Veja
O ideal seria ter os países unidos em nome da
humanidade
Em recente entrevista, o líder indígena, ambientalista e filósofo Ailton Krenak foi direto ao ponto, ao descrever seus temores em relação à COP30, marcada para novembro em Belém: “A sociedade fora, os povos originários fora, a Amazônia fora, e o mercado dentro”. O acadêmico da ABL alertou para o risco de desperdiçarmos uma grande oportunidade. O evento, realizado com a coordenação do embaixador André Corrêa do Lago, diplomata experiente, confiável e de visão humanista, pode culminar em desesperança, sem reais caminhos para barrar a marcha rumo à catástrofe ecológica.
Há um problema que se sobrepõe a todos os
outros: as autoridades de cada país zelam, sobretudo, por suas fronteiras e
pelas soluções a curto prazo. Há disputa entre posições de dirigentes nacionais
e muito pouco de um olhar para o futuro da humanidade. Não pensam, enfim, em
cada país como pedaço do mundo. O egoísmo, ainda que embebido de ideias
louváveis, é norma.
“Um caminho é substituir a ampliação do
consumo pela ampliação do bem-estar”
A COP30 repetirá o
erro das 29 edições anteriores se for um encontro de nações em busca de
compensações financeiras para suas transições energéticas, e ponto. É preciso
reorientar, a médio prazo, a marcha da civilização na lida com o crescimento da
produção e do consumo. É preciso ensinar as crianças, hoje, a serem adultos
mais atentos. A transição para o equilíbrio ecológico e o desenvolvimento
sustentável não está, enfim, apenas na mudança das fontes de energia. O
segredo, se é que existe, está na educação infantil para formar uma mentalidade
com novos objetivos de progresso da humanidade. A COP30 pressupõe, portanto, de
modo a não fracassar, aquilo que as anteriores não fizeram: pôr o tema
educacional no centro das conversas e decisões. Trata-se de estabelecer um
compromisso mundial para oferecer escola de qualidade aos 2 bilhões de
crianças em idade escolar, seja no modelo tradicional, seja utilizando as novas
ferramentas da internet e da inteligência artificial. Trata-se de promover
conteúdo que forme nova consciência, baseada em um pacote seminal de
princípios: reconhecer que todas as economias e populações estão interligadas e
compartilham um destino comum, ameaçado pela crise ambiental e pelo abismo da
desigualdade; formular uma nova geografia, em que os países estejam
entrelaçados; promover um sentimento de solidariedade e respeito entre os seres
humanos — e destes com a natureza, que os sustenta e enriquece.
O modo mais sério, e talvez o mais rápido, de
chegar a esse ponto é alinhar-se com a visão de Krenak, do diálogo permanente
com a Terra. A resposta adequada é adotar um propósito que substitua a ampliação
do consumo pela ampliação do bem-estar, da liberdade, do deslumbramento
estético e da sustentabilidade no longo prazo.
Dificilmente os dirigentes nacionais reunidos
na COP30 aceitarão essa pauta planetária e de longo prazo para a promoção da
educação. Mais uma vez, a pauta deverá se concentrar em quantos dólares serão
canalizados para cobrir as perdas, e não em quanto seria necessário para
financiar a educação que — ela, sim — pudesse promover a transição da
consciência das novas gerações em direção a novas diretrizes civilizatórias. É
quimera aparentemente impossível — mas nada impede o sonho possível, o desejo
de um mundo genuinamente melhor.
Publicado em VEJA de 19 de setembro de
2025, edição nº
2962
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