terça-feira, 8 de julho de 2008

DEU NA FOLHA DE S. PAULO


ACIMA DO RUÍDO DO MUNDO
Clóvis Rossi

HOKKAIDO - Em 1999, manifestantes tomaram as ruas de Seattle, durante a conferência ministerial da Organização Mundial do Comércio, e conseguiram impedir o discurso inaugural da secretária de Estado, Madeleine Albright, em evento talvez inédito na história americana.

A partir daí, os governantes poderiam ter passado a ouvir os manifestantes, mesmo os radicais, que, afinal, é uma palavra que indica apenas que vão ou pretendem ir à raiz dos problemas, ainda que tenha tomado conotação de fundamentalismo irracional (às vezes, até é, mas há outros fundamentalismos que são tolerados).

Em vez disso, os líderes (da época como os de agora) preferiram fugir. Foi por isso que Gleneagles (Escócia) e Kananaskis (Canadá) entraram para o mapa noticioso, ao abrigarem cúpulas do G8. Localidades remotas em que os governantes se refugiam, como agora em Toyako, no alto do Monte Poromoi e seus 620 metros, na ilha de Hokkaido, a mais ao norte do Japão.

Ficam assim livres dos manifestantes. Mas ficam também privados dos ruídos do mundo abaixo deles. Talvez por isso, na cúpula anterior, à beira do mar Báltico, na Alemanha, tenham se auto-congratulado pelo bom estado da economia mundial.

Não enxergaram que logo viria o que a agência chinesa de notícias Xinhua chama engenhosamente de crise dos três "efes" (food prices, fuel prices e financial turmoil, ou preços da comida e do petróleo e turbulência financeira).

Talvez não conseguissem enxergar de qualquer maneira porque o mundo tornou-se complexo demais, rápido demais nas suas viradas. Mas líderes são fabricados exatamente para enxergar no meio da bruma, para antecipar pelo menos tendências gerais.

Enfim, para colar o ouvido ao chão e detectar o tropel dos cavalos chegando, como os velhos comanches. Eram eles os primitivos?

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