quarta-feira, 20 de setembro de 2023

Bruno Boghossian - Lula busca zona de conforto na ONU para corrigir falhas e lapidar política externa

Folha de S. Paulo 


Mote da desigualdade em discurso mira liderança, redução de desgastes e itens da agenda doméstica 

A participação de Lula na Assembleia-Geral da ONU foi calculada para corrigir falhas e lapidar o que o presidente espera para a política externa de seu terceiro mandato. O mote da desigualdade, escolhido como linha mestra do discurso, teve o objetivo de buscar uma zona de conforto e ampliar o peso de itens centrais de sua pauta doméstica. 


Lula não disfarçou a cautela para se desviar de cascas de banana que produziram desgastes amargos nos quase nove meses inaugurais de governo. Citou a Guerra da Ucrânia de maneira discreta, diluindo a invasão russa no meio de quase uma dezena de conflitos, em países que vão de Burkina Faso ao Haiti. 


O presidente passou longe de uma condenação veemente de Vladimir Putin. Preferiu repudiar ações de "expansão territorial" das potências globais em nome de um pleito sustentado pelo princípio de não alinhamento da diplomacia brasileira: a ampliação do Conselho de Segurança da ONU e a busca por equilíbrio em outros órgãos de governança internacional. 


O objetivo era apontar a redução de desigualdades globais como um fator de baixa carga ideológica e de contraponto ao que Lula descreveu como uma reedição da Guerra Fria. Depois de uma aproximação com China e Rússia, o petista busca aparar arestas e reforçar a mensagem de um pragmatismo que deve ser complementado nas reuniões bilaterais com Joe Biden e Volodimir Zelenski. 


A plataforma de combate à desigualdade, já ensaiada por Lula no G20, é parte de um esforço para fixar o petista como espécie de porta-voz de nações emergentes, mas também uma tentativa de resgatar a antiga imagem de um governante que, em seus primeiros mandatos, desfilava em fóruns globais como um dos líderes mais populares do planeta.

 

Nesse sentido, o presidente explorou a busca por equilíbrio tanto na política externa (na partilha de responsabilidades ambientais e na redução do protecionismo) como em sua agenda doméstica (ao repetir o bordão de campanha da inclusão dos pobres no Orçamento e reforçar a necessidade de cobrar mais impostos dos mais ricos).