O Globo
Acordo proposto pelo STF dá ao presidente
chance de resgatar iniciativa no Congresso
Caso seja bem-sucedido, o acordo para o novo
rito na destinação e no pagamento das emendas parlamentares significará uma
retomada, por parte do governo, da iniciativa na relação com o Congresso,
depois de um ano e meio de profunda dependência em relação ao comando de suas
duas Casas.
O timing da decisão do Supremo Tribunal
Federal (STF) forçando a revisão das regras e dos valores das emendas autoriza
a leitura de que a Corte atuou em socorro do Executivo nessa questão, como já
havia feito anteriormente com a reoneração da folha de pagamento de 17 setores
da economia. Apontei esse novo padrão neste espaço na última sexta-feira.
O presidente da Câmara, Arthur Lira, não teve
papas na língua ao se queixar de um placar de “2 a 1” na relação entre os
Poderes durante almoço realizado nesta terça-feira para tratar do assunto.
Ficou um climão, e esse mal-estar não deverá se dissipar tão fácil nas
pedregosas negociações que começam agora para definir o novo regramento das
emendas parlamentares, esse combustível de que deputados e senadores são cada
vez mais dependentes.
A decisão iniciada por Flávio Dino e referendada por unanimidade fala por si só e enfraquece o jus sperniandi dos congressistas — tanto que Rodrigo Pacheco já vestiu o figurino do apaziguador ao assumir o discurso da negociação.
Para Lula, foram atendidos dois desejos
antigos, da campanha eleitoral, que ele não conseguiria implementar no voto nos
plenários da Câmara e do Senado: colocar um teto no crescimento do volume das
emendas e criar canais para que ao menos parte delas seja destinada a “projetos
estruturantes”— leia-se o velho e eleitoreiro PAC, marca que anda à procura de
recursos, cada vez mais escassos dado o aperto no Orçamento.
Isso tudo às vésperas da sucessão do comando
da Câmara e do Senado, que, segundo aliados do presidente, pode mudar o desenho
da disputa. Lula já disse a diversos interlocutores que não cometerá o erro de
Dilma Rousseff de tentar disputar votos no plenário para fazer seus candidatos
em nenhuma das Casas.
Mas, sem as emendas rodando a pleno vapor, o
Planalto avalia que a correlação de forças entre os principais postulantes
muda, tirando de Lira e de seu congênere no Senado, o ex e provável futuro
presidente Davi Alcolumbre, o poder absoluto de definir não só a troca de
comando nas Casas, mas, sobretudo, a agenda dos dois últimos anos de gestão do
petista.
Lula vai, assim, construindo o cenário para a
reta final de seu terceiro mandato, retomando alguns instrumentos de cuja falta
se ressentiu muito no primeiro biênio. Além da governabilidade tolhida pelo
peso que as emendas adquiriram na gestão do Orçamento, ele nunca deixou de
protestar por ter à frente do Banco Central alguém designado por Jair
Bolsonaro. Com o mandato de Roberto Campos Neto se aproximando do final, espera
indicar seu sucessor antes do prazo-limite, dando, assim, tempo para que o nome
seja assimilado no Senado.
O risco é juntar a indicação com a negociação
das emendas e a sucessão nas Mesas. Caso o acordo para destinação dos recursos
aos parlamentares não seja bem conduzido, o indicado para o BC poderá parar na
fogueira das retaliações até aqui mais ensaiadas que colocadas em prática.
Tudo leva a crer que o maestro da negociação,
da parte do governo, será o titular da Casa Civil, Rui Costa. Ele tentou
acalmar Lira no tenso almoço de ontem, assegurando que as coisas se acertariam.
Acontece que ele está no centro das queixas dos parlamentares, como aquele que
seria artífice da entrada do STF em campo para formar o tal “2 a 1”.
Até aqui, o placar parece favorável para que
Lula tenha dois anos de maior controle sobre a governabilidade, mas qualquer
erro nessa articulação pode levar a maionese a desandar.
Um comentário:
Pois é.
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