Valor Econômico
Parece provável que a fatia de senadores
alinhados com a direita dura cresça nas eleições de 2026
O placar de 47 votos a 31 no Senado pela aprovação de Flávio Dino para uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) é sugestivo para o governo Lula em relação ao futuro, tanto no curto quanto em um hipotético segundo mandato. Sobre o curto prazo: está delineado que a oposição na Casa é bastante coesa, e, no limite, pode barrar uma emenda constitucional ou convocar uma CPI. O escore obtido na votação de Dino é quase idêntico, por exemplo, ao registrado na reeleição de Rodrigo Pacheco (PSD-MG) para o comando da casa, derrotando o líder da oposição, Rogério Marinho (PL-RN). Na votação de fevereiro desse ano, Marinho conseguiu 32 votos e Pacheco, 49. A tropa tem se mantido unida.
Sobre o médio prazo: é bastante provável que
a fatia de senadores alinhados com a direita dura cresça nas eleições de 2026.
A próxima disputa eleitoral irá renovar duas vagas por Estado, ou 54 cadeiras.
A última, de 2022, trocou uma cadeira. Dos 54 lugares a serem trocados daqui a
dois anos, 31 são consistentemente governistas, 18 claramente da oposição e
cinco são de difícil classificação. A base anti-Lula hoje corresponde a
aproximadamente 40% do Senado, mas nas vagas que estarão em disputa na próxima
eleição este percentual cai para 30%.
O governo tem uma relação extremamente
difícil com a Câmara, mas isso se dá em função da força do Centrão comandado
pelo presidente da Casa, Arthur Lira, e não propriamente da oposição, que é
menos coesa do que no Senado, embora tão estridente ou mais.
Na Câmara, Lira reelegeu-se sem adversários.
No Senado, o bolsonarismo foi capaz de articular uma candidatura própria. Na
Câmara o PP, partido de Lira, compõe a maioria. No Senado, a minoria. Grande
parte dos problemas do governo na Câmara se resolvem em conversas entre Lira e
o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. O encerramento desse ano legislativo
deve demonstrar isso novamente, noves fora os vetos presidenciais derrubados.
Uma migração de seis ou sete senadores para essa oposição coesa pode ter desdobramentos
sérios para o governo, na hipótese de uma reeleição de Lula em 2026.
Ainda existem governistas remanescentes em
Estados que votam majoritariamente na oposição, como Acre, Rondônia, Roraima,
Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Distrito Federal, Goiás, que podem perder suas
vagas em um quadro de polarização mantido para 2026 como tudo indica que irá
acontecer. Uma base oposicionista no Senado maior já poderia ameaçar de fato
indicações do governo para o Supremo ou dar tração à aprovação de pautas-bomba.
Um Senado com mais oposicionistas pode criar
para um eventual segundo mandato de Lula um cenário de minoria nas duas Casas.
O retrato se aproximaria daquele de 2015, que culminaria no impeachment de
Dilma Rousseff no ano seguinte. Hoje já se conversa no Congresso sobre
propostas que recortam poderes do Executivo, como o semipresidencialismo. É uma
ideia que pode ganhar impulso no futuro. Perante governos minoritários, o
Legislativo se agiganta.
Se Gleisi Hoffmann, a presidente do PT, fez
um alerta durante a conferência eleitoral do partido para o risco do Congresso
“engolir a gente” se a popularidade de Lula baixar, e a popularidade de Lula
está baixando, o que ela não dirá se a bancada da oposição no Senado ficar
maior? Há dúvidas, dentro do PT, se o partido está preparado para o desafio da
renovação. O quadro nas demais siglas de esquerda é ainda pior.
O ex-presidente Jair Bolsonaro está
inelegível, é certo, mas o quadro de polarização não precisa dele para
continuar existindo. A direita não para de produzir novos quadros, a esquerda
tem dificuldades para se renovar.
A esquerda hoje, de certo modo, faz a defesa
do “status quo”, como admitiu um veterano dirigente petista. Cresce a
dependência em relação ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, muito
condicionada a um bom desempenho na economia que está longe de ser garantido.
Marta e a renovação
Um retrato da dificuldade de renovação está
em São Paulo, onde Lula estará neste sábado, levantando a mão do seu candidato
a prefeito da capital, Guilherme Boulos (Psol). A ex-prefeita Marta Suplicy, há
quase 20 anos fora do cargo, pode compor a chapa para a eleição municipal na
capital, que promete ser dificílima. Boulos repetiria assim a estratégia de
2020, quando teve como parceira de chapa Luiza Erundina (SP), que governou a
cidade 31 anos atrás. A ideia é ter ao lado alguém com experiência administrativa
e trânsito na periferia.
Há muito barulho dentro da sigla, mas um
veterano dirigente petista observa que qualquer processo de discussão interna
que se faça hoje no partido é um mero despiste: quem escolherá de maneira
imperial a parceria para a chapa de Boulos é Lula, com quem a ex-prefeita
reatou há muito tempo. Marta só não irá se não quiser. Pode ser que não queira.
Ela faz parte do secretariado de Ricardo Nunes e seu nome chegou a ser sugerido
também para vice do atual prefeito, em um balão de ensaio do presidente
nacional do PL, Valdemar Costa Neto.
Sabedor de suas poucas forças, o PT definiu
uma política de alianças bastante ampla para 2024 e tem poucas apostas próprias
nas capitais. Uma é Natal, outra Fortaleza, quem sabe Vitória ou Teresina. Em
São Paulo, elegeu quatro prefeitos em 2020, projeta eleger 30. Vai crescer,
partindo de um patamar bastante baixo. Mas o PL vai crescer muito mais.
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