Lucia Hippolito
DEU NO BLOG DE LUCIA HIPPOLITO
Em entrevista ao jornal Clarín, ontem de manhã, o presidente Lula declarou que vai fazer seu sucessor – e que, provavelmente, será “sua sucessora” (uma mulher, disse ele).
A esse respeito, cabem duas observações, registro de duas curiosidades históricas.
1ª curiosidade. Desde Artur Bernardes (1922-26), um presidente da República eleito diretamente pelo povo não faz o sucessor.
Bernardes fez Washington Luís, respeitando o rodízio do “café-com-leite”. Mas Washington Luís desrespeitou o acordo da República Velha e decidiu impor o nome de Júlio Prestes. Resultado? Revolução de 30... E 15 anos de Getúlio Vargas.
Getúlio foi deposto em 1945 e não fez o sucessor – apoiou Dutra (1946-51) a contragosto.
Dutra, por sua vez, não apoiou Getúlio, o vitorioso em 1950. Getúlio queria Juscelino como sucessor, mas suicidou-se em 1954 e não presidiu a eleição presidencial de 1955.
Juscelino (1956-61) não faz o sucessor. Jânio Quadros era oposição a JK.
Jânio renuncia, e o Brasil mergulha em longa crise, que desembocou na ditadura (1964-85).
Os generais-presidentes não foram eleitos pelo povo, mas tampouco controlaram a própria sucessão.
Castelo Branco (1965-67) teve que engolir Costa e Silva (1967-69). Este teve um derrame e nem viu a própria sucessão.
Médici, o sucessor (1969-73), não queria Ernesto Geisel, mas teve que aceitar.
De todos os generais-presidentes da ditadura, Geisel foi o único que fez o sucessor. Escolheu o general Figueiredo quando este ainda não tinha a quarta estrela de general (pré-requisito para ser presidente, naquela época) e tutelou todo o processo sucessório.
Figueiredo (1979-85) saiu do palácio e da história pela porta dos fundos.
Sarney, como sabemos, não foi eleito pelo povo. Aliás, era apenas vice-presidente e recebeu no colo a presidência da República, depois da morte do dr. Tancredo.
Sarney não fez o sucessor. Fernando Collor passou a campanha inteira falando horrores de toda a família Sarney.
Collor foi afastado depois do impeachment, e Itamar Franco, seu vice-presidente, que não tinha recebido o voto direto dos eleitores brasileiros (apenas compunha a chapa), este sim, conseguiu fazer seu sucessor.
Fernando Henrique (1995-2002) recebeu todo o apoio de Itamar, mas não conseguiu fazer seu sucessor. Lula era candidato da oposição.
Assim, se conseguir fazer seu sucessor (ou sua sucessora), o presidente Lula conseguirá um feito histórico: desde Artur Bernardes um presidente eleito pelo voto direto não faz o sucessor.
2ª curiosidade. Também desde Artur Bernardes (1922-26), um presidente eleito diretamente pelo povo não recebe a faixa presidencial de um presidente igualmente eleito pelo povo e passa a faixa para outro, também eleito pelo povo.
Vamos lá. Bernardes recebeu a faixa de Epitácio Pessoa (1919-22), eleito diretamente, e a passou para Washington Luís, também eleito diretamente, mas que foi deposto pela Revolução de 30.
Getúlio Vargas, que chefiou a revolução, foi eleito presidente da República pelo Congresso em 1934, e em 1937 deu o golpe do Estado Novo. Getúlio foi deposto em 1945.
Com a redemocratização, Eurico Dutra recebeu a faixa do presidente do Supremo Tribunal Federal, José Linhares. Dutra (1956-51), eleito diretamente, passa a faixa para Getúlio, também eleito diretamente. Mas o suicídio de Vargas interrompe a “corrente”.
Juscelino Kubitschek (1956-61) foi eleito diretamente, mas recebeu a faixa de Nereu Ramos, presidente do Senado Federal. JK passa a faixa a Jânio Quadros, igualmente eleito pelo povo, mas Jânio renuncia sete meses depois da posse, interrompendo a “corrente” novamente.
Na ditadura, como sabemos, os generais-presidentes dispensaram a eleição pelo povo.
Com a redemocratização, Sarney (1985-90) ganhou a presidência de presente, mas não por eleições diretas. Passou a faixa a Fernando Collor, eleito diretamente. Mas o impeachment e o subseqüente afastamento de Collor interrompem mais uma vez a normalidade institucional.
Fernando Henrique (1995-2002) foi eleito pelo povo, mas recebeu a faixa de Itamar Franco, o vice. FH passou a faixa a Lula (2003-2010), também eleito pelo povo.
Portanto, o presidente Lula é, desde Artur Bernardes, o primeiro presidente da República que, tendo recebido a faixa de um presidente eleito pelo povo, foi eleito pelo povo e vai passar a faixa para outro(a) presidente igualmente eleito(a) pelo povo.
Trata-se de um feito extraordinário na História brasileira, prova incontestável de consolidação institucional da democracia no Brasil.
(Aposto que os marqueteiros do Planalto não sabiam disso!)
DEU NO BLOG DE LUCIA HIPPOLITO
Em entrevista ao jornal Clarín, ontem de manhã, o presidente Lula declarou que vai fazer seu sucessor – e que, provavelmente, será “sua sucessora” (uma mulher, disse ele).
A esse respeito, cabem duas observações, registro de duas curiosidades históricas.
1ª curiosidade. Desde Artur Bernardes (1922-26), um presidente da República eleito diretamente pelo povo não faz o sucessor.
Bernardes fez Washington Luís, respeitando o rodízio do “café-com-leite”. Mas Washington Luís desrespeitou o acordo da República Velha e decidiu impor o nome de Júlio Prestes. Resultado? Revolução de 30... E 15 anos de Getúlio Vargas.
Getúlio foi deposto em 1945 e não fez o sucessor – apoiou Dutra (1946-51) a contragosto.
Dutra, por sua vez, não apoiou Getúlio, o vitorioso em 1950. Getúlio queria Juscelino como sucessor, mas suicidou-se em 1954 e não presidiu a eleição presidencial de 1955.
Juscelino (1956-61) não faz o sucessor. Jânio Quadros era oposição a JK.
Jânio renuncia, e o Brasil mergulha em longa crise, que desembocou na ditadura (1964-85).
Os generais-presidentes não foram eleitos pelo povo, mas tampouco controlaram a própria sucessão.
Castelo Branco (1965-67) teve que engolir Costa e Silva (1967-69). Este teve um derrame e nem viu a própria sucessão.
Médici, o sucessor (1969-73), não queria Ernesto Geisel, mas teve que aceitar.
De todos os generais-presidentes da ditadura, Geisel foi o único que fez o sucessor. Escolheu o general Figueiredo quando este ainda não tinha a quarta estrela de general (pré-requisito para ser presidente, naquela época) e tutelou todo o processo sucessório.
Figueiredo (1979-85) saiu do palácio e da história pela porta dos fundos.
Sarney, como sabemos, não foi eleito pelo povo. Aliás, era apenas vice-presidente e recebeu no colo a presidência da República, depois da morte do dr. Tancredo.
Sarney não fez o sucessor. Fernando Collor passou a campanha inteira falando horrores de toda a família Sarney.
Collor foi afastado depois do impeachment, e Itamar Franco, seu vice-presidente, que não tinha recebido o voto direto dos eleitores brasileiros (apenas compunha a chapa), este sim, conseguiu fazer seu sucessor.
Fernando Henrique (1995-2002) recebeu todo o apoio de Itamar, mas não conseguiu fazer seu sucessor. Lula era candidato da oposição.
Assim, se conseguir fazer seu sucessor (ou sua sucessora), o presidente Lula conseguirá um feito histórico: desde Artur Bernardes um presidente eleito pelo voto direto não faz o sucessor.
2ª curiosidade. Também desde Artur Bernardes (1922-26), um presidente eleito diretamente pelo povo não recebe a faixa presidencial de um presidente igualmente eleito pelo povo e passa a faixa para outro, também eleito pelo povo.
Vamos lá. Bernardes recebeu a faixa de Epitácio Pessoa (1919-22), eleito diretamente, e a passou para Washington Luís, também eleito diretamente, mas que foi deposto pela Revolução de 30.
Getúlio Vargas, que chefiou a revolução, foi eleito presidente da República pelo Congresso em 1934, e em 1937 deu o golpe do Estado Novo. Getúlio foi deposto em 1945.
Com a redemocratização, Eurico Dutra recebeu a faixa do presidente do Supremo Tribunal Federal, José Linhares. Dutra (1956-51), eleito diretamente, passa a faixa para Getúlio, também eleito diretamente. Mas o suicídio de Vargas interrompe a “corrente”.
Juscelino Kubitschek (1956-61) foi eleito diretamente, mas recebeu a faixa de Nereu Ramos, presidente do Senado Federal. JK passa a faixa a Jânio Quadros, igualmente eleito pelo povo, mas Jânio renuncia sete meses depois da posse, interrompendo a “corrente” novamente.
Na ditadura, como sabemos, os generais-presidentes dispensaram a eleição pelo povo.
Com a redemocratização, Sarney (1985-90) ganhou a presidência de presente, mas não por eleições diretas. Passou a faixa a Fernando Collor, eleito diretamente. Mas o impeachment e o subseqüente afastamento de Collor interrompem mais uma vez a normalidade institucional.
Fernando Henrique (1995-2002) foi eleito pelo povo, mas recebeu a faixa de Itamar Franco, o vice. FH passou a faixa a Lula (2003-2010), também eleito pelo povo.
Portanto, o presidente Lula é, desde Artur Bernardes, o primeiro presidente da República que, tendo recebido a faixa de um presidente eleito pelo povo, foi eleito pelo povo e vai passar a faixa para outro(a) presidente igualmente eleito(a) pelo povo.
Trata-se de um feito extraordinário na História brasileira, prova incontestável de consolidação institucional da democracia no Brasil.
(Aposto que os marqueteiros do Planalto não sabiam disso!)
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