Valor Econômico
Alta maior que a esperada da Selic, como costuma acontecer nessas circunstâncias, gerou muita volatilidade
A alta da taxa Selic em três pontos
percentuais até março, para 14,25% ao ano, foi um minichoque de juros e pegou
os participantes do mercado de surpresa. Mas, apesar do aperto forte, ainda há
muito ceticismo. Alguns atribuem a decisão ao presidente que sai do Banco
Central, Roberto Campos Neto, e não ao que entra em janeiro, Gabriel Galípolo.
A ata da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC, que sai amanhã, e o fim do período de silêncio do colegiado devem começar a desfazer essa impressão. Podem mostrar que o colegiado votou unanimemente pela alta mais forte de juros na reunião da semana passada, de 11,25% ao ano para 12,25% ao ano, e pela sinalização feita para subir um ponto percentual nos encontros de janeiro e março.
O fato é que o mercado não esperava que o
Copom, em especial Galípolo, fosse embarcar numa estratégia tão conservadora
para levar a inflação, que está em 4,87% nos 12 meses até novembro, para 3% até
meados de 2026. Isso se refletia tanto nas projeções de inflação dos analistas
econômicos do setor privado quanto na precificação na curva de juros futuros.
Os analistas previam um ritmo de alta de 0,75
percentual por reunião, que levaria a Selic a um pico de 13,75% ao ano. Não
demoraria, na visão deles, e o BC cortaria os juros, para 13,5% em 2025 e a 11%
em 2026. Qualquer simulação que replica o modelo de projeção do Banco Central
mostra que a dose de juro seria insuficiente para cumprir as metas. É
compreensível que eles tenham piorado ainda mais as expectativas de inflação.
Já a curva de juros do mercado financeiro
precificava chances majoritárias de altas da Selic de um ponto percentual em
dezembro e em janeiro. Mas antevia um esmorecimento do esforço de combate à
inflação a partir de então. Os juros de longo prazo estão muito altos, assim
como as inflações implícitas, na casa dos 6,5%. Juntos, esses preços passam o
recado de que o Copom deixará a tarefa pela metade.
O mercado financeiro se surpreendeu com o
Copom, em parte, porque a sinalização de seus membros, antes da última reunião,
era de que o comitê agiria com moderação. “O Banco Central, obviamente, não
está aqui para gerar mais volatilidade”, disse Galípolo, na sua última fala
pública antes da reunião do Copom.
A decisão fora do previsto, como costuma
acontecer nessas circunstâncias, gerou muita volatilidade. A explicação mais
plausível é que investidores estrangeiros estavam posicionados para um cenário
em que o juro não subiria tanto. Eles liquidaram investimentos no Brasil para
não estragar o resultado no fim do ano. Os movimentos terminaram mais agudos
porque a política fiscal e as eleições presidenciais de 2026 também estão
mexendo com os mercados.
Mais seria exagero colocar a culpa da
surpresa apenas no BC. Apesar do tom cauteloso, os membros do Copom estavam
indicando que iriam fazer o que fosse necessário para colocar a inflação na
meta. Muitos participantes do mercado duvidavam que, de fato, fosse.
Para alguns, existe o risco de dominância
fiscal, que em tese deveria fazer o BC andar com mais cautela. O minichoque de
juros colocou essa tese a prova. As inflações implícitas apresentaram queda
substancial no dia seguinte à decisão do comitê.
Outros achavam que Galípolo teria um mandato
parcial para fazer seu trabalho - isto é, poderia subir o juro, mas não muito.
O Copom subiu os juros, e muito, para uma decisão tomada num dia só. Isso não
foi suficiente. No dia seguinte, afirmava-se, nas mesas de operação do mercado,
que a decisão foi um último legado de Campos Neto, que traçou o roteiro para
Galípolo.
A jornada de comunicação do Copom continuará
na quinta-feira com a entrevista coletiva do Relatório de Inflação e, lado a
lado, ambos podem explicar que a decisão foi unânime e que há envolvimento de
Galípolo na formulação da estratégia conservadora e compromisso com a sua
execução.
Galípolo surpreendeu o mercado com um
minichoque de juros para ganhar a reputação? Ele próprio e o diretor de
política econômica do BC, Diogo Guillen, disseram que não acreditam em atalhos.
Segundo eles, a credibilidade se conquista com a consistência ao longo do
tempo.
De fato, a decisão da semana passada se
encaixa na forma como se opera o regime de metas de inflação. O diagnóstico do
Copom é que os riscos se materializaram e o cenário inflacionário piorou,
embora tenha ficado menos incerto. Quando o BC conhece o tamanho do problema,
pode fazer a dosimetria e prescrever o remédio. Em outubro, o diretor de
assuntos internacionais do BC, Paulo Pichetti, disse que o Copom iria agir
assim em cada reunião. O tamanho do minichoque de juros está dimensionado, pelo
menos até março. Foi, portanto, na medida seguir o caminho da Selic aos níveis
compatíveis com o cumprimento da meta.
Isso resolve o problema? O Banco Central
disse o que fará até março, mas não o que ocorre depois. Portanto, as portas
estão abertas. O caminho não será fácil e exigirá consistência de Galípolo.
Todos os que sentaram na cadeira de comando do BC passaram por uma longa
provação. O mercado sempre duvida que o juro alto fará seu trabalho - ainda
mais com todos os receios sobre dominância fiscal -, até saírem dados realmente
negativos de atividade.
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