Alberto Dines
DEU NO JORNAL DO COMMERCIO(PE)
Tragédias e tormentas não se anunciam, preferem surpreender, mais devastadoras do que fatos previsíveis. Fados, deuses e autores, igualmente pérfidos, divertem-se emitindo sinais enganosos para desarmar prevenções e cautelas nos personagens. Quanto mais alta a animação, maior é a queda.
O pior que poderia acontecer ao presidente Lula nesta sombria virada de ano seria um retumbante triunfo pessoal como o inimaginável recorde de aprovação (70%) verificado pelo Instituto Datafolha.
Desconhece-se a hora em que o presidente foi informado na quinta-feira a respeito dos resultados da nova sondagem que seria anunciada na manhã seguinte, tudo leva a crer que haja uma relação de causa e efeito entre o recorde de popularidade e uma certa exaltação na oratória presidencial durante uma cerimônia no Rio com a inclusão de uma metáfora chula, logo deletada na versão oficial do discurso.
Não chegam a ser alarmantes os efeitos de uma eventual euforia sobre a linguagem dos pronunciamentos presidenciais, o que deve preocupar é um eventual desmando nos conteúdos contrastando com a necessária prudência. O rolo compressor de um otimismo local pode ter efeitos deletérios diante de um cenário mundial tão deprimente.
A visível pressão para obter índices econômicos positivos no último trimestre de 2008 e no primeiro de 2009 pode substituir uma discussão imperiosamente técnica por outra, surfista, em torno do tsunami global e das marolas que aqui chegarão. O "olho gordo" de vizinhos encalacrados - caso do Equador - só tenderá a aumentar se o marketing político for acionado para valorizar a gestão da economia.
A obsessão em garantir um crescimento de 4% no PIB de um ano pré-eleitoral pode alimentar a conhecida vocação para aventuras característica de regimes políticos insuficientemente consolidados. Estes 70% de popularidade na metade do segundo mandato - quando os efeitos da fadiga de material já deveriam estar visíveis - não ajudam o programa infra-estrutural do PAC nem as políticas públicas em áreas como a saúde e a educação onde os resultados são mais demorados. Ao contrário, favorecem o carnaval demagógico e a folia assistencialista.
Os problemas de caixa enfrentados recentemente pela gigantesca Petrobras foram contornados mas não devem ser ignorados. O processo engasgou uma vez e nada impede que engasgue novamente caso não sejam tomadas providências mais drásticas. O pré-sal inebriou certas esferas que deveriam estar infensas a libações deste tipo.
A crise mundial é na realidade um conjunto de crises concêntricas (estrutural, sistêmica, conceitual, ambiental, alimentar, política), difíceis de driblar no seu conjunto. As sucessivas convocações palacianas para consumir e gastar dão um ar festeiro e falso ao processo econômico. A quermesse que se pretende reeditar neste final de ano reclama um cardápio mais consistente, responsável. Compatível com uma conjuntura onde impera a sisudez e a circunspecção.
Tragédias e tormentas são potencializadas pela despreocupação, pelo descaso e pela desatenção. Os grandes estadistas e os grandes generais jamais dispensaram boas doses de inquietação. O catastrofismo tem utilidade, pode ser salutar - estimula as defesas, testa a capacidade preventiva.
Exercita o senso trágico. Sempre mais digno, mais atento, mais compenetrado e mais produtivo do que o senso da galhofa.
» Alberto Dines é jornalista
DEU NO JORNAL DO COMMERCIO(PE)
Tragédias e tormentas não se anunciam, preferem surpreender, mais devastadoras do que fatos previsíveis. Fados, deuses e autores, igualmente pérfidos, divertem-se emitindo sinais enganosos para desarmar prevenções e cautelas nos personagens. Quanto mais alta a animação, maior é a queda.
O pior que poderia acontecer ao presidente Lula nesta sombria virada de ano seria um retumbante triunfo pessoal como o inimaginável recorde de aprovação (70%) verificado pelo Instituto Datafolha.
Desconhece-se a hora em que o presidente foi informado na quinta-feira a respeito dos resultados da nova sondagem que seria anunciada na manhã seguinte, tudo leva a crer que haja uma relação de causa e efeito entre o recorde de popularidade e uma certa exaltação na oratória presidencial durante uma cerimônia no Rio com a inclusão de uma metáfora chula, logo deletada na versão oficial do discurso.
Não chegam a ser alarmantes os efeitos de uma eventual euforia sobre a linguagem dos pronunciamentos presidenciais, o que deve preocupar é um eventual desmando nos conteúdos contrastando com a necessária prudência. O rolo compressor de um otimismo local pode ter efeitos deletérios diante de um cenário mundial tão deprimente.
A visível pressão para obter índices econômicos positivos no último trimestre de 2008 e no primeiro de 2009 pode substituir uma discussão imperiosamente técnica por outra, surfista, em torno do tsunami global e das marolas que aqui chegarão. O "olho gordo" de vizinhos encalacrados - caso do Equador - só tenderá a aumentar se o marketing político for acionado para valorizar a gestão da economia.
A obsessão em garantir um crescimento de 4% no PIB de um ano pré-eleitoral pode alimentar a conhecida vocação para aventuras característica de regimes políticos insuficientemente consolidados. Estes 70% de popularidade na metade do segundo mandato - quando os efeitos da fadiga de material já deveriam estar visíveis - não ajudam o programa infra-estrutural do PAC nem as políticas públicas em áreas como a saúde e a educação onde os resultados são mais demorados. Ao contrário, favorecem o carnaval demagógico e a folia assistencialista.
Os problemas de caixa enfrentados recentemente pela gigantesca Petrobras foram contornados mas não devem ser ignorados. O processo engasgou uma vez e nada impede que engasgue novamente caso não sejam tomadas providências mais drásticas. O pré-sal inebriou certas esferas que deveriam estar infensas a libações deste tipo.
A crise mundial é na realidade um conjunto de crises concêntricas (estrutural, sistêmica, conceitual, ambiental, alimentar, política), difíceis de driblar no seu conjunto. As sucessivas convocações palacianas para consumir e gastar dão um ar festeiro e falso ao processo econômico. A quermesse que se pretende reeditar neste final de ano reclama um cardápio mais consistente, responsável. Compatível com uma conjuntura onde impera a sisudez e a circunspecção.
Tragédias e tormentas são potencializadas pela despreocupação, pelo descaso e pela desatenção. Os grandes estadistas e os grandes generais jamais dispensaram boas doses de inquietação. O catastrofismo tem utilidade, pode ser salutar - estimula as defesas, testa a capacidade preventiva.
Exercita o senso trágico. Sempre mais digno, mais atento, mais compenetrado e mais produtivo do que o senso da galhofa.
» Alberto Dines é jornalista
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