Folha de S. Paulo
Campanha contra Fernando Haddad frauda ou não
compreende estatísticas e tributos
Em junho, explodiu uma revolta contra outra
tentativa de Fernando
Haddad de aumentar impostos, ainda que não mexesse em alíquotas —foi
a história do PIS/Cofins. Desde então, se tornou mais intensa a campanha
contra "Taxadd", na qual há mentiras ou distorções sobre os
números mais elementares.
Para começar, por triste ignorância, má-fé ou
as duas coisas, compara-se a carga tributária bruta do GOVERNO GERAL de vários
anos. "Governo geral" quer dizer governo central (federal), governos
estaduais e governos municipais.
Seja lá o que se queira dizer sobre a carga de Lula 3 ou do presidente X, o governo federal não é responsável direto pela tributação estadual ou municipal.
Pela estimativa da Secretaria do Tesouro
Nacional, a carga tributária bruta foi o equivalente a 32,44% do PIB em 2023. A
carga federal foi de 21,99% do PIB. A estadual, de 8,12% do PIB. A municipal,
2,32%. Desde 2010, a carga tributária flutua em torno de 32,3%. O último grande
aumento ocorreu nos anos FHC (1995-2002), aliás por feia necessidade.
Note-se ainda que o governo federal não fica
com tudo o que arrecada. Por obrigação legal, repassa parte da receita a
estados e municípios (em média uns 18% da arrecadação total, na última década),
fora as transferências voluntárias.
A carga tributária geral CAIU de 2022 para
2023 (embora a dos municípios tenha aumentado ligeiramente). Carga tributária é
apenas uma fração: quanto dinheiro obteve-se com receitas tributárias como
proporção do produto da economia (PIB) em um ano. Não tem a ver necessariamente
com nível de alíquotas ou criação de impostos.
Em geral, sem aumento de alíquotas ou criação
de impostos, a receita tende a crescer um pouco mais do que o PIB em anos em
que a economia está acima do potencial, menos quando está abaixo. No longo
prazo, receita e PIB crescem no mesmo ritmo.
A receita pode crescer mais porque um setor
econômico mais pagador de impostos cresceu mais. Ou, como no caso do Brasil
recente, os preços do petróleo foram maiores. A arrecadação de um governo
também pode estar sujeita a normas e alíquotas de tributos definidas em
administração anterior. O governo não tem controle preciso sobre o tamanho da
carga, mesmo se bem livre para aumentar impostos.
Sim, Haddad diz desde 2023 que pretende
aumentar a receita do governo federal —a conta do valor da receita é
ligeiramente diferente do cálculo da carga tributária, por motivo que não vem
ao caso para esta discussão. Por falar nisso, o cálculo oficial da carga é
feito pela Receita Federal (ainda não há dados para 2023). A tendência das
várias contas é a mesma.
Sem aumento de receita, contenção de despesa
e reorganização geral do Orçamento não haverá equilíbrio nas contas públicas.
A receita líquida do governo federal foi de
17,5% do PIB em 2023. A de 2022, 18,4% de 2022; a de 2019, de 18,2%. Receita
líquida: arrecadação federal menos transferências obrigatórias para estados e
municípios.
Lula 3 aumentou impostos, com anuência do
Congresso. Sobre fundos de investimentos de ricos. Diminuiu isenções
tributárias de empresas. Etc. Não foi o bastante para que a arrecadação federal
aumentasse, como proporção do PIB, o que depende, como se disse, do ritmo de
atividade econômica e de cada setor, de preços relevantes, do andamento do
mercado formal e informal de trabalho, de mudanças de comportamento de
contribuintes etc.
Se Lula 3 têm um bom plano de impostos ou de
gastos é motivo para debate. Mas essa campanha é politicagem baixa, muita vez
de quem quer passar a conta dos impostos para outrem, mais pobre e sem poder.
É o que se vê também na reforma dos impostos sobre consumo e o que vai se ver em qualquer reforma tributária deste nosso sistema injusto e ineficiente.
2 comentários:
Excelente! Como bem afirma o colunista: "Desde 2010, a carga tributária flutua em torno de 32,3%. O último grande aumento ocorreu nos anos FHC (1995-2002)." FHC iniciou seu governo com menos de 25% de carga tributária e terminou com bem mais que 30%. Lula, Dilma e Bolsonaro realmente mantiveram a carga quase estável, depois dos TREMENDOS AUMENTOS durante os governos FHC. Os que idolatram o plano Real gostam de esquecer/ignorar isto.
Verdade.
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