Raymundo Costa
DEU NO VALOR ECONÔMICO
A eleição de domingo teve o mérito de derrubar mitos e devolver à humildade alguns políticos de boa cepa, se é que algum dia eles a tiveram. O maior dos mitos é o da presumida infalibilidade do apoio de um presidente popular, como há muito não se via, como é o caso de Luiz Inácio Lula da Silva. Outro, o de que é possível eleger o "poste", sem antes se combinar muito bem com o eleitorado.
O caso de Minas Gerais é exemplar. Um prefeito, Fernando Pimentel, e um governador, Aécio Neves, no pico da popularidade tiveram de engolir um segundo turno que não estava nos planos de nenhum dos dois. É como se o eleitor dissesse que a nomeação de prefeitos indiretos acabou em meados dos anos 1980, e desde então é o contribuinte quem decide quem governa.
O precedente também não bom, como demonstra o melhor exemplo de "poste" eleito no país - ele mesmo, Celso Pitta, o candidato que Paulo Maluf tirou do colete direto para a Prefeitura de São Paulo, em 1996. "Votem no Pitta, e se o Pitta não for um bom prefeito nunca mais votem em mim." São Paulo votou e se arrependeu para nunca mais. Padrinho e afilhado acabaram em celas da Polícia Federal.
Tem razão o governador da Bahia, Jaques Wagner, quando diz que ninguém elege "poste", se o candidato não tem sinergia com o eleitorado. É o que diz o ministro pemedebista Hélio Costa (Comunicações) sobre Márcio Lacerda, o candidato de Aécio e Pimentel para Belo Horizonte, "um estranho na política", que já teria apresentado tudo o que tem para apresentar na campanha de primeiro turno: o prefeito e o governador.
Maldade de Hélio Costa, é claro. Lacerda ainda pode ser eleito no segundo turno. Quem talvez mais se aproxime de uma explicação razoável para o que acontecer em Belo Horizonte é o assessor para assuntos internacionais de Lula, Marco Aurélio Garcia. Para o "caubói", como MAG é chamado por alguns amigos do PT, o acordo mineiro foi um mau acordo desde que Aécio e Pimentel não fizeram o dever de casa e consultaram outras forças políticas de Minas envolvidas com o assunto.
Neste caso estariam não só os dois ministros do PT, Luiz Dulci (Secretaria Geral) e Patrus Ananias (Desenvolvimento Social), como o próprio Hélio Costa e o vice-presidente da República, José Alencar. A palavra que Marco Aurélio não pronuncia é "arrogância", mas é isso o que todos pensam em relação à escolha de Aécio e Pimentel, uma aliança que poderia levar a política nacional a um novo desenho. A torcida contrária era grande e Pimentel ainda terá de se ver com o PT, mesmo se Márcio Lacerda vencer a eleição no segundo turno.
Um parêntesis: há sérias dúvidas se esse desenho transcenderia as divisas de Minas ou que teria vida longa no próprio Estado. Pimentel acredita firmemente que Lula vai eleger presidente a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil), pretende apoiar firmemente a aposta de Lula e receber dele apoio para suceder Aécio Neves no governo. Tanto que espera ir para um ministério (Turismo), cargo que lhe permitiria melhorar sua imagem no interior. É por isso que, nos bastidores, demonstra irritação com a candidatura de Aécio a presidente. Acha que é para atrapalhá-lo.
A crença de Pimentel na eleição de Dilma, a partir da popularidade de Lula, é difundida não só no PT, mas também na oposição. Essa crença sofreu um abalo na eleição de domingo. Aliás, o próprio Palácio do Planalto, na avaliação que fez das eleições, concluiu que o apoio do presidente ajuda, mas por si só não basta para eleger alguém - o eleitor não é cego, já percebeu alguns erros passados (caso Pitta, por exemplo) e quer saber é quem está efetivamente preparado para administrar.
Não bastaria o candidato ter um bom padrinho e falar em "choque de gestão". O eleitor pode até pensar que será eletrocutado. Em Belo Horizonte, avalia-se no Planalto que o candidato da dupla Aécio e Pimentel pode até se sair bem na campanha do segundo turno, agora que levou um choque de humildade e terá dez minutos no horário gratuito para se apresentar, além dos debates, para convencer o eleitor de que será um bom gestor da cidade. Quanto a Lula, o Planalto não crê que o presidente se saiu tão mal assim.
No caso de Natal (RN), onde a oposição acusa Lula de ter recorrido ao uso de força excessiva, afirma-se que a candidata do PT, Fátima Bezerra, talvez não passasse dos 10%, se não tivesse seu apoio (ganhou o DEM).
Já Luiz Marinho, candidato em São Bernardo do Campo, pelo qual Lula mais se empenhou nessas eleições, não ganhou por pouco, no primeiro turno. Não fosse o apoio do presidente, talvez nem tivesse chegado ao segundo, como passou a acontecer com o PT depois de 1988, quando venceu pela última vez na cidade que é o berço do partido. E local de moradia de Lula depois que ele deixar a Presidência.
Nos arredores do gabinete de Lula diz-se que não foi surpresa Gilberto Kassab ter passado para o segundo turno, na eleição de São Paulo, à frente da candidata do PT, Marta Suplicy. A surpresa das pessoas seria decorrente apenas do fato de as pesquisas de boca-de-urna terem apontado para um resultado diferente. A avaliação é que a eleição de 2008 foi a eleição da continuidade e nada mais natural que o prefeito, tendo uma gestão bem avaliada, chegasse bem no final do turno.
O erro maior teria sido da campanha da candidata do PT. Certa de que estaria no segundo turno, Marta deveria ter escolhido o adversário, que seria aquele que estabelecesse maior contraste com sua candidatura, e, ajudando-o no início, começar um trabalho de desconstrução do candidato.
Se houve essa escolha e o escolhido foi Kassab, isso não ocorreu, mas certamente ocorrerá no segundo turno. Lula fará depoimentos mais efetivos sobre a importância da vitória de Marta, deve viajar a São Paulo (há limitação de tempo), mas não se envolverá tanto a ponto que possa dar ao governador José Serra, no caso de vitória de Gilberto Kassab, o prazer de dizer que derrotou o presidente.
Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras
DEU NO VALOR ECONÔMICO
A eleição de domingo teve o mérito de derrubar mitos e devolver à humildade alguns políticos de boa cepa, se é que algum dia eles a tiveram. O maior dos mitos é o da presumida infalibilidade do apoio de um presidente popular, como há muito não se via, como é o caso de Luiz Inácio Lula da Silva. Outro, o de que é possível eleger o "poste", sem antes se combinar muito bem com o eleitorado.
O caso de Minas Gerais é exemplar. Um prefeito, Fernando Pimentel, e um governador, Aécio Neves, no pico da popularidade tiveram de engolir um segundo turno que não estava nos planos de nenhum dos dois. É como se o eleitor dissesse que a nomeação de prefeitos indiretos acabou em meados dos anos 1980, e desde então é o contribuinte quem decide quem governa.
O precedente também não bom, como demonstra o melhor exemplo de "poste" eleito no país - ele mesmo, Celso Pitta, o candidato que Paulo Maluf tirou do colete direto para a Prefeitura de São Paulo, em 1996. "Votem no Pitta, e se o Pitta não for um bom prefeito nunca mais votem em mim." São Paulo votou e se arrependeu para nunca mais. Padrinho e afilhado acabaram em celas da Polícia Federal.
Tem razão o governador da Bahia, Jaques Wagner, quando diz que ninguém elege "poste", se o candidato não tem sinergia com o eleitorado. É o que diz o ministro pemedebista Hélio Costa (Comunicações) sobre Márcio Lacerda, o candidato de Aécio e Pimentel para Belo Horizonte, "um estranho na política", que já teria apresentado tudo o que tem para apresentar na campanha de primeiro turno: o prefeito e o governador.
Maldade de Hélio Costa, é claro. Lacerda ainda pode ser eleito no segundo turno. Quem talvez mais se aproxime de uma explicação razoável para o que acontecer em Belo Horizonte é o assessor para assuntos internacionais de Lula, Marco Aurélio Garcia. Para o "caubói", como MAG é chamado por alguns amigos do PT, o acordo mineiro foi um mau acordo desde que Aécio e Pimentel não fizeram o dever de casa e consultaram outras forças políticas de Minas envolvidas com o assunto.
Neste caso estariam não só os dois ministros do PT, Luiz Dulci (Secretaria Geral) e Patrus Ananias (Desenvolvimento Social), como o próprio Hélio Costa e o vice-presidente da República, José Alencar. A palavra que Marco Aurélio não pronuncia é "arrogância", mas é isso o que todos pensam em relação à escolha de Aécio e Pimentel, uma aliança que poderia levar a política nacional a um novo desenho. A torcida contrária era grande e Pimentel ainda terá de se ver com o PT, mesmo se Márcio Lacerda vencer a eleição no segundo turno.
Um parêntesis: há sérias dúvidas se esse desenho transcenderia as divisas de Minas ou que teria vida longa no próprio Estado. Pimentel acredita firmemente que Lula vai eleger presidente a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil), pretende apoiar firmemente a aposta de Lula e receber dele apoio para suceder Aécio Neves no governo. Tanto que espera ir para um ministério (Turismo), cargo que lhe permitiria melhorar sua imagem no interior. É por isso que, nos bastidores, demonstra irritação com a candidatura de Aécio a presidente. Acha que é para atrapalhá-lo.
A crença de Pimentel na eleição de Dilma, a partir da popularidade de Lula, é difundida não só no PT, mas também na oposição. Essa crença sofreu um abalo na eleição de domingo. Aliás, o próprio Palácio do Planalto, na avaliação que fez das eleições, concluiu que o apoio do presidente ajuda, mas por si só não basta para eleger alguém - o eleitor não é cego, já percebeu alguns erros passados (caso Pitta, por exemplo) e quer saber é quem está efetivamente preparado para administrar.
Não bastaria o candidato ter um bom padrinho e falar em "choque de gestão". O eleitor pode até pensar que será eletrocutado. Em Belo Horizonte, avalia-se no Planalto que o candidato da dupla Aécio e Pimentel pode até se sair bem na campanha do segundo turno, agora que levou um choque de humildade e terá dez minutos no horário gratuito para se apresentar, além dos debates, para convencer o eleitor de que será um bom gestor da cidade. Quanto a Lula, o Planalto não crê que o presidente se saiu tão mal assim.
No caso de Natal (RN), onde a oposição acusa Lula de ter recorrido ao uso de força excessiva, afirma-se que a candidata do PT, Fátima Bezerra, talvez não passasse dos 10%, se não tivesse seu apoio (ganhou o DEM).
Já Luiz Marinho, candidato em São Bernardo do Campo, pelo qual Lula mais se empenhou nessas eleições, não ganhou por pouco, no primeiro turno. Não fosse o apoio do presidente, talvez nem tivesse chegado ao segundo, como passou a acontecer com o PT depois de 1988, quando venceu pela última vez na cidade que é o berço do partido. E local de moradia de Lula depois que ele deixar a Presidência.
Nos arredores do gabinete de Lula diz-se que não foi surpresa Gilberto Kassab ter passado para o segundo turno, na eleição de São Paulo, à frente da candidata do PT, Marta Suplicy. A surpresa das pessoas seria decorrente apenas do fato de as pesquisas de boca-de-urna terem apontado para um resultado diferente. A avaliação é que a eleição de 2008 foi a eleição da continuidade e nada mais natural que o prefeito, tendo uma gestão bem avaliada, chegasse bem no final do turno.
O erro maior teria sido da campanha da candidata do PT. Certa de que estaria no segundo turno, Marta deveria ter escolhido o adversário, que seria aquele que estabelecesse maior contraste com sua candidatura, e, ajudando-o no início, começar um trabalho de desconstrução do candidato.
Se houve essa escolha e o escolhido foi Kassab, isso não ocorreu, mas certamente ocorrerá no segundo turno. Lula fará depoimentos mais efetivos sobre a importância da vitória de Marta, deve viajar a São Paulo (há limitação de tempo), mas não se envolverá tanto a ponto que possa dar ao governador José Serra, no caso de vitória de Gilberto Kassab, o prazer de dizer que derrotou o presidente.
Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras
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