisfizessem dentro da lei seu apetite por recursos, mas o
mantivesse fora da decisão de políticas públicas.
Mas isso também é difícil, porque ano que
vem tem eleição para prefeito. Quem controlar a destinação de mais verbas deve
ter mais facilidade para eleger seus aliados. Não é à toa que o PT
não quer perder o comando da pasta que administra o Bolsa Família. O PT
está certo.
É bom lembrar que ter um Congresso
eternamente conservador não reflete necessariamente as preferências do
eleitorado brasileiro. A democracia brasileira foi construída, nos anos 80, com
a classe política herdada da ditadura, um período de perseguição sistemática à
esquerda. Os vários governos da Nova República, inclusive os de esquerda,
tiveram que fazer acordos com essas máquinas políticas tradicionais para
governar. Elas sobreviveram e foram as grandes vencedoras da crise política dos
últimos dez anos.
Por isso, inclusive, volta e meia a
centro-direita me aparece com conversa de "semipresidencialismo". É
um pessoal que já desistiu de eleger presidente da República e prefere
transferir o poder para o Congresso, onde a direita sempre tem maioria.
A boa notícia para Lula é que a virada
ideológica do centrão pós-Bolsonaro parece estar arrefecendo. Na votação
do arcabouço fiscal, por exemplo, mais da metade do PL votou a favor do
governo. O PL tem cada vez mais gente que pode até ser do "P", mas,
se precisar, faz o "L".
Resta torcer para que a reforma ministerial
desta semana garanta a aprovação do resto da agenda de Fernando
Haddad, inclusive as medidas de caráter redistributivo. Seria um sinal de
que voltamos a ter, tenho até medo de dizer em voz alta e dar azar, mas, vá lá,
instituições funcionando.
Um comentário:
Me assusta, este cara. Ele desenha claríssimo que ideologicamente se identifica com o que eles chamam de esquerda no Brasil. Quanto a isso, é um problema e direito dele, afinal, se a questão é se comportar como torcedor, a pessoa é livre para torcer pelo que ela quiser.
Eu prefiro chamar de esquerda outra coisa e sobre torcer, prefiro não torcer para nada além do Botafogo.
Mas logo depois de mostrar que não gosta de fisiologismo (e não deve gostar de corrupção e de conluios também), imediatamente ele passa a comemorar os arranjos fisiológicos do poder executivo com o Congresso, arranjos esses que envolvem "Toma-la-dá-cá", envolvem tráfico de influência, envolvem reforço do poder daqueles que ele deixa marcado que preferia ver esvaziados, como eu prefiro também, e envolve, nós sabemos, muita corrupção de ambos os lados e mecanismos como o "orçamento secreto".
A gente lê, e não vê uma crítica que peça o contrário, que peça a busca de uma politica e um arranjo que rompa com essa prática deprimente.
O Brasil politico de 2007 é o mesmo Brasil de 2008, que é o mesmo Brasil de 2009, que é o mesmo Brasil de 20017, que é o mesmo Brasil de 2019, 2020, 2021, 2022, 2023, ...
O Brasil tem sido a continuação de populistas no executivo e fisiológicos no Congresso. E este Celso Rocha e mais um monte de gente comemora, em vez de denunciar e propor mudança!
Me assusta, este Celso Rocha.
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