Valor Econômico
Os preços dos serviços surpreenderam, mas ele
atribuiu a desaceleração a fatores mais ligados à sorte do que a um efeito
extraordinário da política monetária
A inflação de serviços, a mais difícil de
derrubar, passou a surpreender positivamente nos últimos meses, sobretudo os
preços mais sensíveis à atividade econômica. A questão: essa melhora seria
bastante para o Banco Central acelerar os cortes dos juros e impor uma rédea
menos curta na sinalização para a taxa Selic no fim do ciclo de distensão
monetária?
Falando a investidores na sexta-feira, o diretor de política econômica do Banco Central, Diogo Guillen, evitou decretar uma vitória definitiva. Os preços dos serviços, de fato, surpreenderam, mas ele atribuiu a desaceleração acima da esperada dos reajustes a fatores mais ligados à sorte do que a um efeito extraordinário da política monetária.
Ele também indicou que está atento se o
fenomenal desempenho do mercado de trabalho, com a queda do desemprego sem
pressões disseminadas em salários, vai perdurar ao longo do tempo. O BC está
olhando sobretudo os salários, mas ele reconhece que há uma desvantagem nessa
abordagem: se ocorrerem pressões, o fato está instalado.
Guillen foi questionado nesse evento,
promovido pelo banco Barclays, quantos meses de inflação benigna, sobretudo
serviços e núcleos, o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC precisa
observar para ter certeza de que, de fato, a inflação caminha para as metas.
Na sua resposta, ele evitou sinalizar um
período de tempo em que a autoridade monetária poderá estar mais confortável
com os números. O que fez foi detalhar o diagnóstico do Copom sobre a queda da
inflação, o que ajuda a entender um pouco melhor a função de reação do comitê e
sua postura ainda um tanto cautelosa
No evento, ele discutiu, primeiro, o efeito
da inércia dos preços industriais na queda dos preços de serviços. Esse é o
componente de sorte: a inflação geral caiu e contaminou de uma forma mais
favorável os preços de serviços. O Banco Central dissecou os números para saber
qual foi o verdadeiro causador da queda dos preços dos serviços. Uma hipótese
era que a queda da inflação dos preços industriais foi muito pronunciada. A
outra hipótese era de que aumentou o coeficiente de repasse da inflação de bens
industriais para os preços de serviços.
O que houve foi uma queda forte dos preços
industriais, mas o coeficiente de repasse para os bens de serviços não mudou. A
notícia é boa. Se esse coeficiente, que o Banco Central usa nos seus modelos de
projeção, tivesse mudado, poderia ser grande o impacto na inflação de serviços
de uma pequena aceleração nos preços de bens industriais. “O que aconteceu é
que tivemos um grande choque primário, profundo, que mexeu com o núcleo de
inflação.”
Sobre a queda da inflação de serviços em um
ambiente de atividade econômica forte, ele ponderou que o desempenho da
economia foi mais forte no primeiro semestre, mas que no segundo semestre está
havendo uma moderação. Do ponto de vista dos modelos do BC, porém, a surpresa
maior foi na queda dos bens industriais, e menos na inflação de serviços.
“Quando a gente olha os modelos desagregados,
os maiores erros [na nossa projeção] foram nos bens industriais, e menos na
inflação de serviços”, disse Guillen. No entanto, ao longo do ano, esses erros
foram voltando para os padrões esperados. “Os erros estão dentro da média
histórica, tanto para bens industriais quanto para serviços.”
O que se depreende da fala de Guillen é que,
no final das contas, a surpresa da inflação recente foi mais episódica e menos
estrutural. A inflação de bens industriais caiu muito, e isso afetou serviços,
mas não com uma intensidade (ou um coeficiente de repasse) maior. Lá atrás, as
coisas se saíram fora do previsto pelo modelo de projeção do Banco Central, mas
sobretudo em bens industriais, e menos em serviços. Agora, a inflação está
evoluindo mais em linha com o previsto pelo modelo. Isso significa que o Banco
Central está confiante de que seu modelo vai ser mais preciso daqui para
frente.
Esse diagnóstico de Guillen tem implicações
práticas importantes. Uma parte do mercado vem afirmando que a inflação de
serviços está reagindo de forma surpreendente - e que o Copom apenas está
acumulando informações para concluir que, de fato, vivemos num mundo mais
benigno que permite cortes mais agressivos de juros ou uma taxa terminal mais
baixa no ciclo.
O sumário do que disse Guillen é que não há
nada realmente novo e que a inflação deverá caminhar conforme o previsto. O
esperado pelo BC é uma inflação de 3,6% em 2024 e de 3,2% em 2025, em ambos os
casos acima das metas.
O diretor do BC deu uma declaração um pouco
dura, na sexta-feira, para quem espera um Copom mais suave: a política
monetária contracionista ainda tem um trabalho pela frente.
Guillen destacou a necessidade de observar os
dados para determinar o orçamento de corte de juros. “Dissemos que depende dos
dados e que é contracionista. Por que você precisa ter uma taxa terminal
contracionista? Porque você tem expectativas de inflação acima da meta. E,
finalmente, vai ser o ciclo necessário para trazer a inflação de volta para a
meta”, afirmou. “As pessoas não se preocupam com isso, mas acho que é a frase
mais importante na ata do Copom é que o ciclo vai ser o que for necessário para
trazer a inflação para a meta."
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