quarta-feira, 20 de setembro de 2023

Lu Aiko Otta - Conter abusos sem prejudicar investimentos

Valor Econômico 


O diálogo entre empresas e Fazenda é importante para achar um equilíbrio que contenha eventuais excessos, mas não sacrifique a estabilidade de regras 

 

A discussão no Congresso mal começou, mas é crescente a preocupação com a proposta do governo que pretende cobrar, das grandes empresas, valores descontados de tributos federais com base em programas de estímulo estaduais da “guerra fiscal”. Trata-se da Medida Provisória 1.185/2023. 


Na semana passada, estiveram na Fazenda representantes da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca). Essa entidade congrega 440 empresas que respondem por 88% do valor de mercado da B3 e 20% do Produto Interno Bruto (PIB). Está contra a MP.

 

Ontem, foi a vez de o relator do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO), deputado Danilo Forte (União Brasil - CE) ir ao ministério levando representantes da federação das indústrias de seu Estado e de grandes empresas instaladas na região. O deputado sugeriu que o governo desacelere a tramitação da proposta, reapresentando-a como um projeto de lei.

 

Fortes ouviu na Fazenda que a MP é importante para cumprir o compromisso de equilibrar as contas públicas, fazendo frente a gastos que já estão contratados, informou uma fonte à coluna. A expectativa é reforçar as receitas em R$ 35,3 bilhões no ano que vem e em outros R$ 102,6 bilhões até 2027. 


Também foi dito ao deputado que a MP reforça receitas coibindo um abuso: o de Estados concederem benefícios fiscais sem consultar ninguém, apesar de esses provocarem perdas para os cofres federais, para outros Estados e para os municípios. 


Foi-lhe assegurado, ainda, que a MP não afeta empreendimentos aprovados no âmbito de Sudam e Sudene, um dos focos de preocupação do congressista. 


As crescentes perdas na arrecadação federal foram apresentadas à imprensa no início deste mês pelo secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas. Empresas que recebem incentivos tributários nos Estados os descontam da base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). No ano passado, foram R$ 149,1 bilhões de redução de base, o que representou perda de R$ 50 bilhões em receitas.

 

A Fazenda não vê problema nos abatimentos de despesas relacionadas a investimento. Porém, não aceita que o mesmo seja feito em relação a custeio. Há casos, disse Barreirinhas, em que o dinheiro não é usado na empresa. É distribuído aos sócios. 


O problema vem sendo tratado em duas frentes. A MP, explicou o secretário, estabelece regras para o futuro. 


Quanto ao passado, está em curso um trabalho para convencer as 50 empresas mais beneficiadas a regularizarem suas contas antes de ser aberta fiscalização. 


A MP, por sua vez, trata de distinguir as subvenções a investimentos daquelas destinadas ao custeio. A proposta é não permitir mais reduções na base de cálculo. Ao mesmo tempo, criar um crédito fiscal para os investimentos. 


Mal comparando, o incentivo não seria mais um desconto no imposto, e sim um voucher. Esse desenho é o recomendado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

 

A mudança de modelo, porém, foi avaliada pela Abrasca como “brusca” e geradora de insegurança às empresas. Cria uma burocracia enorme, avaliou à coluna o presidente-executivo da entidade, Pablo Cesário. A empresa precisará se habilitar para usufruir do benefício, o que a seu ver inviabiliza investimentos. 


Segundo o executivo, Barreirinhas disse na reunião que seu objetivo não é esse, e sim barrar os abusos nas subvenções ao custeio. 

A Abrasca ficou de analisar a MP sob esse ângulo e, eventualmente, apresentar alternativas à Receita.

 

No entender da entidade, essa proposta, somada a outras, como a que acaba com o mecanismo chamado Juro sobre o Capital Próprio (JCP), deveria ser tratada na reforma do Imposto de Renda, e não antecipada para reforçar a arrecadação no curto prazo. 


O diálogo entre empresas e Fazenda é importante para achar um equilíbrio que contenha eventuais abusos, mas não sacrifique a estabilidade de regras. 


O ambiente para esse debate estaria melhor se as propostas destinadas a elevar receitas estivessem acompanhadas de outras para conter despesas. 

 

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Lendo e tentando aprender.