sexta-feira, 29 de agosto de 2008

A reforma política da Dilma


Villas-Bôas Corrêa
DEU NO JORNAL DO BRASIL


A suspeição é inevitável: quando o governo preguiçoso deixa para os dois últimos anos e quebrados do segundo mandato – com a candidatura da ministra Chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff assumida em declarações explícitas do presidente Lula – para encaminhar ao Congresso o primeiro pacote de proposta de reforma política é de uma evidência cristalina que está ajeitando as coisas para facilitar a eleição da sucessora favorita.

O projeto reformista que o governo chocou durante quase seis anos de profundas meditações e entre dúvidas de tirar o sono é radical e novidadeiro. E, ao mesmo tempo, uma tentativa de buscar o consenso em torno de obviedades.

Levada ao presidente da Câmara, deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) pelos ministros Tarso Genro, da Justiça, e José Múcio Monteiro, das Relações Institucionais, sofreu o primeiro contratempo com a advertência do escaldado político paulista de que a aprovação das propostas neste final de ano, com a campanha eleitoral para a eleição de prefeitos e vereadores esvaziando o Congresso, é praticamente impossível. E, se o governo quer mesmo corrigir alguns dos muitos defeitos de uma legislação deformada por remendos do oportunismo terá que se dedicar em tempo integral à articulação da sua dispersa maioria e consertar as muitas rupturas deixadas pela luta eleitoral.

Para o presidente da Casa, as prioridades consensuais que dificultam a tramitação da reforma proposta pelo governo são a reforma tributária, a mudança radical na tramitação das medidas provisórias que trancam pauta para a votação nos três dias úteis da semana parlamentar e o fundo soberano.

Mas, reconheça-se que o governo chegou pisando macio. Na verdade, não está propondo um pacote fechado de reforma política, mas um embrulho com os presentes em saquinhos. E como não há segredo a preservar, os emissários deram o serviço completo. A proposta inclui, em projetos separados, um para cada tema, o voto em lista fechada que seduz as lideranças e parlamentares de prestígio, com vaga cativa na cabeça da relação de candidatos, garantia da reeleição para mais quatro anos de fruição de um dos melhores empregos do mundo.

Só esta proposta tem potencial explosivo para rachar a maioria parlamentar. A lista fechada é uma burla legalizada do voto. E que só é admissível em países com sólida tradição partidária, nos quais o eleitor não se sente constrangido nem enganado quando vota na legenda e não no candidato. Os quocientes eleitorais que a legenda atingir elegerão os candidatos de acordo com a relação decrescente da lista partidária.

A ampla maioria do baixo clero, que só deve crescer, não cairá na ratoeira armada pela elite que mingua a cada eleição.

No mais, não há novidade. É o menu de sempre: financiamento público de campanha para evitar novo escândalo do caixa dois, com o distinto público pagando a despesa; a quimera da fidelidade partidária quando se conta pelos dedos de uma das mãos os partidos que podem ser levados a sério, mais o molho da fidelidade partidária e a oportuna proposta da inelegibilidade de candidatos com a ficha suja que tenham sido condenados em decisão colegiada e não em última instância.

O governo da gastança atirou o cascalho de projetos de reforma política de morro abaixo para recolher, entre os que passarem no teste da viabilidade, os que se encaixem no painel da ministra-candidata.


Ou de quem a substitua se ela não tiver fôlego para completar a maratona.

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