quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Governo recua e elimina restrição a importação

Martha Beck, Eliane Oliveira e Cássia Almeida
DEU EM O GLOBO

Após protesto de empresários, Mantega nega intenção protecionista e diz que a medida foi mal-interpretada

BRASÍLIA. Atordoado com a péssima repercussão no meio empresarial da medida que, desde a última segunda-feira, exigia licença prévia de importação para cerca de três mil itens, o governo recuou ontem e suspendeu os efeitos da nova regra a partir de hoje. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, veio a público explicar que a ideia era acompanhar o comportamento da balança comercial, que vem apresentando um desempenho ruim no primeiro mês do ano, e não impor uma barreira não-tarifária.

- O Ministério do Desenvolvimento resolveu tomar uma medida para poder fazer um monitoramento mais preciso do que estava acontecendo na balança comercial. Essa medida foi mal-entendida, causou ruídos, foi mal-interpretada. Por isso, concordamos pela sua suspensão - disse Mantega.

A restrição acabaria tornando mais lento o desembaraço das mercadorias, alertaram representantes da classe empresarial. O ministro, porém, indicou que a preocupação do governo era com a entrada no país de produtos que pudessem causar concorrência predatória e prejudicar as empresas nacionais, num momento em que as exportações estão em baixa. Em outras palavras, ele admitiu que o déficit que vem se concretizando este mês, depois de sete anos em que não é registrado um único saldo negativo mensal, pesou na decisão:

- A crise internacional provocou uma redução da demanda de commodities e, portanto, uma diminuição das exportações brasileiras. Causou uma preocupação em relação ao desempenho da balança comercial.

Sob fortes críticas, o governo já havia começado a reduzir o número de produtos que estavam na lista desde a última terça-feira. Trigo, autopeças, plásticos e derivados e alguns bens de capital foram retirados.

Para o vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, a revogação "foi uma demonstração de bom-senso do governo". O presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Jackson Schneider, afirmou:

- Qualquer tipo de apreensão referente a dificuldades no que diz respeito ao processo de produção não é bom.

Para entidade, governo teve sensibilidade

Schneider esteve anteontem com Mantega. Uma fonte do governo disse que o setor automotivo ajudou a convencer o governo a voltar atrás, alegando que poderia haver problemas na escala de produção se houvesse dificuldades na importação de peças e plásticos.

A Associação Brasileira da Indústria Elétrica Eletrônica (Abinee) comemorou a decisão. Muito dependente das importações para sua produção, o setor levou suas queixas diretamente ao ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, em viagem pela África, por meio do presidente Humberto Barbato. Para a entidade, "o governo demonstrou sensibilidade".

Segundo fontes, a imposição da licença prévia foi acertada diretamente pela Fazenda com o Palácio do Planalto. O Ministério do Desenvolvimento fora encarregado de executá-la. A nova regra saiu justamente quando nem Miguel Jorge nem o secretário de Comércio Exterior (Welber Barral) estavam no país. Apreensivo com a possibilidade de outros países questionarem a medida na Organização Mundial do Comércio (OMC), o Itamaraty sequer foi consultado.

Também pesou na decisão de exigir licença prévia o risco de uma invasão de produtos da China, em diversos casos com fraudes e subfaturamentos nas aduanas, e a tendência protecionista da Argentina.

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