segunda-feira, 8 de setembro de 2008

A vida é um palanque


Alberto Dines
DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)

O PT trocou a revolução permanente pela eleição permanente, observou há tempos a atilada colunista Dora Kramer do Estado de S. Paulo.

Todos os projetos políticos são projetos de poder, a noção de alternância e troca de guarda são essenciais na democracia. O governo, o PT e a base aliada – juntos ou separados – fazem muito bem em converter a ampulheta eleitoral num inabalável metrônomo que marca o ritmo da ação política.

Pensar no pleito seguinte costuma ser salutar, sugere programas, estratégias, coerência, continuidade. Ruim é manter o governo empoleirado nos palanques e fazer da retórica eleitoral a substância das suas políticas públicas. O caudilhismo será inevitável.

O presidente Lula trouxe dos tempos da militância sindical uma animada entonação mitingueira, palavra que as novas gerações talvez desconheçam, aparentada com meeting, comício e próxima do sentido de veemência, bravata e fereza. Foi recebido com entusiasmo já que a ditadura ainda não fora banida. Algumas décadas e dissabores depois, a fascinação pelos microfones e alto-falantes já o levou a dizer coisas das quais se arrependeu logo em seguida.

Exemplo: a pesada réplica do goleiro Júlio César aos elogios do presidente ao goleador argentino Messi e à crítica sobre a indolência da nossa seleção, poderia ter sido evitada se a sofreguidão de produzir manchetes popularescas em temporadas eleitorais não fosse tão grande. O goleiro pegou pesado mas estava no seu direito ao optar pela altivez. Futebol é terreno perigoso, altamente explosivo, uma caixinha de surpresas como ainda insistem os comentaristas de rádio. Os 180 milhões de torcedores sabem que o governo está bancando as pretensões do cartola Ricardo Teixeira, presidente da CBF que, por sua vez, é o padrinho do técnico Dunga, artífice dos melancólicos placares nas eliminatórias para a Copa.

A vitória de Marta Suplicy na corrida pela prefeitura de São Paulo é crucial para garantir a vitória do candidato (ou candidata) que Lula apoiará em 2010. Por isso mesmo, as intervenções deste formidável cabo eleitoral deveriam ser menos estabanadas.

A festinha do pré-sal com as mãos lambuzadas de petróleo foi montada para dar visibilidade à ministra Dilma Roussef, mas foi encenada. Puro marketing, por enquanto sem qualquer suporte em matéria tecnológica. Compreende-se: o presidente precisa aparecer todos os dias, dizendo e fazendo coisas para transferir votos nas capitais onde o PT precisa ganhar.

Ganhar eleição é a culminação do jogo democrático, mas não a única maneira de promover mudanças. Governar não é abrir estradas, nem presidir eleições, governar é oferecer alternativas, estimular novas idéias é, sobretudo, dar credibilidade ao aparelho do Estado. Encarapitado em carros de som, o governo pode até anunciar obras faraônicas, mas dificilmente estará avançando em matéria institucional. A decisão de privatizar grandes aeroportos do País na véspera do segundo aniversário da primeira catástrofe aérea (ainda não esclarecida), um ano depois da segunda (idem) e do escarcéu provocado pela troca do ministro da Defesa, desvenda o caráter oportunista do anúncio. O governo sequer decidiu o que pretende fazer em matéria de infra-estrutura para a aviação civil, mas já fabrica manchetes por conta da Copa de 2014 quando Lula estará perfeitamente habilitado para disputar um novo mandato.

Mesmo o recente imbróglio produzido na gramposfera tem visíveis marcas eleitoreiras. A gravação clandestina com o respectivo vazamento produziu resultados porque ocorreu num período de tensão pré-eleitoral. A direção da Abin não seria licenciada se a denúncia ocorresse num ano-ímpar, sem pleitos.

Convém lembrar que o dossiê Vedoin foi um petardo eleitoral lançado em setembro de 2006, véspera das presidenciais. O caso jamais foi esclarecido pela Polícia Federal, então dirigida com o mesmo espírito "republicano" que se pretendia levar para a Abin e malogrou.

O clima de eleição tem algo de folia, inevitável. Sobretudo no tocante às promessas. Deveria ter, ao menos, ligeiras porções de compostura.

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