domingo, 3 de setembro de 2023

Vinicius Torres Freire - O crescimento de 2024

Folha de S. Paulo

Alguns impulsos do PIB de 2023, até agora, devem diminuir; investimento produtivo tem de subir

Quaisquer que tenham sido os motivos do crescimento bom e inesperado do PIB neste ano até agora, alguns impulsos devem diminuir no ano que vem. Não quer dizer que a economia vai crescer mais ou menos em 2024. Dadas as surpresas (erros enormes de previsão) dos últimos três anos, seria uma temeridade acreditar mesmo nos melhores chutes informados da praça. De resto, é possível que sobrevenham fatores novos de crescimento de curto prazo.

Talvez não esteja claro o peso que agropecuária, petróleo e ferro no avanço do PIB, em particular desde 2020. O impulso das commodities deve ser agora menor, de qualquer modo.

Está mais do que sabido o grande sucesso da safra de 2022/2023, multiplicado pelo câmbio desvalorizado ("dólar caro"), que elevou ainda mais os ganhos de renda da agropecuária exportadora. Será difícil que safra e preços sejam maiores de modo relevante em relação a 2022/2023 e que o câmbio esteja tão bom.

Ainda assim, note-se de passagem que: 1) Tem havido dificuldade de medir de modo correto o desempenho da agropecuária; 2) Talvez não se entenda bem o efeito secundário do sucesso de volume e renda da agropecuária de exportação.

O Brasil se tornou um país petroleiro. Não há perspectiva, por ora, de melhora dos preços de petróleo ou de aumento maior de quantidade exportada. Mas a exportação de petróleo é relevante no PIB e variações em preços, quantidades e lucros afetam de modo significativo mesmo a arrecadação do governo. No final de Lula 1, o Brasil exportava 400 mil barris por dia. No final de Dilma 1, entre 500 mil e 600 mil barris. De 2020 a 2022, entre 1,3 milhão e 1,4 milhão. É mudança grande.

Há previsão de aumento de gasto do governo federal em cerca de 0,5 ponto percentual do PIB para 2024 (em relação ao 18,7% do PIB registrados nos 12 meses até julho passado). Pode ser que não seja tanto, pois deve haver alguma contenção fiscal, imagina-se ou espera-se. Mas gastos "na veia" da demanda, como no caso do Bolsa Família, não devem crescer (em termos relativos, talvez até caiam). Neste ano, do 0,54% do PIB de aumento de gasto federal até agora, 0,4% do PIB vieram do Bolsa Família (até o final do ano, o aumento deve chegar a 0,8% do PIB).

A taxa de investimento cai desde as alturas de 18,3% do PIB dos segundos trimestres de 2020 e 2021 para 17,2% do PIB de agora. O investimento "produtivo" quase não cresceu no segundo trimestre, depois de dois tombos feios nos dois trimestres anteriores.

É ainda mais difícil prognosticar investimento. Depende muito de expectativa das empresas, quanto a retornos e estabilidade econômica. Depende de taxa de juros. Deve ser por aí que o crescimento de curto prazo possa vir a se sustentar, se não houver besteira maior nas contas públicas. Mas, dada a baixa taxa de poupança, há riscos por aí.

Isto posto, há mistérios. Sabia-se que o crescimento seria impulsionado por impulso fiscal (gasto do governo), aumento da massa salarial e do crédito para pessoas físicas. Mas o resultado disso tudo no PIB foi maior do que o esperado.

De resto, a massa salarial (rendimento vezes empregos) cresce bem em termos reais (ainda a mais de 6% ao ano) e a inflação cai, mesmo a de serviços. É uma ilusão passageira? Houve ganhos de produtividade? Talvez ainda tenhamos de esperar trimestres antes de ter uma pista mais precisa.

Por falar em ganhos de produtividade, teria havido alguma mudança que passou despercebida?

Passamos por duas imensas recessões (2015-2016 e 2020). Foram-se empresas mais ineficientes e ficaram empresas melhores? A Grande Recessão e o choque da epidemia provocaram alguma mudança na produção, nas firmas? A reforma trabalhista conteve custos trabalhistas (não necessária e diretamente com salários)?

 

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Pois é,boas questões.