sábado, 20 de setembro de 2025

Defesa por corte de gastos vira cortina de fumaça no Congresso. Por Idiana Tomazelli

Folha de S. Paulo

Emendas, blindagem de políticos e perdão a condenados por atos golpistas mobilizam parlamentares

No início de junho, em meio à crise do IOF, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), disse que o governo Lula (PT) precisava fazer o dever de casa e cortar gastos. O mantra já havia sido ecoado por parlamentares no fim de 2024, quando o ministro Fernando Haddad apresentou um pacote para conter despesas.

Assim como naquela época o plano de ajuste foi desidratado, o Congresso agora dá mais uma prova de que a pauta de corte de gastos tem servido apenas de cortina de fumaça para as negociações que realmente mobilizam os parlamentares: emendasblindagem de políticos contra investigações e perdão total ou parcial aos condenados por atos golpistas.

A MP 1303, que trata do aumento de impostos, também propõe regras mais duras para conceder benefícios como auxílio-doença e seguro-defeso, cuja trajetória explosiva nos últimos meses trouxe aperto ao Orçamento. A menos de um mês do fim do prazo da MP, os mesmos atores que cobravam corte de gastos estão silentes sobre a aprovação dessas mudanças.

Em outra contradição, enquanto a cúpula da Câmara defende uma reforma administrativa que ataque os supersalários, a mesma Casa aprovou a urgência de um projeto que cria um penduricalho para servidores do TCU, abrindo caminho para valores extrateto.

Não há dúvida de que o país precisa discutir o volume e a qualidade dos gastos públicos. Nos últimos tempos, porém, os congressistas recorrem a essa carta —que tem apelo no mercado financeiro— quando querem um discurso fácil para contrapor a agenda de alta de impostos do governo sem pretensão real de enfrentar o problema. A proximidade das eleições só inflama essa postura.

Os parlamentares e a sociedade podem discordar das medidas colocadas à mesa, mas precisam ao menos entender a necessidade de debatê-las a sério. Em 2027, o país tem um novo encontro marcado com os velhos problemas fiscais. Não vai dar para continuar varrendo tudo para debaixo do tapete.

 

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