O Estado de S. Paulo
Está em definição o papel político amplo do Supremo
Discreta e calada, a ex-presidente do STF Rosa
Weber também não resistiu à ambição de colocar seu nome na História. Vem, em
boa parte, desse impulso individual a decisão de pautar o voto do aborto no
Supremo, levando a severas consequências políticas.
As deliberações do STF sobre aborto, marco
temporal e drogas (entre outras) expuseram um conflito profundo entre os
Poderes, especialmente entre Judiciário e Legislativo. Há dois níveis
entrelaçados nessa disputa.
O nível “imediato” é o da reiterada acusação,
por parte do Congresso, de que o STF extrapola suas funções e está “legislando”
em matérias de competência dos parlamentares. As ameaças de restringir mandatos
dos ministros do
STF e alterar suas decisões no Congresso são o “troco” dado no dia a dia político.
O nível “profundo” é muito abrangente e se agravou recentemente. Envolve o próprio papel do STF na busca de realizar “visões” do “bom” ou do “melhor” para a sociedade – pautas ditas “progressistas”, por exemplo, empacadas no Legislativo ou no Executivo.
O problema vai além do ativismo judicial,
pois se trata do papel político em sentido amplo do STF e seus integrantes
(além do óbvio jogo político em sentido estrito no qual estão envolvidos até o
pescoço). O Supremo veio deixando de ser apenas a instância que interpreta o
que é ou não constitucional e passou a estipular qual a regulação adequada para
diversos temas.
Ocorre que o STF não “pensa” hoje como se fosse
uma cabeça. Nesse sentido, sofreu bastante com recentes presidências. A atual
pretende recuperar o que o ministro Luís Roberto Barroso chama de “consensos
nacionais”. No fundo, implica assumir que, na falta de elites no sistema
políticopartidário capazes de conduzir qualquer agenda abrangente, caberia ao
STF essa missão.
O que torna a situação atual muito delicada é
o fato de que esses dois níveis mencionados (o da “politicagem” e o do
confronto entre visões políticas na sociedade) se confundem na atuação de um
Executivo que enxerga no STF um “aliado” decisivo em questões que vão da
economia à pauta de costumes. Em outras palavras, o que forças políticas
chamadas de esquerda não conseguem no Congresso vão buscar no Supremo, pois ali
se sentem “acolhidas”.
Há uma noção entre integrantes do STF de que no contexto da disputa entre os Poderes e das profundas divisões sociais o recomendável no momento seria prudência e “baixar a bola”. E que a Corte não pode ser percebida pelo público, embora o seja, como espécie de braço auxiliar de uma corrente política. O problema é como combinar esse jogo.
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