sexta-feira, 20 de dezembro de 2024

Crise de confiança e efeitos políticos - Celso Ming

O Estado de S. Paulo

Desde que aprovado no Congresso, o pacote fiscal escancara suas insuficiências. O cobertor ficou curto para cobrir o rombo aberto pelas despesas. A expectativa, agora, é de que venham certos remendos para que as contas públicas não fiquem em parte desagasalhadas.

Mas um bom pedaço da incerteza continua. Atrás dela segue a falta de confiança na política econômica tocada pelo ministro Fernando Haddad, notoriamente desautorizado pelo presidente Lula por ocasião da divulgação do pacote.

Em entrevista na última quinta-feira, durante a apresentação do Relatório Trimestral de Inflação, o futuro presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, fez questão de dizer que o presidente Lula concorda com a sua interpretação sobre o que se passa com a inflação e com a economia, tal como manifestada – entendase – nos documentos do Banco Central. Mais recentemente afirmou também não acreditar em que a moeda brasileira seja alvo de ataque especulativo.

No entanto, a postura de Lula publicamente é outra. Como declarou no Fantástico do último domingo, para ele, o Banco Central é irresponsável, por definir juros em patamares elevados, acima de 12% ao ano (em março chegarão a 14,25%). Por aí se vê que, ou Lula não concorda com Galípolo, ou faz um jogo com Galípolo e outro com a plateia.

A falta de confiança na política econômica não se manifesta apenas com a esticada do dólar para acima dos R$ 6 e com os juros futuros medidos pelo DI mais 7% ao ano. Também é corroborada pelo estancamento dos investimentos, pelo afastamento das aplicações estrangeiras no País e, sobretudo, pelo aumento do índice de risco Brasil.

Esse índice é medido pelo Credit Default Swap (CDS-5), que é o que o mercado externo está cobrando de adicional sobre os juros dos títulos do Tesouro dos Estados Unidos para ficar com títulos de dívida do Brasil. O CDS-5 subiu 33% em dezembro e 65% ao longo de 2024.

É um sinal de desconfiança e de percepção de aumento de risco de calote. Nessas condições, nem pensar em grau de investimento para os títulos do Brasil, que o governo brasileiro afirma estar perseguindo.

Como já avaliado por esta Coluna em edições anteriores, esse quadro não se estanca na área econômica, ele tende a se expandir para a área política.

Insegurança, dólar e juros lá em cima, recessão, inflação e tudo o que vem junto, tendem a cobrar alto preço político e eleitoral. Não está claro como o presidente Lula pretenderia reagir a uma persistente deterioração do quadro político.

De tudo o que se conhece do presidente, a tendência é de que persista com uma política de gastança acompanhada de distribuição de bondades destinada a azeitar a boa vontade do eleitor. Se for por aí, os fundamentos da economia continuarão afundando. Se, ao contrário, Lula entender que precisa conduzir a economia com rédea curta, tenderá a se beneficiar. A conferir.

 

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