Jarbas de Holanda
A reunião de representantes do G-20 ocorrida em São Paulo sábado e domingo, convocada às pressas para antecipar-se ao encontro dos chefes de governo de todos os países desse bloco, a se realizar em Washington no fim desta semana, em vez de confirmar a expectativa do presidente Lula de que, nela, os emergentes (à frente o Brasil) passariam a ter papel decisivo nas respostas à crise financeira global, ao invés disso terminou caracterizando-se como um fórum de discussões e sem produzir resultados concretos. O que, aliás, levou um dos seus promotores, o nosso ministro da Fazenda Guido Mantega a afirmar após o final do evento (desconstruindo por inteiro aquela expectativa): “Quem pariu Mateus que o embale”, ou seja, aos países ricos é que caberia solucionar a crise.
Mas a improvisada reunião do G-20 e seu desdobramento, segunda-feira, no encontro dos dirigentes de 40 bancos centrais tiveram também outro dividendo negativo: reacenderam divergências que estavam relativamente contidas ou abafadas entre o ministério da Fazenda e o Banco Central a respeito das respostas macroeconômicas do governo Lula aos efeitos da crise. Retomadas agora com forte explicitação pública pelas duas autoridades.
Seguem-se títulos e trechos de algumas das matérias dos jornais de ontem sobre tais divergências. Do Estado de S. Paulo – “BCs pedem cautela com gasto público. A posição é contrária à do ministro Guido Mantega, que defende o aumento de investimentos para estimular a economia”. No meio da reportagem: “Meirelles lembrou que o Brasil já tem seu Programa de Aceleração de Crescimento (PAC)”. Da Folha de S. Paulo – “BCs mundiais não endossam alta de gastos. Meirelles afirma que não houve comprometimento do G-20 em torno do aumento de gastos públicos e do corte de juros”. Ao longo do texto da matéria: “Um dia após o ministro Mantega anunciar, ao lado dos representantes da África do Sul e do Reino Unido, que os emergentes fecharam questão em torno da adoção de políticas fiscais expansionistas, o presidente do Banco Central brasileiro recusou-se a endossar tal idéia”. Do Globo: “Meirelles diz que país não deve ampliar gastos. Após Mantega admitir política fiscal mais flexível, presidente do BC diz que PAC já é remédio suficiente anticrise”.
No centro do conflito entre Mantega e Meirelles está o nível de gastos do governo. O qual seria ampliado, em vez de contido ou reduzido, com as políticas expansionistas defendidas pelo primeiro. E que, para o segundo, porque já está muito alto, não pode ser aumentado (por tais políticas) sem provocar mais pressões inflacionárias (além das que já são geradas pela expansão do consumo este ano e mantidas nos anos seguintes pelos elevados gastos públicos obrigatórios. A questão foi muito bem tratada no editorial da Folha, de ontem, com os seguintes títulos e chamada de abertura – “Mais disciplina fiscal” e “Se não atacar gastos obrigatórios, governo arrisca-se a sacrificar obras e a elevar tributos para adaptar-se à crise”.
Trechos do editorial: “Infelizmente, o setor público brasileiro, em especial o Executivo da União, desperdiçou grande parte do trunfo oferecido por vários anos excepcionais de arrecadação. A despesa com servidores federais fechará 2008 em R$ 133 bilhões, aumento de 10% acima da inflação em relação a 2007. Em franca ascensão, a folha de pagamentos vai ultrapassar a despesa com juros da dívida pública (R$ 104 bilhões) para tornar-se o segundo item do gasto federal, atrás apenas dos benefícios da Previdência. Salários, juros e Previdência, juntos, consomem 70% de todos os gastos da União. O engessamento orçamentário vai mais longe, pois entre os 30% restantes estão rubricas cujo dispêndio é garantido por determinação constitucional. Aumentos já concedidos a servidores, as recentes elevações de juros pelo Banco Central e mecanismos generosos de reajuste do piso previdenciário continuarão a empurrar a fatia de despesas obrigatórias para cima se nada for feito”.
Despesas de custeio versus investimento – “Quanto mais enrijecido o Orçamento, maior a probabilidade de o governo sacrificar seu programa de obras, para compensar uma quebra de arrecadação, comum em tempos de crise”. “O desejo quase religioso de preservar as obras do PAC, no governo Lula, não se tem feito acompanhar de iniciativas fiscais ousadas, capazes de dar concretude à promessa. É preciso golpear, e já, os três grandes itens de despesa fixa federal, a fim de que seu conjunto, no mínimo, pare de conquistar mais fatias do Orçamento nos próximos anos”. Conclusão: “O ritmo de crescimento da folha de pagamentos do funcionalismo público – nos três Poderes e nas três esferas administrativas – precisa ganhar um limite legal. Seria também um incentivo a mais para que o governo Lula se distanciasse um pouco dos lobbies sindicais a fim de encarar os ganhos de eficiência na gestão pública como objetivo sistemático”.
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