ELEIÇÃO E CIVILIZAÇÃO
Clóvis Rossi
Clóvis Rossi
SÃO PAULO - Sempre acreditei que o exercício continuado da democracia teria um efeito pedagógico tão formidável que, ao cabo de um dado tempo e de algumas ou muitas eleições, o Brasil se tornaria um país civilizado.
Continuo acreditando na democracia, mas sou obrigado a admitir que é preciso fé, muita fé.
Jamais poderia imaginar, por exemplo, que as duas maiores e mais ricas cidades do país (São Paulo e Rio de Janeiro) passariam, nas eleições de 2008, as sétimas consecutivas para as capitais, desde que recuperaram, em 1985, o direito de votar para prefeito, por situações que a sabedoria convencional (ou o preconceito convencional) diz serem mais próprias dos grotões (escolha você o grotão que mais lhe apeteça).
Numa cidade, o Rio, fala-se em chamar forças federais para evitar interferências indevidas.
Força federal era algo que só mesmo os rincões perdidos demandavam antigamente. Pode ser até que não seja necessário recorrer a elas. Mas o simples fato de que a hipótese surgiu sem causar o menor escândalo já é desanimador e revelador.
Revela pura e simplesmente que a democracia recuou, em vez de avançar, justamente na cidade que foi durante séculos a grande câmara de eco da pátria.
Em São Paulo, o prefeito Gilberto Kassab dá-se ao desplante de ensaiar "ações", para usar sua própria "novilíngua", destinadas obviamente a evitar que o retrato de suas chances na pesquisa Datafolha fosse feio ou mais feio do que já é. Claro que o prefeito nega. Faz parte do show dos políticos, de todos os partidos, negar mesmo as evidências mais escandalosas.
Nem prefeitos dos grotões recorrem, hoje, a esse tipo de trambique primário. O fato de que o prefeito de São Paulo o faça conta história parecida à do Rio: eleições sucessivas ainda não civilizaram a parte do Brasil que se julga, erroneamente, a mais civilizada.
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