Planalto e Congresso devem prestar atenção a Haddad
O Globo
É preciso trazer um mínimo de racionalidade
aos gastos, para evitar deterioração fiscal ainda maior
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seus
ministros e os parlamentares deveriam ouvir com atenção o que tem a dizer o
ministro da Fazenda, Fernando
Haddad, para trazer um mínimo de racionalidade às medidas com
impacto nas contas públicas. A mudança nas metas fiscais de 2025 e 2026,
aparentemente uma concessão de Haddad, já deteriorou a credibilidade do
governo. O pior que Planalto e Congresso poderiam fazer agora é acreditar que
está aberta uma nova temporada de gastos sem limite.
Deputados e senadores são antenas da sociedade. É natural que verbalizem demandas dos grupos que representam. Também são legítimas as tentativas do Executivo de pôr em marcha seu programa de governo. O que não pode acontecer é um e outro adotarem medidas em favor de grupos de interesse sem lastro algum. A responsabilidade fiscal é obrigação não somente do Executivo, como Haddad costuma lembrar. A História ensina que “pautas- bombas” teimam em explodir no colo do povo. Aqueles que ainda insistem em causar dano às contas públicas precisam ser informados da realidade.
Desde o início do ano, apesar dos recordes de
arrecadação e do quadro róseo pintado em gabinetes de Brasília, o dólar já
subiu 8%. Embora o efeito ainda não seja sentido na inflação, o Banco Central
emitiu sinais de que haverá redução no ritmo de queda dos juros. A guerra no
Oriente Médio pressiona o petróleo e a inflação, levando o Fed, banco central
americano, a movimento parecido. Os juros demorarão mais a cair nos Estados
Unidos do que se acreditava antes. Tudo isso significa que o dinheiro ficou mais
caro — e não haverá o alívio que tornaria o Brasil atraente para os
investidores.
Com a aprovação do novo arcabouço fiscal, o
governo Lula havia transmitido um recado de compromisso com o controle da
dívida pública. Apesar dos mecanismos de contenção embutidos no arcabouço, ele
deixou aberta uma brecha para mais gastos: mudar as metas. A alteração
anunciada neste mês alonga o prazo para equilíbrio do endividamento. O acúmulo
de despesas já leva o mercado a prever déficit de 0,8% do PIB neste ano — a
meta é zero. A especulação de que o governo alterará também a meta de 2024
transmite ainda mais insegurança.
O certo teria sido um cronograma de ajuste
mais curto, respeitando as regras do arcabouço que o próprio governo elaborou.
Tudo aquilo de que o país não precisa são mais mudanças ou descumprimento das
metas. Para evitar isso, é crucial o Congresso parar de fingir que conta com
orçamento infinito. Se apostarem no aumento das despesas para prejudicar o
Executivo, os congressistas acertarão os cidadãos.
Duas ideias em tramitação exigem atenção. A
primeira é a absurda proposta de restaurar reajustes salariais automáticos para
juízes e procuradores, a custo estimado em até R$ 42 bilhões anuais. A outra é
derrubar o veto de Lula a R$ 5,6 bilhões em emendas parlamentares (as emendas
subiram de R$ 7 bilhões em 2016 para mais de R$ 50 bilhões neste ano; os
parlamentares não precisam de mais). Haddad tentará convencer os congressistas
a abandonar essas e outras medidas que contribuem para degradar ainda mais o quadro
fiscal. Diante do ambiente desafiador, o Congresso e o próprio Planalto
precisam se conscientizar da importância de conter gastos e recobrar a
confiança na responsabilidade do governo com as contas públicas.
Autoridades de trânsito precisam incentivar
uso do cinto de segurança
O Globo
Acessório obrigatório ainda é desprezado por motoristas e passageiros imprudentes
Obrigatório há 27 anos, o cinto de segurança
ainda é um problema no Brasil. Não deveria, tantas as evidências de sua
importância para evitar ferimentos em acidentes. Mas basta acompanhar as multas
aplicadas a quem é flagrado sem usá-lo para perceber que muitos brasileiros
continuam a dar de ombros para a própria segurança. Elas chegaram a 2,5 milhões
em 2023, ante 2,4 milhões em 2019, antes da pandemia. Num país em que 34 mil
pessoas morreram em acidentes em 2022, a segurança no trânsito deveria
ser levada mais a sério.
Quem está sem cinto de segurança tem oito
vezes mais chances de morrer num acidente, segundo estudos citados pelo
ortopedista e traumatologista Marcos Musafir em reportagem do GLOBO. Ele
equipara o uso do cinto a tomar uma vacina. São comuns, diz Musafir,
traumatismos no crânio, causados em quem, sem cinto, é projetado com violência
sobre o painel do carro ou para fora dele. A lista de ferimentos comuns também
inclui traumas no tórax, lesões nos membros e rompimento de órgãos. Andar sem
cinto não é negligência pequena nem inócua.
Isso vale também para quem anda no banco de
trás, onde o risco é ser lançado para fora do veículo numa colisão. Foi o que
aconteceu com o apresentador Rodrigo Mussi, quando um caminhão bateu no carro
de aplicativo em que ele estava, na Marginal Pinheiros, em São Paulo. Mussi
sofreu traumatismo craniano, várias fraturas e perdeu metade da visão do olho
esquerdo. No Rio, a jornalista Louise Nogueira bateu o rosto no banco da frente
e levou cinco pontos. Depois da experiência, ela garante que não deixará mais de
usar o cinto.
O uso no banco de trás protege também quem
está na frente. De acordo com o perito em trânsito Rodrigo Kleinübing, num
carro em velocidade moderada, a força com que os passageiros de trás são
lançados sobre os da frente numa colisão equivale a uma tonelada. Estudo da
National Highway Traffic Safety Administration (NHTSA), dos Estados Unidos,
revela que o cinto no banco de trás reduz o risco de morte em até 43%. E em 60%
a probabilidade de lesões na coluna cervical.
Policiais precisam realizar blitzes
frequentes para verificar se os passageiros do banco de trás também estão de
cinto, algo que nem sempre pode ser constatado pelos sistemas automáticos,
mesmo os de tecnologia avançada. Para o motorista, a multa de R$ 195,23 e a
perda de cinco pontos na Carteira Nacional de Habilitação são penas leves para
quem é flagrado sem o cinto, diante do potencial de danos causados num
desastre. Além de adotar punição mais dura, as autoridades de trânsito deveriam
intensificar campanhas de conscientização.
Privatização da Sabesp dá um passo importante
Folha de S. Paulo
Câmara paulistana indica permanência do
contrato com companhia; operação deve ajudar país a superar atraso no
saneamento
A Câmara Municipal paulistana aprovou em
primeiro turno alteração
legal que na prática abre caminho para a privatização da estadual Sabesp.
Uma segunda votação ocorrerá após audiências públicas, mas o placar, de 36
votos a 18, indica que não deve haver obstáculo para que a estatal de saneamento vá
a leilão nos próximos meses.
O projeto garante o contrato de prestação de
serviços ao município, que sozinho responde por quase metade do faturamento da
empresa. Sem essa adesão, a desestatização seria inviabilizada.
Em contrapartida, os vereadores incluíram no
texto a antecipação para a cidade de R$ 1,2 bilhão dos repasses do lucro da
Sabesp direcionados a um fundo de saneamento e infraestrutura municipal.
Estão previstos, ainda, a permanência de
tarifas sociais e o aumento de 13% para 20% do lucro que deve ser transferido
para investimentos em proteção de mananciais e meio ambiente.
De sua parte, o governo
paulista divulgou o modelo da privatização, que deve reduzir a
participação do estado dos atuais 50,3% para algo entre 15% e 30%, a depender
do interesse do setor privado a ser revelado no leilão.
O certame ocorrerá em duas etapas. Primeiro
haverá uma competição entre interessados a se tornarem acionistas de referência
com a aquisição de 15% do capital, posição que deve ser mantida por pelo menos
cinco anos.
Em seguida, as duas melhores ofertas
disputarão a preferência dos outros acionistas. Quem obtiver a maior adesão
será o vencedor. O poder de voto de qualquer grupo de acionistas será limitado
a 30%, e o governo do estado reterá uma ação com direitos especiais.
O conselho de administração terá 9 membros,
sendo 3 nomeados pelo Bandeirantes, 3 pelo bloco estratégico e 3 independentes.
Quanto às garantias de serviço, haverá
aportes de R$ 56 bilhões para a universalização do fornecimento de água e
esgoto até 2029. O modelo prevê que os investimentos serão remunerados apenas
depois de ocorridos, não de maneira antecipada na tarifa como hoje.
Em outro ponto positivo, a concessão cobrirá
não somente as áreas urbanas formais, mas também as precárias e rurais.
Por fim, foram instituídos aportes de 30% do
valor obtido com a venda das ações, mais os dividendos futuros do estado, para
o fundo de apoio à universalização dos serviços, que também será usado para
subsidiar a cobrança para famílias pobres. Segundo o governo paulista, o modelo
permitirá a queda imediata de 10% da tarifa.
Que o plano seja bem-sucedido e sirva de
exemplo para que o país supere seu vergonhoso atraso no saneamento básico.
Demarcação na prática
Folha de S. Paulo
Reconhecimento de terras indígenas aquém do
esperado expõe dificuldades de Lula
Luiz Inácio Lula da
Silva (PT) foi eleito com uma agenda de defesa dos povos indígenas,
mas no seu governo a delimitação de territórios para esse estrato da população
mostra-se difícil.
Na quinta-feira (18), foram
demarcadas as terras Aldeia Velha (BA) e Cacique Fontoura (MT).
Aguardavam-se, no entanto, outras quatro: Morro dos Cavalos e Toldo Imbu (SC),
Potiguara de Monte-Mor (PB) e Xukuru-Kariri (AL).
É notório que Jair Bolsonaro (PL) desmantelou
o setor ambiental, não demarcou terras e esvaziou os quadros da Funai.
Contudo, assim como ocorre na área da saúde, o governo petista não pode mais
usar descalabros da gestão anterior para justificar frustrações.
Flávio Dino,
ex-ministro da Justiça e agora no Supremo Tribunal Federal, passou 13 meses na
chefia da pasta sem emitir
nenhuma portaria declaratória de terras.
O Congresso segue a apatia do Executivo e é
cobrado por lideranças indígenas para que avance em políticas públicas para
esses povos.
O atraso nas demarcações se deve a tensões
causadas por conflitos fundiários em terras indígenas, que precisam ser
resolvidos pela Justiça. Em outros territórios, como o Yanomami,
o governo federal ainda não conseguiu aplacar a crise humanitária e de saúde.
Em 2023, 363 mortes foram registradas, ante
343 em 2022 —o Executivo diz que havia subnotificação antes, o que é plausível
mas está longe de ser tranquilizador.
Ademais, pouco foi feito para a expulsão
do garimpo nas
Terras Indígenas Kayapó e Munduruku (PA) e Sararé (MT) —nesta, a área da
atividade ilegal saltou
de 36 hectares em 2022 para 252,3 hectares até outubro de 2023.
Garantida na Constituição,
a demarcação requer um longo processo administrativo, que inclui estudos
técnicos, contestação por terceiros e portaria do Ministério da
Justiça, até a homologação por decreto da Presidência da República.
A definição de territórios garante maior segurança jurídica e física aos indígenas e permite a eles o acesso a políticas públicas, como as de saúde e educação. Nota-se, porém, que não bastam alegadas boas intenções nessa seara.
A volta dos que não foram
O Estado de S. Paulo
Festejar um José Dirceu e um Eduardo Cunha nos salões de Brasília, depois de tudo o que fizeram para desmoralizar a democracia e as instituições, equivale a fazer troça da República
Quando José Dirceu subiu à tribuna do Senado
para discursar sobre a democracia brasileira, no último dia 2, o gesto disse
muito mais sobre a qualidade do Senado e da democracia do que sobre Dirceu. O
prócer petista ganhou tratamento de estadista na Câmara Alta da República duas
décadas depois de ter sido escorraçado do Congresso por sua participação ativa
no escândalo do mensalão – expressão que resume a corrupção da democracia no
País. E ainda teve a oportunidade de dizer que quase não aceitou o convite porque,
em outras palavras, o Congresso que o cassou não o merecia. “Zé, é uma honra,
para nós, ter você conosco”, disse o senador Randolfe Rodrigues (sem
partido-AP), autor do convite a Dirceu a propósito dos 60 anos do golpe militar
de 1964.
A soberba do “Zé” tem razão de ser. Perto de
alguns dos muitos pigmeus do Senado e da Câmara de hoje, Dirceu é um gigante da
sobrevivência política. A prova mais luminosa disso nem foi sua constrangedora
participação em uma sessão solene no Senado, de resto feita para louvar aquele
que os petistas chamam de “guerreiro do povo brasileiro”, e sim a festança de
seu 78.º aniversário em Brasília. Compareceram o presidente da Câmara, Arthur
Lira, e políticos de diversas extrações, além de vários ministros de Estado.
Todos ali ouviram uma aula magna de Dirceu sobre o projeto de poder
lulopetista. Portanto, ninguém pode dizer que não foi avisado.
Mas Dirceu não voltou sozinho do além. Quem
andou circulando com enorme desenvoltura em Brasília recentemente foi Eduardo
Cunha, cujo mandato de deputado federal foi cassado em 2016 em meio ao
escândalo do petrolão e da ofensiva da Lava Jato.
Cunha ganhou a ribalta por ter presidido a
Câmara no impeachment da presidente Dilma Rousseff e por ter formado uma
bancada pessoal de deputados fiéis, movidos a verbas e cargos negociados pelo
poderoso parlamentar. Caiu em desgraça por razões óbvias – de tal modo que 450
deputados votaram pela sua cassação e apenas 10 o apoiaram –, mas, apesar dessa
punição acachapante, o ostracismo durou pouco: no dia 11 passado, Eduardo Cunha
foi uma das estrelas da festa de aniversário do deputado Marcos Pereira (Republicanos-SP),
que reuniu petistas, bolsonaristas e ministros do Supremo Tribunal Federal.
Cunha foi até chamado de “presidente” pelo deputado comunista Renildo Calheiros
(PE) e saiu a defender o deputado Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), acusado de
mandar matar a vereadora Marielle Franco.
Já sabemos que a democracia brasileira não
anda bem das pernas, seja pelo voluntarismo censório e inquisitorial do
Supremo, seja pela captura do Orçamento federal pelos interesses paroquiais de
parlamentares, seja pela naturalidade com que o golpismo ganha ares de
legitimidade. Mas quando personagens que deveriam ser liminarmente rejeitados
pelo mundo político são, ao contrário, recebidos ali como respeitáveis xamãs,
constata-se que esse mundo político, já conhecido por seus escassos limites
morais, se rebaixou ainda mais, convertido ao credo de que tudo vale – e, pior,
de que malfeitos eventualmente abrilhantam biografias, em vez de enxovalhá-las.
Festejar um José Dirceu e um Eduardo Cunha,
depois de tudo o que fizeram para desmoralizar a democracia e as instituições,
equivale a fazer troça da República, cujo nome é pronunciado em vão por aqueles
que a corroem por dentro, tal como as saúvas denunciadas por Mario de Andrade
há quase um século. Dirceu e Cunha são os heróis sem nenhum caráter que tão bem
representam o ideal político do Brasil de hoje: como Macunaímas atualizados,
proclamam a quem interessar possa que não vieram ao mundo para ser pedra, isto
é, para se apegar a valores como respeito à moral, às leis e à democracia, e
sim para explorar todas as oportunidades que tiverem, sem qualquer peso na
consciência, para acumular poder, influência e riqueza. É por isso, e por
nenhuma outra razão, que tipos como Dirceu e Cunha são recebidos nos salões de
Brasília não com repugnância, e sim com admiração e calorosos tapinhas nas
costas.
Contas no vermelho até 2026
O Estado de S. Paulo
Ao projetar déficit até o fim da gestão de
Lula, aumentando o descrédito já generalizado sobre o esforço fiscal, FMI
sugere ‘esforço mais ambicioso’ do Brasil – que provavelmente não virá
O arcabouço fiscal será incapaz de
estabilizar, no tempo previsto pelo governo, a dívida pública brasileira, que
continuará crescendo neste e nos próximos cinco anos, pelo menos. Em resumo, é
isso o que mostra um relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI), que
retira de vez a credibilidade – se é que ainda havia alguma – do compromisso do
governo de Lula da Silva de conter a dívida com a produção de superávit nas
contas públicas. Pelos cálculos do FMI, as contas só voltam ao azul em 2028, e
a redução da dívida dependerá de um “esforço mais ambicioso” do Brasil.
Os dados foram divulgados esta semana, dois
dias depois de o governo anunciar as novas – e bem menos rigorosas – metas para
os resultados fiscais de 2025 e 2026. O que significa que a avaliação do Fundo
poderia ter sido ainda mais crítica diante do afrouxamento das métricas do
arcabouço. É verdade que a promessa de déficit zero para este ano já estava
eivada de descrédito, e por mera questão de prazo legal o objetivo permanece
inalterado. Mas para o ano que vem as expectativas ainda se fiavam em algum superávit,
mesmo que inferior ao 0,5% do PIB originalmente previsto. Agora, o governo
praticamente jogou a toalha ao admitir continuar no vermelho também em 2025 e
2026.
A decisão de mudar a estimativa de superávit
de 2025 para meta zero foi traduzida pela maioria dos analistas como a admissão
de um novo déficit, já que há uma margem permitida de 0,25 ponto porcentual
para cima (improvável, diante da conjuntura atual) ou para baixo. Para 2026, o
prometido superávit, que era de 1%, foi revisto para 0,25%, o que foi entendido
pelo mercado como um sinal de que nem isso será alcançado, principalmente por
se tratar de um ano de disputa presidencial. Imperativos eleitoreiros têm prevalecido
sobre a necessidade de concentrar o esforço fiscal mais na redução das despesas
do que no aumento da receita.
Ao prever que a trajetória da dívida pública
brasileira caminha para alcançar 93,9% em 2029 – o último horizonte de cálculo
do Monitor Fiscal do FMI –, o Fundo emparelha o Brasil com países em
dificuldade extrema, como a Ucrânia, em guerra há dois anos, e o Egito, em
gravíssima crise econômica. Apesar disso, a projeção ano a ano para o Brasil
ficou menos ruim do que o cenário anterior traçado pelo Fundo: a relação para a
dívida em 2024 caiu de 90,3% do PIB para 86,7%; para 2025, passou de 92,4% para
89,3%.
Há um conjunto de bons parâmetros que, numa
gestão responsável, poderiam contribuir para um planejamento eficiente de longo
prazo. Por exemplo, a perspectiva de o Brasil ingressar, neste ano ou no
próximo, no clube das economias com PIB acima de US$ 3 trilhões. Passaria, com
isso, da 9.ª para a 8.ª posição entre as maiores economias do mundo. O País
está num momento raro que permitiria elaborar uma equação combinando rigor
fiscal e investimento, não fosse a visão eleitoreira, inconsequente e
imediatista que caracteriza o lulopetismo.
Isso ficou muito claro no acordo recente
firmado entre a Casa Civil e o Congresso para antecipação do gasto extra de R$
15,7 bilhões, previsto apenas para maio, mas que poderia ser inviabilizado por
receitas abaixo do previsto, conforme as regras do arcabouço – devidamente
dribladas.
O equilíbrio fiscal é uma agenda a ser
adotada pelo Executivo e pelo Congresso, mas é necessário que o governo
demonstre genuíno compromisso com a consolidação fiscal, o que é posto em
dúvida a cada novo ataque ao Orçamento e a cada declaração de Lula e dos
petistas no sentido de que é preciso gastar mais para promover o crescimento
econômico e, assim, gerar superávits por mágica.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad,
preferiu enxergar o relatório do FMI sob a ótica da projeção menos ruim da
dívida pública para este ano e para 2025, desconsiderando que a relação de
90,9% prevista para o último ano do governo Lula da Silva colocará o Brasil em
posição pior do que a da estropiada Argentina de Javier Milei. A equipe
econômica calcula em 1% ao ano o superávit necessário para buscar a
consolidação fiscal. Por tudo o que se viu até agora, este não é de forma
alguma o espírito do governo.
Comissão de Ética sem ética
O Estado de S. Paulo
Órgão que zela pela ética pública não vê nada demais no uso de gabinete pelo sogro de ministro
Ao arquivar, em decisão unânime, uma
investigação contra o ministro das Comunicações, Juscelino Filho, a Comissão de
Ética Pública da Presidência da República resolveu dar uma demonstração
inequívoca de sua inutilidade. No ano passado, o Estadão revelou a existência
de um gabinete paralelo no Ministério das Comunicações: ali se aboletou o sogro
do ministro, o empresário Fernando Fialho, para transformar a pasta em
escritório privado. Sem qualquer função ou cargo oficial – nem no ministério
nem em qualquer outro órgão público – Fialho recebia empresários, num flagrante
uso da administração pública para interesses privados.
A farta evidência não foi suficiente para
sensibilizar os integrantes da Comissão de Ética da Presidência. Oficialmente,
o colegiado é responsável pela aplicação do Código de Conduta da Alta
Administração Federal, por ajudar a interpretar o Código de Ética do Servidor
Público e manifestar-se em consultas sobre a possível existência de conflito de
interesses. Pois agora se descobriu que seus sete integrantes nada viram de
interesses em conflito na vistosa agenda do sogro de Juscelino.
Não lhes importou que a rotina na pasta tenha
sido admitida pelo próprio ministro, que garantiu tratar-se de um “apoio”
devido à “sua experiência”. Uma experiência não em telecomunicações, faltou
dizer, como atesta o histórico profissional do empresário. Também lhes pareceu
mero detalhe um parente dar expediente no ministério, sem cargo oficial, sem
credenciais na área e sem justificativa legal. Para o relator do caso, Bruno
Espiñeira Lemos, tal atitude mereceu não uma reprimenda, mas uma recomendação –
quase um pedido de amigo: sugeriu ao ministro que o sogro evite tal rotina.
Apoiado pelo voto dos seus colegas, Lemos
assim justificou a atitude do ministro e de seu sogro: o primeiro ano do
governo significou uma nova estrutura nos ministérios e “diversos órgãos foram
completamente recriados”. Por isso, ele sustentou, “há de se entender as
dificuldades que todas as pastas enfrentaram no período, inclusive o Ministério
das Comunicações”. Ocorre que a pasta chefiada por Juscelino Filho já existia
no governo anterior, e o ministro manteve a equipe que trabalhava com o
antecessor, Fábio Faria. A marotagem não cola, portanto.
Resta questionar qual a serventia de uma
Comissão de Ética que se mostra incapaz de condenar tão flagrante afronta ao
interesse público. Se inútil para o interesse público, a comissão parece
providencial para o próprio governo.
Inquestionável mesmo é o responsável pela
preservação das estripulias privadas de Juscelino Filho: Lula da Silva. É o
presidente, afinal, quem o mantém no Ministério das Comunicações, enquanto se
acumulam suspeitas: o ministro já foi acusado de favorecimento pessoal no
direcionamento de emendas parlamentares, usou avião da Força Aérea Brasileira
para participar de um leilão de cavalos e escondeu patrimônio da Justiça
Eleitoral, entre outras evidências. Também nada entende de Telecomunicações, e
seu partido, o União Brasil, é incapaz de entregar votos no Congresso.
Mais misteriosa do que essa longevidade só a justificativa para a interpretação generosa de condutas antiéticas feitas pela tal Comissão de Ética da Presidência.
Mais investimentos, empregos e renda
Correio Braziliense
O avanço de 2,9% do Produto Interno Bruto
(PIB) em 2023, com forte recuperação do mercado de trabalho, permitiu que a
renda média dos brasileiros tivesse aumento de 11,5%, um ganho muito bom
Os dados da Pesquisa Nacional por Amostras de
Domicílios (Pnad), divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), ampliam as responsabilidades dos Três Poderes em relação ao
país. Conquistas como a queda da pobreza extrema a níveis históricos não podem
ser perdidas por causa de disputas mesquinhas, que coloquem em risco a
economia, cujo desempenho vem surpreendendo os mais otimistas.
O avanço de 2,9% do Produto Interno Bruto
(PIB) em 2023, com forte recuperação do mercado de trabalho, permitiu que a
renda média dos brasileiros tivesse aumento de 11,5%, um ganho muito bom. O
foco do governo no Bolsa Família complementou o impulso do PIB, reduzindo a
desigualdade social. Pelos cálculos da Fundação Getúlio Vargas (FGV), 11,3
milhões de pessoas ascenderam à classe média no ano passado, mais do que a
população de Portugal.
Portanto, é vital que Legislativo, Executivo
e Judiciário aparem as arestas, deixem as divergências de lado e concentrem os
esforços no que realmente interessa à população: a melhoria da qualidade de
vida. Números preliminares apontam que a atividade teve um salto entre 0,6% e
0,9% no primeiro trimestre do ano ante os últimos três meses de 2023. Ou seja,
a economia continua rodando, criando empregos e gerando renda, movimento
fundamental num Brasil em que, apesar dos avanços, 8,3% da população continuam
vivendo na miséria.
Há muito a ser feito, e parte importante do
trabalho está no Congresso, que, nos últimos meses, tem se mostrado insensível
às demandas da sociedade, aprovando projetos que representam retrocessos em vez
de se dedicar a temas realmente relevantes. Além de não fechar brechas que
permitem a determinadores setores avançarem sobre as receitas públicas, mesmo
contribuindo pouco para o bom andamento da economia, cria despesas
insustentáveis, como o quinquênio a juízes e procuradores, ao custo anual de R$
42 bilhões.
O descompasso do Legislativo em relação ao
desejo da população é tão grande, que deputados e senadores ameaçam a
regulamentação da reforma tributária sobre o consumo. O projeto aprovado foi um
avanço extraordinário depois de mais de três décadas de debate. Essa
regulamentação permitirá que o país dê um passo à frente e avance na tributação
da renda a fim de corrigir aberrações como a de o rendimento médio mensal do 1%
mais rico da população — cerca de 2 milhões de brasileiros — corresponder a
39,2 vezes o ganho dos 40% mais pobres.
Isso, num país que registra deficit nas
contas públicas. Quer dizer: são os que recebem mais que vêm se apropriando da
transferência de renda feita pelo governo. Não que a tributação maior sobre a
renda dos mais ricos vá resolver os problemas de caixa do Tesouro Social. Mas é
questão de justiça. É para isso que o Executivo, o Legislativo e mesmo o
Judiciário devem se atentar. Não há mistérios, basta apenas vontade desses
atores para deixar os interesses partidários de lado e se voltar para o povo,
como manda a Constituição.
Os últimos 10 anos foram terríveis para o
Brasil. Mergulhou em uma severa recessão, enfrentou o impeachment de uma
presidente, passou por um governo que tensionou até o limite a democracia, teve
de encarar uma pandemia terrível e ainda viu uma tentativa de golpe de Estado
fracassada. Independentemente de todos esses percalços, o país se refez,
garantiu a solidez das instituições, voltou a crescer economicamente e reduziu
a extrema pobreza ao menor nível (8,3%) desde o início da série histórica.
Poucas nações têm a capacidade de mostrar tamanha resiliência.
Sendo assim, espera-se que os esforços, ainda que tímidos, no sentido de acalmar os ânimos na política e de estabelecer prioridades em favor da população dê resultados concretos. Em um ambiente de tranquilidade, transparente e de previsibilidade, os agentes econômicos cumprirão à risca o que lhes cabe nesse jogo: investir no aumento da produção, criar empregos e distribuir renda.
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