Maior desafio de Galípolo é manter confiança no BC
O Globo
Novo presidente precisará pautar sua gestão
por parâmetros técnicos, como tem feito no cargo de diretor
Como esperado, o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva indicou o economista Gabriel Galípolo para comandar o
Banco Central (BC) a partir de janeiro, depois que acabar o
mandato do atual presidente, Roberto
Campos Neto. Galípolo, atual diretor de Política Monetária do BC,
terá o desafio de manter a confiança na condução da política monetária. Pelo
que tem demonstrado até aqui, não há motivo para duvidar de sua capacidade de
executar a tarefa.
Qualquer nome indicado para comandar o BC será sempre alvo de escrutínio. No caso de Galípolo, a vigilância será maior. O motivo é a campanha — injusta — promovida por Lula contra Campos Neto desde o início do governo. Até o final do ano, o chefe do Executivo terá de escolher mais três diretores do BC. Com isso, a maioria dos integrantes do Comitê de Política Monetária (Copom) terá sido indicada por ele. Cria-se naturalmente o temor de interferência na política monetária.
Para dissipar esse temor e manter a inflação
sob controle, o essencial é que as decisões de Galípolo e dos novos indicados
continuem a ser estritamente técnicas. O sistema de metas de inflação tem se
provado um instrumento eficaz para influenciar o setor produtivo e os
consumidores. Mas a base de tudo é a credibilidade. Sem confiança, a ancoragem
das expectativas inflacionárias não funciona. Por isso é essencial que, a cada
pronunciamento, a cada reunião do Copom, Galípolo demonstre que se guia pelos
mesmos parâmetros técnicos que o têm guiado desde que assumiu a diretoria do
BC.
O histórico recente sugere que a transição se
dará sem sobressaltos. Nas duas últimas reuniões, o Copom manteve a taxa de
juros inalterada em 10,5% ao ano por unanimidade. Na semana passada, Campos
Neto afirmou não se lembrar de ter havido “espírito de equipe tão grande”
quanto o existente entre ele e os demais diretores do BC.
Seu legado é inegavelmente positivo. O BC
brasileiro foi um dos primeiros a subir os juros diante dos riscos
inflacionários trazidos pela pandemia. De 2% em março de 2021, a taxa foi a
13,75% em agosto do ano seguinte — e lá se manteve por quase um ano, sem
nenhuma concessão no período eleitoral. Com isso, a inflação caiu de 10,06% em
2021 para 4,62% no ano passado, abaixo do teto da meta (4,75%). Os atuais dados
positivos de nível de emprego e de renda mostram que o Brasil, na comparação
internacional, se recuperou melhor dos efeitos da Covid-19.
Antes de Galípolo assumir, o Copom passará
por novo teste na reunião prevista para setembro. As expectativas de inflação
subiram recentemente, mas o banco central americano, o Fed, anunciou que
começará a reduzir os juros no mês que vem. Com isso, a tendência é haver mais
dólares por aqui, aliviando a pressão sobre o câmbio e os preços. O Copom terá
de decidir se mantém ou sobe os juros brasileiros. É crucial que apresente seus
argumentos de forma objetiva, com base em parâmetros técnicos. E que essa prática
continue na gestão Galípolo depois que ele passar pela sabatina no Senado.
Exército faz bem em abrir inquérito contra
autores de carta golpista
O Globo
Indícios incriminam quatro coronéis que
escreveram texto pedindo golpe para impedir posse de Lula
O comandante do Exército, general Tomás Paiva,
age corretamente ao determinar abertura de inquérito policial militar para
investigar quatro coronéis — dois da ativa e dois da reserva —, autores de uma
carta que, em 2022, pressionava o comando da Força a dar um golpe impedindo a
posse do então presidente eleito, Luiz Inácio Lula da
Silva (PT). O Exército detectou indícios de crime no episódio e terá 30 dias,
prorrogáveis por mais 30, para concluir a investigação.
Uma sindicância investigou 46 oficiais quando
foi descoberta a carta, endereçada ao então comandante do Exército, general
Marco Antônio Freire Gomes. Concluiu que 37 participaram no episódio: quatro
escreveram o texto e 33 o assinaram. Ao final, 11 deixaram de ser punidos
depois de apresentar justificativas plausíveis. Outros 26 receberam punições
disciplinares, de prisão a advertência. Os quatro que redigiram o documento
serão agora submetidos à investigação criminal.
De acordo com o Exército, a carta é “uma
manifestação de cunho político, o que se caracteriza como transgressão
disciplinar para os militares da ativa”. Pela lei, quem está na ativa não pode
emitir opinião política. O documento foi encontrado no celular do
tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. A investigação
sugere que tenha sido produzido numa reunião em novembro de 2022, depois das
eleições que decretaram a vitória de Lula. Em depoimento à Polícia Federal,
Freire Gomes disse ter tomado ciência da carta por meio do setor de Comunicação
Social do Exército. Ele afirmou que se opôs aos planos golpistas e ordenou
investigações para identificar os envolvidos.
A carta com o pedido de golpe ilustra o
momento de convulsão que o Brasil vivia no fim do governo Jair
Bolsonaro. Depois da confirmação de sua derrota, o país foi tomado
por bloqueios de estradas e acampamentos em frente a quartéis pedindo uma
descabida intervenção militar. A instabilidade desaguou no 8 de Janeiro, quando
apoiadores de Bolsonaro, em ações coordenadas e violentas, invadiram as sedes
do Supremo Tribunal Federal, do Congresso Nacional e do Executivo,
protagonizando uma das páginas mais tristes e vergonhosas da nossa História.
Graças à atuação firme das instituições
republicanas, o Brasil manteve a normalidade democrática. E isso pressupõe
respeito às leis. Como qualquer cidadão, militares da ativa podem ter
convicções ideológicas ou preferências eleitorais. Mas não podem emitir
opinião. Muito menos escrever ao comando do Exército pressionando por golpe de
Estado. Isso é crime seja o autor civil ou militar, da ativa ou reformado.
Em que pese o golpismo de alguns, as Forças
Armadas desempenharam até aqui seu papel constitucional com
correção. Isso ficou patente quando se negaram a embarcar na aventura do golpe.
Por isso mesmo os desvios devem ser rechaçados pela própria tropa e punidos na
forma da lei, com amplo direito de defesa e sem qualquer vestígio de
revanchismo. Quem errou deve responder por seus atos. É assim que funciona numa
democracia.
Decisão sobre juro é teste para Galípolo no
comando do BC
Valor Econômico
Espera-se que Galípolo mantenha independência
de julgamento, apego aos dados e autonomia, como fez seu antecessor
Na primeira sucessão do Banco Central
autônomo, Gabriel Galípolo, atual diretor de Política Monetária, foi indicado
para ser o próximo presidente da instituição. A substituição de Roberto Campos
Neto seguiu um ritual sugerido pelo próprio: a indicação ocorreu com bastante
antecedência para que o Senado tenha tempo suficiente para avaliar o nome e
decidir tempestivamente. Pelas críticas do presidente Lula à política monetária
do BC e a Campos Neto, a quem considerava um adversário político, a transição, que
poderia ser tumultuada, se transformou, como deve ser, em um processo ordenado
e tranquilo.
Egresso do Banco Fator, Galípolo foi por
alguns meses o braço direito do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, como
secretário executivo. Sua ascensão à diretoria do BC já prefigurava sua
trajetória rumo à Presidência, confirmada ontem. Não se esperam problemas para
sua ratificação pelo Senado, onde cultivou ao longo do tempo um bom
relacionamento.
Como economista mais heterodoxo, sua chegada
ao Banco Central, em julho de 2023, foi inicialmente recebida por boa parte dos
investidores como um augúrio de uma guinada na política monetária rumo à
leniência no cumprimento das metas de inflação e um alinhamento com as
diretrizes econômicas do Planalto. Mas suas decisões têm mostrado um
compromisso mais técnico e ele não tem feito oposição à conduta do colegiado do
BC, considerado ortodoxo demais pelo presidente Lula, que acredita que os juros
deveriam cair mais rápido.
Na reunião de maio, houve certo ruído porque
Galípolo e mais três diretores indicados pelo atual governo votaram por um
corte de 0,5 ponto na Selic, em uma decisão desempatada por Campos Neto, que
defendeu corte menor, de 0,25 ponto. Foi quando os investidores enxergaram, com
exagero, uma divisão na instituição que refletiria obliquamente o cisma
lulistas contra bolsonaristas da cena política. O estrago da divisão nos preços
dos ativos foi grande, mas, logo depois, Galípolo afirmou que cogitou também o corte
de 0,25 ponto na ocasião. A impressão também foi alterada por votações
subsequentes unânimes para interromper o ciclo de queda dos juros e, na última
reunião, para deixar em aberto a possibilidade de novo aperto monetário.
A necessidade de uma carga maior de juros
para conter uma inflação cujas expectativas se distanciam da meta divide os
investidores. Parte deles vê as últimas declarações de Galípolo, de que a alta
dos juros “está na mesa” do Copom, como um fato a ser consumado na reunião do
Comitê em 17 de setembro.
A próxima reunião do Copom, da qual Galípolo
participará como virtual novo presidente do BC, antecipa no calendário seu
“batismo de fogo” à frente da instituição. Simplificadamente, a dúvida é se ele
defenderá aumento de juros diante da contrariedade do Planalto com tal medida.
Galípolo, no entanto, se mostrou alinhado com o colegiado do BC e assinou
embaixo da advertência de que a autoridade monetária “não hesitará em elevar a
taxa de juros” se for apropriado.
A adoção de uma política ainda mais
contracionista, com juros altos, de 6% acima da inflação, não é uma decisão
fácil, nem está claro ao mercado que é a mais adequada. Da reunião de julho até
agora, não houve piora nas condições prospectivas da inflação. A política
fiscal segue expansionista, embora em menor grau, porque o governo tentará
cumprir a meta fiscal e se aproximará dela. O dólar, que havia disparado com
temores de recessão nos EUA e espetacular mudança no fluxo de carry trade
(busca de ganho com diferenças entre as taxas de juros dos países) após aumento
de juros no Japão, recuou muito. A perspectiva mudou e é mais favorável: o Fed
deu sinal verde para a queda de juros e a economia americana mantém a
perspectiva de pouso suave.
Além disso, o boletim Focus prevê
desaceleração da economia em 2025 (1,86%), com taxa Selic de 10% ao fim do ano
que vem. Os juros futuros, em torno de 6% reais, apertam as condições de
crédito, enquanto os efeitos defasados da política monetária apontam a economia
ainda sob uma carga forte de Selic de 13,25% (setembro de 2023).
O IPCA-15, de 0,19% em agosto (4,35% em 12
meses), trouxe boas notícias. A média dos núcleos de inflação acompanhados pelo
BC recuou. Mais importante, a inflação dos serviços subjacentes, hoje
determinantes do processo de alta de preços, diminuiu de 5,15% para 4,72%,
segundo cálculos da Warren Investimentos para a evolução trimestral
dessazonalizada e anualizada. Na projeção mensal pelos mesmos parâmetros,
involuiu de 6,5% em julho para 3% em agosto (Quantitas). Os serviços intensivos
em trabalho tiveram a menor alta desde novembro. Alimentos, cujo papel baixista
sobre o IPCA teria acabado, segundo o Copom, teve deflação em julho, que se
mantém em agosto.
Com todo esse cenário, o mercado está dividido sobre a necessidade de alta dos juros. Alguns apostam que seria melhor esperar mais com a taxa a 10,5% do que elevá-la apenas um mês depois da interrupção do ciclo de baixa, enquanto algumas casas de investimento projetam alta imediata. O voto de Galípolo será observado com atenção e dará um sinal do que pode ser sua gestão à frente do BC. Espera-se que ele mantenha independência de julgamento, apego aos dados e autonomia, como fez seu antecessor.
Creche precisa ser tema nas eleições
municipais
Folha de S. Paulo
Com falta de vagas nesses estabelecimentos,
urge política para a primeira infância, e prefeituras têm papel fundamental
Um dos temas mais importantes a serem
debatidos nas eleições municipais é o da educação na primeira
infância (0 a 6 anos). Ações voltadas para essa faixa
etária repercutem ao
longo de todo o percurso escolar e no futuro profissional, o que
contribui para a qualidade de vida dos indivíduos e o desenvolvimento do país.
Ademais, pesquisas evidenciam o papel de tais
políticas na diminuição da desigualdade
de gênero, já que a maternidade afeta os
salários e a empregabilidade das mulheres.
O ponto de partida dessa trajetória é a
creche, que atende a faixa de 0 a 3 anos. As deficiências brasileiras nessa
seara, em quantidade e qualidade, são históricas, apesar de melhorias pontuais.
Segundo levantamento divulgado pelo
Ministério da Educação na terça-feira (27), 632,8 mil
crianças esperam por vagas em creches, e 44% dos municípios têm
filas para esse serviço. Na pré-escola (4 e 5 anos), são 78,2 mil ausentes,
sendo que metade (39 mil) não está em sala de aula por falta de vagas.
Pela lei, a matrícula na rede de ensino é
obrigatória aos 4 anos, mas o Estado tem de atender o público de 0 a 3 anos se
houver demanda.
De acordo com o Censo Escolar de 2023, 4,1
milhões estão em creches públicas e privadas, o que representa 39% das crianças
nessa faixa etária. Apesar do aumento gradual (em 2005, a taxa era de 17%), não
se atingiu a meta estipulada em 2014 pelo Plano Nacional de Educação, de 50% em
2024.
Há grande desigualdade regional também. Os
índices são menores no Norte (21%), no Centro-Oeste (32%) e no Nordeste (35%);
Sudeste e Sul (46%) estão acima da média nacional. A região amazônica de fato
apresenta desafios, como a geografia e as enormes distâncias.
Creches são de responsabilidade das
prefeituras, mas governos estaduais e federal têm obrigação de apoiar as redes
municipais. Cumpre que o tema faça parte dos programas dos candidatos para as
eleições que se avizinham.
A gestão de Luiz Inácio Lula da
Silva (PT)
prometeu, no ano passado, dar continuidade a obras paradas no setor de
educação, mas até o momento nenhuma foi retomada. De um total de 3.783
construções abandonadas, 1.317 (35%) são para creche e pré-escola.
Os principais gargalos da educação brasileira
se concentram no ensino básico, cujo pilar é a atenção à primeira infância.
Eliminação de filas e planos pedagógicos precisam ser prioridades locais.
Marçal testa limites
Folha de S. Paulo
Ante candidato antissistema, Justiça deve
agir com celeridade e autocontenção
Pablo Marçal é
um influenciador com discurso radical de direita antissistema. Em condições
normais, seria um candidato nanico à prefeitura paulistana, pois sua legenda é
o inexpressivo PRTB, que não tem direito a tempo de rádio e TV nem ao fundo
partidário, recebendo tão somente uma migalha do fundo eleitoral.
Mas Marçal é um desses fenômenos da internet
e subiu nas
pesquisas do Datafolha, empatando na margem de erro com Guilherme
Boulos (PSOL)
e o prefeito Ricardo Nunes (MDB),
com quem disputa o voto bolsonarista. Cumpre aguardar novas sondagens de
intenção de voto para verificar se a ascensão é efêmera ou mais durável.
Não são poucas as vulnerabilidades do
postulante, que incluem uma condenação por furto qualificado, que acabou
prescrita, e a acusação de vínculos com o PCC.
A conduta tresloucada de Marçal em
manifestações públicas, quando se mostra disposto a ataques gratuitos e sem
fundamento a adversários, criou problemas até para a organização dos debates.
A candidatura populista se tornou também alvo
da Justiça
Eleitoral, dado que em um curto período de tempo desde a
pré-campanha acumulou um número expressivo de irregularidades em potencial.
A providência judicial mais dura até aqui foi
a suspensão dos perfis de Marçal nas redes sociais, a partir do argumento de
que o candidato comete abuso de poder econômico ao premiar com dinheiro
seguidores que divulgam na internet vídeos curtos de participações dele em
entrevistas e debates.
O efeito prático da medida, porém, foi
favorecer o punido —que criou novas contas, reforçou seu discurso de vítima do
establishment e teve sua
visibilidade multiplicada nas plataformas digitais.
Nos meios político e jurídico, avalia-se que
os desmandos de Marçal podem levar até à inabilitação de sua chapa. Já houve,
por parte do Ministério Público Eleitoral, um pedido de suspensão da
candidatura, negado em
primeira instância.
Se tem a obrigação de zelar pelo cumprimento
de uma legislação por vezes muito detalhista, a Justiça Eleitoral precisa atuar
com celeridade, de modo a tomar as decisões antes da abertura das urnas, e
também autocontenção.
Na democracia, cabe aos eleitores, não a
magistrados, definir quem serão os governantes. Idealmente, portanto, as cortes
deveriam reservar inabilitações e cassações a raras e extremas situações.
Gás eleitoral
O Estado de S. Paulo
De olho na eleição de 2026, governo propõe
quadruplicar as despesas com o Auxílio Gás e o número de famílias alcançadas
pelo programa num arranjo que parece driblar regras fiscais
O governo Lula da Silva anunciou que pretende
quadruplicar o gasto com o Auxílio Gás dos atuais R$ 3,4 bilhões para R$ 13,6
bilhões até 2026. Na nova versão, o programa será rebatizado de Gás para Todos
e passará a atender quase 21 milhões de famílias às vésperas da eleição
presidencial. Atualmente, o Auxílio Gás atende 5,6 milhões de famílias, que
recebem um benefício equivalente à compra de um botijão de gás a cada dois
meses.
A partir de agora, a Agência Nacional do
Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e a Caixa Econômica Federal
ganharão protagonismo na operacionalização do programa. A ANP deverá credenciar
as revendedoras que desejarem participar do programa e definir um preço-teto
para o botijão, e a Caixa receberá repasses diretos da União e da estatal
Pré-Sal Petróleo (PPSA) para remunerar o comércio.
Na avaliação do governo, a forma como o
programa original foi elaborado não combate a pobreza energética, dado que os
botijões são caros e os beneficiários preferem gastar o dinheiro que recebiam
por meio do Auxílio Gás com outros itens, recorrendo ao uso de lenha, álcool e
carvão para cozinhar – fontes mais baratas e perigosas.
Se esse é o problema, o programa não vai
resolvê-lo. Ao contrário: tende a aumentar a demanda e a fazer com que os
preços dos botijões subam ainda mais. Estabelecer um preço-teto nesse cenário
será inócuo. Ademais, nada impede que os beneficiários revendam o botijão ou
troquem-no por outros produtos.
Para as distribuidoras, de fato, a medida do
governo é excelente, pois terão a garantia de que esses recursos chegarão a
elas, uma reclamação recorrente do setor sobre o desenho atual do Auxílio Gás.
Hoje, os beneficiários precisam ser “convencidos” a gastar os recursos que
recebem com os botijões, um incentivo para que elas pratiquem preços mais
baixos ou ao menos mais competitivos que os de seus concorrentes.
Há também problemas fiscais relacionados à
iniciativa. Como não há espaço no Orçamento para elevar esses gastos, o governo
pretende fazer repasses diretos à Caixa para bancar o programa. O projeto
também autoriza a PPSA a enviar ao banco os valores equivalentes às receitas de
comercialização da venda do excedente em óleo do pré-sal, que serão deduzidos
das obrigações da empresa com a União em um encontro de contas.
Na Exposição de Motivos do projeto de lei, o
governo afirma que a proposta é “meramente autorizativa” e “não implica redução
de receita pública”. Não parece crível, e cabe à equipe econômica esclarecer
algumas questões, entre elas a forma como as receitas e despesas do programa
serão contabilizadas no Orçamento – se é que os recursos vão transitar por lá.
O secretário executivo do Ministério do
Planejamento, Gustavo Guimarães, disse não saber o tamanho da renúncia, que
dependerá do desenho final da proposta, e afirmou que é possível que o programa
exija ajustes, via redução de gastos obrigatórios ou discricionários ou redução
de espaço das despesas no futuro.
Já o secretário executivo do Ministério da
Fazenda, Dario Durigan, atribuiu a autoria do projeto ao Ministério de Minas e
Energia e afirmou que a Fazenda avaliou somente a compatibilidade da proposta
com o arcabouço fiscal e o Orçamento. Segundo ele, o programa não consumirá o
corte de gastos de R$ 25,9 bilhões previsto para 2025.
O governo tem todo o direito de propor
políticas públicas como a ampliação do Auxílio Gás, desde que siga os
dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal e arque com o custo político e
econômico de suas decisões. Bastaria prever, na peça orçamentária, a elevação
das alíquotas de impostos, ampliação da base de cálculo ou criação de novos
tributos e submetê-las ao Congresso.
Enquanto cobra austeridade do Congresso, o
governo recorre a subterfúgios para financiar uma proposta que mira o horizonte
eleitoral e que parece driblar o arcabouço fiscal. Em meio ao embate sobre a
participação das emendas parlamentares no Orçamento, fica a impressão de que há
dois pesos e duas medidas em se tratando de gastos, e que a ideia só é ruim
quando ela não vem do governo.
O dever de condenar Maduro
O Estado de S. Paulo
Após relatos de que Maduro estaria prendendo
e torturando adolescentes por ‘atos terroristas’, a Lula não cabe outra posição
digna que não a condenação veemente do regime chavista
O ditador Nicolás Maduro está babando de ódio
pela oposição desde que sua fraude para se aferrar ao poder ficou evidente não
só para a esmagadora maioria da população da Venezuela, como também para todos
os países que prezam pela democracia e pelos direitos humanos. A sanha
persecutória de Maduro parece ter atingido um patamar de violência inaudito até
para o conhecido padrão de crueldade do regime chavista. Segundo fontes ouvidas
pelo jornal The Washington Post, Maduro teria lançado seus meganhas contra
mais de uma centena de menores de idade acusados de praticar “atos
terroristas”, como passaram a ser tratadas pelo regime de Caracas quaisquer
manifestações de repúdio à subversão da vontade popular consagrada nas urnas.
De acordo com esses relatos, as forças de
segurança de Maduro, sem falar nas temidas milícias a serviço do Palácio de
Miraflores, conhecidas como “Coletivos”, teriam sequestrado 120 adolescentes,
vários deles arrancados do seio de suas famílias por homens armados até os
dentes em plena madrugada, para serem jogados em prisões onde estariam sendo
submetidos a suplícios de toda ordem. Esses menores estão entre os cerca de 1,6
mil venezuelanos que já foram presos a mando de Maduro após a irrupção de uma
onda de protestos que varreu o país vizinho desde que a fraude eleitoral restou
cabalmente comprovada por instituições insuspeitas, como o Carter Center.
Além da prisão arbitrária desses adolescentes
– que não têm sequer permissão para serem assistidos por advogados e tampouco
podem manter contato com seus familiares –, os mastins de Maduro ainda estariam
praticando uma segunda violência contra seus próprios concidadãos. Há denúncias
de que pais e mães, não raro pobres, têm sido extorquidos pelos policiais
chavistas para que paguem – em dólar, claro – pela alimentação de seus filhos
no cárcere ou por um brevíssimo contato físico com eles.
Que tipo de tratamento merece um governo que
põe as suas forças de segurança para caçar cidadãos, inclusive menores de
idade, que simplesmente ousaram contestar o resultado de uma eleição ou às
vezes nem isso?
Pela pletora de barbaridades que Maduro
cometeu desde muito antes da eleição de 28 de julho – apenas o encerramento de
um ciclo de arbitrariedades para conspurcar o processo eleitoral –, o
presidente Lula da Silva, do alto da condição de chefe de Estado e de governo
da maior economia da América do Sul e segunda maior democracia das Américas, já
deveria ter parado de ser complacente com o tirano bolivariano.
Agora, diante desses relatos de prisão e
tortura de adolescentes, Lula tem o dever moral de abandonar a infame posição
de espera pela divulgação das atas eleitorais na qual se colocou – além de
insistir na realização de uma nova eleição, um prêmio para quem a violou – para
condenar de forma inequívoca a fraude e a violência perpetradas por Maduro.
Essa seria a atitude digna do presidente da República a essa altura, se não por
zelo à própria biografia, ao menos por coerência, haja vista que o petista faz
questão de se projetar como articulador de uma formidável frente global em
defesa da democracia. Ademais, enquanto finge não ver as atrocidades de Maduro,
Lula não escolhe palavras quando se trata de condenar países alinhados aos
Estados Unidos, como Israel e Ucrânia, mesmo quando exercem seu direito de se
defender.
Não cabem mais reticências. Não cabe mais
tergiversação. Talvez Lula ansiasse por normalizar a presidência de Maduro,
decerto esperando que ele vencesse uma eleição verdadeiramente limpa, ainda que
comprada pela dinheirama que governos populistas costumam derramar sobre os
estratos mais vulneráveis da população antes do pleito. O governo petista
talvez só não esperasse que quase 70% dos eleitores venezuelanos – os que não
foram impedidos de votar pelo regime – dissessem um sonoro “não” à perpetuação
do caudilho no poder. E agora parece paralisado diante da surpresa.
O caminho é claro. Qualquer posição que não
seja o reconhecimento de uma fraude para lá de comprovada é uma posição mais
que ridícula: é cúmplice.
A história que se repete na Vale
O Estado de S. Paulo
Escolha de presidente encerra especulações,
mas não a pressão do governo na mineradora
A solução interna da Vale, com a escolha do
vice-presidente financeiro, Gustavo Pimenta, para presidir a mineradora,
encerra meses de especulações em torno do interesse do presidente Lula da Silva
em ter um executivo de sua confiança no comando da empresa. Mas está longe de
pôr um ponto final na tensa relação entre o governo e a Vale, como Lula fez
questão de deixar claro ao retomar, já no dia seguinte ao anúncio, o discurso
em que compara a companhia a um cachorro com muitos donos que “ou morre de fome
ou morre de sede, porque todo mundo pensa que colocou água, todo mundo pensa
que deu comida e ninguém colocou”.
O presidente já recorreu a essa mesma
comparação esdrúxula para descrever o modelo de corporation, adotado pela
Vale desde 2020, no qual nenhum acionista pode deter mais do que 10% do capital
e não há controlador definido. Mais de uma vez, Lula da Silva se mostrou ainda
mais ressentido com a pulverização do capital do que com a própria privatização
da empresa, na década de 1990, até hoje abominada pelo PT.
Quando Lula assumiu seu primeiro mandato, em
2003, a Previ (caixa de previdência dos funcionários do Banco do Brasil) e a
Bradespar (empresa de participações do Bradesco) estavam no controle da
mineradora, que tinha também o BNDES como acionista relevante. Roger Agnelli,
que presidia a empresa desde 2001, era presença constante em cerimônias com
Lula, que cobrava, dele e da Vale, investimentos e projetos como se a
mineradora fosse um ministério de seu governo.
Ao longo de seus dois primeiros mandatos, as
exigências em nada se diferenciavam das de agora, duas décadas depois. A Vale
foi obrigada a investir em siderúrgicas, das quais já saiu. Também foi
pressionada a encomendar em um estaleiro ainda não concluído um navio
graneleiro que acabou importando da China. As relações de Lula com a direção da
Vale começaram a azedar durante a crise de 2008, quando a empresa demitiu 1.300
funcionários sem aviso prévio ao governo, e chegaram ao ápice em 2011, no
governo de Dilma Rousseff, quando Agnelli deixou a empresa sob forte pressão do
governo.
Agora, Lula da Silva ataca a Vale pelo
desastre de Brumadinho, um tema de forte apelo popular, e o governo cobra um
adicional pela concessão das ferrovias Vitória-Minas e Carajás, que a empresa
mantém para escoamento do minério. A renovação ocorreu na gestão Bolsonaro, mas
o governo questiona valores. O acordo pode envolver cifras que vão de R$ 8,5
bilhões a R$ 20 bilhões, segundo estimativas de mercado. São dois casos que
testarão a capacidade de negociação do novo presidente da Vale.
Mas o que efetivamente testará o jogo de
cintura de Gustavo Pimenta é a formidável pressão para fazer da Vale a
vanguarda do desenvolvimentismo estatólatra tão caro ao lulopetismo. Não é à
toa que Lula tentou emplacar Guido Mantega no comando da empresa, na certeza de
que o fidelíssimo ex-ministro transformaria uma empresa extremamente
competitiva – porque toma decisões estratégicas baseadas nos interesses de seus
acionistas – num “cachorro” dócil a serviço da ideologia antediluviana do PT.
Creche deve ser compromisso público
Correio Braziliense
Quase metade dos municípios brasileiros, 44%,
tem fila de espera para matrícula em creches. São mais de 630 mil crianças
privadas da vivência em um ambiente que promove o desenvolvimento integral
Quase metade dos municípios brasileiros, 44%,
tem fila de espera para matrícula em creches. São mais de 630 mil crianças, com
até 4 anos, privadas da vivência em um ambiente que promove o desenvolvimento
integral desde a primeira infância. Os dados fazem parte do Retrato da Educação
Infantil no Brasil — Acesso e Disponibilidade de Vagas, divulgado, na
terça-feira, pelo Gabinete de Articulação para a Efetividade da Política da
Educação no Brasil (Gaepe-Brasil) e o Ministério da Educação (MEC). O levantamento
feito nos 5.569 municípios e no DF mostra, ainda, que, entre aqueles que não
planejam expandir as vagas (35%), 23% mantêm cadastrados meninos e meninas que
aguardam a oportunidade. Os números revelam, no mínimo, uma desconexão entre as
necessidades das famílias e as prioridades de seus representantes, além de um
desmerecimento institucionalizado dos benefícios atrelados ao acesso ampliado à
educação infantil.
Há de se ressaltar que a educação infantil é
competência prioritária dos municípios e, apesar de, no país, a frequência em
creche não ser obrigatória, é dever do Poder Público ofertar vagas às famílias
que apresentam essa demanda, conforme estabelecido pela Constituição Federal de
1988 e ratificado, em 2022, pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Porém, quando
questionados sobre o não planejamento para a expansão de vagas, 11% dos
municípios alegam não saber elaborar um plano e 3% dizem não ter tempo hábil para
isso. Ou se tratam de argumentos infundados ou de justificativas que revelam um
despreparo técnico crítico na condução de uma área estratégica da gestão
pública.
Além da quantidade, espera-se equidade nos
serviços de educação infantil. Para o Gaepe-Brasil, é necessário um plano de
expansão de vagas de creche para atender toda a demanda existente no país, mas
havendo lista de espera, deve-se considerar as desigualdades sociais. Os
municípios parecem estar em uma situação menos pior nesse quesito. Dos que
adotam critérios para priorização de matrícula (44%), 64% têm como principal
aspecto a situação de risco e vulnerabilidade das crianças sem vaga.
Porém, apenas 23% consideram como prioridade
o fato de a criança ter mãe solo ou adolescente. É sabido que a presença de
meninos e meninas nas creches é essencial para a inserção da mulher no mercado
de trabalho de forma promissora. Também é solução para uma realidade comum nos
lares carentes do país: crianças cuidando de outras crianças. Além de
conflitante com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a prática acaba
por ampliar a crise educacional brasileira, já que a criança mais velha, e
também a mãe adolescente, tende a ter seu desempenho escolar comprometido por
assumir responsabilidades de adultos.
Uma das frentes do governo federal para amenizar o problema está inserida no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que prevê a construção de 2,5 mil creches até 2026, sendo o primeiro edital, com 1.178 unidades, contemplando áreas de vulnerabilidade social. Há ainda a promessa de concluir obras paralisadas por meio do Pacto Nacional pela Retomada de Obras da Educação Básica. A solução deve passar também pela ruptura de um legado de não compreensão da criança como um ser social de direito — desafio a longo prazo, envolvendo múltiplos atores, incluindo professores — e pela escolha de gestores municipais comprometidos, de fato, com a educação infantil.
Um comentário:
Essa matéria do jornalista da folha de São Paulo está interessante, ele o tempo todo Sugere a justiça eleitoral para caçar a chapa do Pablo Marçal porque ele é uma pessoa má para ser candidato , e no final diz que na democracia quem decide quem vai governar é o eleitor ou seja parece um tucano e não petista Porque no final desdisse todo o conteúdo anterior do texto que defendia a censura e o cancelamento da candidatura do Marçal
Mas em resumo da ópera, no andar da carruagem o Marçal vai ser eleito no primeiro turno
Postar um comentário