O Estado de S. Paulo
No próximo ano, a maioria dos eleitores fará escolhas. Sem entusiasmo. Há um mal-estar que gera tédio e cansaço. Justifica o não-voto, alimenta a indiferença
2025 termina. Houve de tudo nele: tensões
entre os Poderes, crime organizado, queda de energia em São Paulo, bloqueio e
desbloqueio de Donald Trump, protagonismo do Supremo Tribunal Federal (STF),
déficit fiscal, insegurança pública, condenação e prisão de oficiais militares,
um ex-presidente na cadeia.
O que nos reservará 2026, um ano de eleições? Tudo indica que a batalha será campal. Inimigos dispostos a esmagar o que houver pela frente. Não por ideias ou projetos, mas por poder e posições. Batalha concentrada no Executivo, sem valorizar o Legislativo. No fim dela, quem serão os derrotados?
Pelas sendas da centro-direita, a confusão é
um sem-fim. Parte dela ainda orbita o bolsonarismo, ora aceitando a liderança
do ex-presidente, ora buscando uma alternativa light, ora simplesmente sem
saber o que fazer. Outra parte corteja Lula. Democratas mais coerentes não
aparecem, escondidos em cavernas de localização desconhecida. O binarismo reincidente
domina o cenário, bloqueando outras opções eleitorais competitivas.
Não é só a polarização, parte do jogo. A
classe política anda de costas para os problemas do País. Não gera discussão,
ao contrário, i mpede que ela avance. O Congresso é indispensável, mas sua
atual composição é ruim – donde ser tão importante o processo eleitoral dar
impulso à escolha de bons parlamentares.
A política tem transcorrido sem atores
capacitados para distribuir com inteligência as cartas do jogo. Ela se reproduz
em meio à névoa que recobre a sociedade. As manifestações de 2013 lançaram um
repto antipolítica que germinou nos anos seguintes, abrindo espaços para a
intromissão judicial, as narrativas apocalípticas, a demagogia, a extrema
direita, o esvaziamento dos partidos. A antipolítica empobreceu a representação
política. O bolsonarismo decolou ali.
O binarismo é paralisante porque só beneficia
os polos que o compõem. A agitação de um deles reforça o outro. Nenhum dos dois
mostra trunfos substantivos. A opção é esgrimir armas o tempo todo.
Na área do PT, Lula é soberano. Todas as alas
partidárias endossam seu quarto mandato. O discurso está pronto: somos a força
que pode derrotar a extrema direita, com suas excrescências. Ressoa a ideia de
que política é paixão, necessita de adversários enfaticamente definidos.
Parafraseando Carl Schmitt: os “amigos” devem combater todo “inimigo público”
direcionado para destruir as bases existenciais do Estado. Pouco importa se o
inimigo é apresentado sem precisão ou se o lado do “bem” capricha nos adjetivos
sem ter um programa concatenado para consertar o País. O que importa é que o
drama encante as massas, e para isso programas não fazem diferença.
Lula está no ringue como um muro de
contenção, uma barreira que os agentes do “mal” não ultrapassarão. Olha para
trás. Fala para a direita, com o propósito de impedir que perfurem o muro, e
insufla as massas para que lhe forneçam tijolos com os quais sustentar o muro.
Aceita a parolagem antidemocrática de que “o Congresso é inimigo do povo”, mas
corteja os parlamentares com prebendas e espaços de poder.
Lula se movimenta como se já tivesse vencido
as eleições. O mar em que navega, porém, está longe de ser calmo.
A pesquisa Quaest de dezembro mostrou que
Bolsonaro continua a lhe fazer alguma sombra. Mesmo estando preso, o
ex-presidente permanece ativo. Cria fatos, indica o filho como seu “candidato
natural”, excita seguidores e parcelas da direita.
É um sinal de alerta, que deixa viva a luta
contra o dragão da maldade. Indica, também, que a população está confusa, sem
condições de se posicionar de modo racional. 25% dos pesquisados pela Quaest
são indecisos ou anularão o voto. Outros tantos são pessoas que gostariam de
votar em candidatos equidistantes dos polos binários. Os índices de rejeição são
generalizados.
Muitos continuam a ver Bolsonaro como um
salvador, alguém que resgatará um passado sem comunistas e sem vendilhões do
templo. São pessoas que vivem no conforto de uma fé estranha a todas as
liturgias. Estão presas a Bolsonaro tanto quanto ele a elas, sem conseguir
avançar.
Lula poderia ter feito de outro modo. Chamado
os democratas (de centro, liberais, republicanos, socialistas) para governar
com ele. Não por cargos, mas para construir uma unidade assentada em consensos
programáticos. Preferiu manter o roteiro de sempre: um governo sem programa,
controlado pelo PT e composto com as rebarbas das bancadas congressuais.
Calcinou o terreno, sem possibilitar o surgimento de novas lideranças que
pudessem substituí-lo e alargar o campo.
Em 2026, a maioria dos eleitores brasileiros
fará escolhas. Sem entusiasmo. Há um malestar que gera tédio e cansaço.
Justifica o não-voto, alimenta a indiferença e o medo de que as coisas virem um
pandemônio. É como se dissessem: não estou confiante, não sei bem por que
votarei, mas é o que temos para hoje.
Que 2026 nos reserve uma nova chance de
entendermos como foi que ficamos assim. Erguendo alto os brindes de um feliz
ano novo para todos. •

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