sábado, 10 de janeiro de 2009

Prioridade social do emprego

Alfried Karl Plöger
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


Reduzir a jornada de trabalho e os salários é uma boa saída para enfrentar a alta do desemprego?

OS CONCEITOS mais contemporâneos da governança corporativa, quase dogmáticos nas companhias de capital aberto, mas não menos importantes para empresas de todos os portes e setores, estabelecem compromissos da gestão com o bem-estar da sociedade. Isso significa consciência ambiental, responsabilidade com a qualidade de vida dos funcionários, seus familiares e comunidade, bem como adoção de práticas voltadas à sustentabilidade.No âmbito dessas metas, o mais significativo item é o emprego, pois os salários e benefícios intrínsecos às relações trabalhistas são os mais eficazes e dignos meios de inclusão social e garantia de acesso aos direitos básicos de alimentação, saúde, moradia, educação e lazer.

Manter postos de trabalho, portanto, é tema prioritário na presente crise mundial, uma das mais graves da história do capitalismo.

Assim, é preocupante verificar o início de um movimento de demissões em alguns segmentos e o estado de alerta em tantos outros.

Na indústria gráfica, por exemplo, na qual tem-se verificado crescimento anual do volume de empregos, recente pesquisa mostra tendência de paralisação das contratações. Em todos os setores, a rigor, observa-se ansiedade quanto ao futuro próximo. Proporcionalmente à extensão ainda não claramente identificada do rombo dos derivativos e do tempo de retomada da normalidade, será mais difícil manter empregos.

Assim, não há nenhuma dúvida quanto à pertinência e legitimidade da proposta de redução em 20% da jornada de trabalho e dos salários feita pela Fiesp/Ciesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo e Centro das Indústrias do Estado de São Paulo). A medida tem absoluta retaguarda legal e sua adoção dependente apenas de acordos soberanos entre empresas e sindicatos.

O sucesso de algumas soluções pontuais semelhantes avaliza a sugestão: as empresas signatárias, em vez de demitir, mantiveram seus quadros ou grande parte deles. Os trabalhadores podem aproveitar a menor carga horária para cursos de reciclagem e aperfeiçoamento.

Obviamente, reduzir jornada e salários não é a ninguém confortável.

No entanto, embora amarga, é uma das alternativas eficientes para evitar demissões em escala, dando fôlego às empresas e maior segurança aos trabalhadores para atravessar a turbulência. Trata-se de sacrifício em nome da prioridade do emprego e da manutenção de um patamar razoável para a atividade econômica.

Há, porém, uma ressalva: de nada adianta essa atitude de empregadores e trabalhadores se todos, inclusive o governo, não fizerem sua parte. A medida deve inserir-se num conjunto de providências. É preciso, por exemplo, que os recursos injetados no sistema financeiro por meio da liberação dos depósitos compulsórios cheguem à economia real. Também é crucial reduzir juros, pois seria inútil disponibilizar crédito sem reduzir o custo do dinheiro.

Outro grave problema a ser atacado é o gasto público. Como se vê na peça orçamentária da União para 2009, o custeio é paradoxal ao perfil adequado para o Estado. É um conjunto de despesas resultante de várias décadas de equívocos na gestão dos organismos governamentais, que continuam inchados, onerosos para os contribuintes e ineficazes no atendimento em áreas essenciais, como saúde, educação, segurança e infraestrutura. Reduzir tais dispêndios é decisivo, tanto quanto concluir a reforma tributária e adequá-la à premissa de desoneração dos setores produtivos.

É nesse contexto amplo que se torna ainda mais válida a redução temporária da jornada de trabalho e dos salários. Governar e gerenciar empresas pressupõem a prevalência do bom senso ante as prioridades. Começando pela garantia do maior número possível de postos de trabalho, o Brasil precisa da mobilização sinérgica de toda a sociedade e do poder público para enfrentar a crise mundial.


Alfried Karl Plöger, 69, é presidente da Abigraf (Associação Brasileira da Indústria Gráfica ) e vice-presidente da Abrasca (Associação Brasileira das Companhias Abertas).

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