O Estado de S. Paulo
Os conspiradores de 2022 viram oportunidade onde não havia e calcularam mal o risco de punição
A prisão preventiva do general Braga Netto é uma demonstração de que a PF, a PGR e o STF não estão dispostos a pegar leve com quem possivelmente conspirou contra a ordem democrática. Caberá à Justiça concluir se ele e outros indiciados pela tentativa de golpe, inclusive Jair Bolsonaro, são culpados. A historiadores e cientistas políticos, porém, já é permitido se perguntar por que um grupo de militares, 36 anos depois da redemocratização, se sentiu no direito – ou mesmo no dever – de arquitetar um golpe e o que os fez acreditar que poderiam ser bem-sucedidos.
O estudo das centenas de golpes de Estado,
fracassados ou não, ocorridos nos últimos 100 anos no mundo permite identificar
um padrão na disposição de militares de romper com a ordem estabelecida. Os
cientistas políticos Malcom Easton e Randolph Siverson, da Universidade da
Califórnia, resumiram esse padrão na seguinte frase: “Os golpistas tipicamente
pensam em dar um golpe após avaliar sua satisfação com o status quo e a sua
oportunidade de ter sucesso.” Os riscos são altos. As consequências para os golpistas
costumam ser duríssimas, indo de prisões a execuções. O Brasil, com seu
histórico de anistias e perdões para militares, é um caso à parte. Isso pode
ter levado os conspiradores de 2022 a avaliar que o risco de serem punidos era
relativamente baixo.
Os militares que, segundo a PF, planejaram um
golpe estavam insatisfeitos com o status quo? Também aqui o caso brasileiro se
revela uma exceção. Os militares certamente estavam satisfeitos com o novo
status quo que Bolsonaro lhes havia presenteado, distribuindo a eles milhares
de cargos na administração federal, incluindo um bom naco do poder político.
Mas não estavam completamente satisfeitos em lidar com um Legislativo
empoderado e com um Judiciário combativo. E, acima de tudo, não gostavam da
perspectiva de perder influência e poder sob Lula.
Se tivessem estudado os exemplos de outros
países, porém, saberiam que o fator determinante para uma tomada de poder
bem-sucedida é a existência de um contexto de instabilidade política e de um
líder com legitimidade abalada. Não era o caso em 2022.
Havia um clima de polarização, mas não uma
situação de instabilidade. Lula havia sido eleito com a maioria dos votos. À
parte uma minoria que acreditava em uma fraude eleitoral, não havia na
sociedade brasileira uma impressão generalizada de que lhe faltava legitimidade
para assumir. Os conspiradores de 2022 viram oportunidade onde não havia e
calcularam mal o risco de punição.
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