Valor Econômico
É hora de Lula ouvir as vozes certas, e agir com serenidade e sabedoria para acertar mais uma vez
No almoço anual da Febraban, no dia 29 de
novembro, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, detalhou o pacote fiscal,
tentou desfazer o mal estar com o anúncio atabalhoado da isenção do Imposto de
Renda (IR) de quem ganha até R$ 5 mil, relembrou as despesas bilionárias
herdadas dos outros governos, e saiu-se bem na empreitada.
No fim, perguntou se estavam todos convencidos de seus argumentos, e ouviu que sim, estavam. A dúvida era se ele era capaz de convencer o presidente Luiz Inácio Lula da Silva de tudo aquilo. Ao que Haddad respondeu: “O presidente tem o seu tempo de convencimento”.
Quase um mês depois, com o dólar nas alturas
e os agentes econômicos ainda atordoados com a perspectiva de ampliação da
isenção do IR, o tempo de convencimento de Lula contrasta com o do mercado, o
qual, por sua vez, está convencido da falta de compromisso do governo com o
equilíbrio das contas públicas.
Contudo, há tempo, ainda, para o governo
demonstrar o contrário e reconquistar a credibilidade junto aos agentes
econômicos. Mas para isso, segundo fontes do mercado, líderes governistas e do
Centrão ouvidos pela coluna nos últimos dias, alguns passos precisam ser
seguidos.
Primeiro de tudo, espera-se que Haddad tenha
convencido Lula a fazer uma declaração em tom conciliador, reiterando o seu
compromisso com o corte de gastos e a responsabilidade fiscal. Uma fala
presidencial nesse sentido é aguardada na abertura da reunião ministerial desta
sexta-feira, que costuma ser transmitida pela TV pública e redes sociais do
governo.
Essa eventual declaração, na avaliação de
fontes do mercado e do Congresso, teria potencial para neutralizar fala
anterior do presidente, na entrevista ao “Fantástico” no domingo (15), quando
Lula declarou que o único problema do país eram os juros altos. Aquela
manifestação recaiu como uma bomba no mercado, passando a mensagem de uma
postura negacionista do presidente em relação ao problema fiscal.
O ideal para melhorar o ambiente político e
econômico, segundo fontes ouvidas pela coluna, seria que Lula suspendesse as
declarações sobre juros, e delegasse a missão ao vice-presidente Geraldo
Alckmin. A percepção geral é de que bons eram os tempos em que cabia somente ao
vice-presidente José Alencar (morto em 2011) protestar contra a taxa Selic
alta, e Lula não se indispunha com o Banco Central, comandado por Henrique
Meirelles nos seus mandatos anteriores.
Simultaneamente, é urgente concluir a votação
das medidas de contenção de gastos, ainda que desidratadas pelo Congresso. É
alta a expectativa de que o Senado analisará as três propostas, mesmo se for
necessário votar a lei orçamentária de 2025 no sábado.
Somente o desfecho da votação do pacote na
Câmara dos Deputados, associado à injeção recorde de dólares no mercado pelo
Banco Central, na quinta-feira, já permitiu ao governo colocar o nariz para
fora d’água e respirar, com a moeda americana fechando em R$ 6,12.
Outra avaliação é de que esse governo tem
autoridades demais falando sobre economia, de modo que a sobreposição de vozes
gera ruído e confusão. “Somente o ministro da Fazenda deveria falar sobre
economia e a política fiscal”, disse uma fonte com trânsito no mercado. “E os
diretores do Banco Central deveriam falar, exclusivamente, pelas atas do Copom
[Comitê de Política Monetária]”, acrescentou.
Outro problema é que se cristalizou junto ao
mercado e no mundo político a imagem de que o governo Lula 3 é frágil, não
coeso, não tem coordenação, não tem plano de voo, os ministros batem cabeça
entre si e disseminam intrigas uns contra os outros. Num exemplo recente, com o
nome circulando em provável reforma ministerial, o ministro da
Secretaria-Geral, Márcio Macedo, disparou que achava que não tinha “inimigos”,
e agora descobriu que “tem um monte”.
Na classe política e entre agentes
econômicos, o sentimento é de que Fernando Haddad “prega no deserto” em relação
ao ajuste fiscal e ao esforço para organizar as contas públicas, enquanto é
sabotado pelos colegas da “ala política” do governo.
Um líder do Centrão, com bom trânsito no
Palácio do Planalto, disse à coluna que um dos gargalos é o excesso de
interlocutores do governo. “Primeiro, você não sabe com quem falar, e depois,
ouve uma coisa de um, e outra coisa de outro”, reclamou.
Para esse líder, Lula errou ao fragmentar a
articulação política meses atrás, ao ceder à pressão do presidente da Câmara,
Arthur Lira (PP-AL), quando o alagoano se desentendeu com o ministro da
Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha. Em vez de tentar
apaziguar os ânimos, Lula designou o chefe da Casa Civil, Rui Costa, para ser o
interlocutor político de Lira.
Uma dessas fontes ressaltou que o governo
precisa sair das cordas - a crise de confiança fiscal -, porque, fora dela, há
dados solares da economia: PIB crescendo mais de 3%, menor desemprego em anos,
renda média do trabalhador mais alta, e inflação passível de ser domada.
Há 50 anos, Muhammad Ali jogar-se nas cordas
para dar socos e golpes contra George Foreman foi a estratégia acertada para
sair das mesmas com o título de campeão do mundo. Lula gaba-se dos bons
resultados da economia em seus mandatos anteriores. Pois é hora de ouvir as
vozes certas, e agir com serenidade e sabedoria para acertar mais uma vez.
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