quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Crise, sucessão e um Congressodiferente na fase final do governo

Jarbas de Holanda

A conquista pelo PMDB dos comandos da Câmara e do Senado, já praticamente definida a menos de uma semana das duas eleições – em ambas numa aliança com a oposição, na segunda contra o PT e na primeira sem depender do apoio dele – poderá mudar significativamente a qualidade do relacionamento do Palácio do Planalto com o Congresso, terá algumas implicações no enfrentamento da crise econômica e, sobretudo, condicionará o processo da sucessão presidencial, em particular a campanha da candidata situacionista Dilma Rousseff.

A mudança da qualidade de tal relacionamento será facilitada ou propiciada por progressiva evolução do partido majoritário no Legislativo federal de uma postura que combinava a partilha do governo com a subordinação ao projeto sucessório de Lula para um posicionamento pragmático de persistência da partilha mas sem compromisso com o referido projeto e, mais que isso, aberto à exploração de duas alternativas: apoio a um candidato oposicionista, provavelmente o tucano José Serra, ou lançamento de um nome próprio (na hipótese, de difícil e incerta operação, da troca de legenda por Aécio Neves). Nos dois casos, com interrupção daquela partilha bem antes da disputa presidencial.

Manifestações previsíveis de tal mudança: com um PT enfraquecido, o presidente Lula dependerá decisivamente de um PMDB centrista para o enfrentamento dos efeitos da crise econômica no Legislativo e para a própria governabilidade, bem como para a montagem de seu projeto sucessório. Outras manifestações do gênero: o fechamento do caminho para proposta de um terceiro mandato presidencial consecutivo (que poderia reemergir com força num cenário – bem mais adiante – de manutenção de altos índices de popularidade de Lula e de precária afirmação de candidatura por ele patrocinada), que o PSDB reforça com cobrança de explicitação contrária por Sarney; e aumento das dificuldades enfrentadas pelo projeto oficial de ingresso da Venezuela de Hugo Chávez no Mercosul, carente de aprovação por um Senado com um presidente reiteradamente hostil à iniciativa. Mas tudo isso se processando por meio da ambigüidade própria do pragmatismo peemedebista, sem envolver iniciativas de ruptura com um presidente com alta taxa de popularidade e que conta ainda com dois anos de mandato.

Em relação à crise, o fortalecimento do PMDB centrista, em detrimento do esquerdismo do PT, poderá refrear propostas e ações de setores do governo para enfrentamento dela por meio de medidas de exacerbação populista, tais como nova escalada dos gastos com programas assistencialistas e das despesas de custeio (além das já contratadas para este e os próximos anos) ou o bloqueio político à negociações trabalhistas destinadas a minimizar a avalanche de demissões, sobretudo na indústria. Quanto a decisões tomadas pelo Planalto que têm sido questionadas – como a criação do Fundo Soberano, com recursos internos, e o uso de vultosas e subsidiadas verbas públicas para a capitalização do BNDES – o PMDB não tem posição contrária ou nada a opor. Como também em relação ao PAC e outros programas de investimentos, de cuja gestão buscará participar mais e colher melhor dividendos.

Especificamente a respeito da sucessão de 2010, a dependência maior de Lula para com o PMDB deverá traduzir-se num esforço da pré-candidatura Dilma Rousseff para associação dele a sua campanha. Que, por isso, enfrentará mais restrições no PT, restrições, porém, de um partido debilitado e sujeito ao comando do presidente Lula. A busca dessa associação terá a virtude de reduzir o esquerdismo histórico da chefe da Casa Civil, compelindo sua campanha a ampliar articulações com setores do empresariado em torno de propostas desenvolvimentistas nas quais ela disfarçará seu dirigismo estatizante e a serem combinadas com a capitalização dos programas assistencialistas de Lula. Pois, para disputar o apoio do PMDB, como uma candidatura a ser socialmente construída, Dilma terá de escudar-se num discurso moderado, capaz de sensibilizar o eleitorado centrista (ao contrário daquele que Lula fez no segundo turno da disputa com Geraldo Alckmin em 2006, ao usar retórica radical antiprivatização e anti-av.Paulista, esta como símbolo do empresariado da Fiesp).

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