Enviado Especial a San José (Costa Rica) e Manágua (Nicarágua)
DEU NA FOLHA DE S. PAULO
Em entrevista à Folha, hondurenho afirma que golpe aconteceu porque ele tentou dar mais poder decisório à população
Presidente deposto afirma que pressão internacional deve ser maior e nega papel central de Hugo Chávez nas decisões de seu governo
Três semanas após ter sido detido e expulso de Honduras, o presidente deposto Manuel Zelaya, 56, não parece disposto a fazer concessões nos pontos evocados para justificar o seu afastamento. Pretende levar adiante o seu projeto de convocar uma consulta sobre a Assembleia Constituinte porque, diz, é uma demanda popular. Também defende a aliança com o presidente Hugo Chávez e não descarta uma nova candidatura à Presidência caso haja mudança nas regras.Em entrevista à Folha na Embaixada de Honduras na Nicarágua, Zelaya cobrou o aumento da pressão internacional contra o governo do presidente interino, Roberto Micheletti, e disse que o único país que tem influência em Honduras são os Estados Unidos.
A conversa foi gravada na sexta à noite -antes, portanto, das negociações que aconteceriam ontem na Costa Rica.
FOLHA - O sr. tem aprovação de 46%, segundo o instituto Gallup, mas as instituições do Estado hondurenho, como o Congresso, o Supremo e a Promotoria, apoiam o governo interino. Como se daria a governabilidade caso o sr. retome a Presidência?
MANUEL ZELAYA - Melhor do que a que eles estão tendo agora. Eu nunca tive o apoio desses setores. Eu não necessito deles realmente porque há independência de Poderes. Não me preocupa o problema político, o que me preocupa é o respeito à lei e à democracia.
FOLHA - Alguns dos seus assessores, como o atual ministro da Defesa, permaneceram no seu governo até o final, mas agora estão com Micheletti. Por que isso ocorreu?
ZELAYA - É como se você passasse para outro meio de comunicação. Se a concorrência lhe paga mais, qual é o problema? Vivemos num mundo livre. Judas pediu 30 moedas para vender o Senhor. É parte da vida, não há por que se preocupar.
FOLHA - O sr. está disposto a abandonar a proposta do referendo sobre a Constituição?
DEU NA FOLHA DE S. PAULO
Em entrevista à Folha, hondurenho afirma que golpe aconteceu porque ele tentou dar mais poder decisório à população
Presidente deposto afirma que pressão internacional deve ser maior e nega papel central de Hugo Chávez nas decisões de seu governo
Três semanas após ter sido detido e expulso de Honduras, o presidente deposto Manuel Zelaya, 56, não parece disposto a fazer concessões nos pontos evocados para justificar o seu afastamento. Pretende levar adiante o seu projeto de convocar uma consulta sobre a Assembleia Constituinte porque, diz, é uma demanda popular. Também defende a aliança com o presidente Hugo Chávez e não descarta uma nova candidatura à Presidência caso haja mudança nas regras.Em entrevista à Folha na Embaixada de Honduras na Nicarágua, Zelaya cobrou o aumento da pressão internacional contra o governo do presidente interino, Roberto Micheletti, e disse que o único país que tem influência em Honduras são os Estados Unidos.
A conversa foi gravada na sexta à noite -antes, portanto, das negociações que aconteceriam ontem na Costa Rica.
FOLHA - O sr. tem aprovação de 46%, segundo o instituto Gallup, mas as instituições do Estado hondurenho, como o Congresso, o Supremo e a Promotoria, apoiam o governo interino. Como se daria a governabilidade caso o sr. retome a Presidência?
MANUEL ZELAYA - Melhor do que a que eles estão tendo agora. Eu nunca tive o apoio desses setores. Eu não necessito deles realmente porque há independência de Poderes. Não me preocupa o problema político, o que me preocupa é o respeito à lei e à democracia.
FOLHA - Alguns dos seus assessores, como o atual ministro da Defesa, permaneceram no seu governo até o final, mas agora estão com Micheletti. Por que isso ocorreu?
ZELAYA - É como se você passasse para outro meio de comunicação. Se a concorrência lhe paga mais, qual é o problema? Vivemos num mundo livre. Judas pediu 30 moedas para vender o Senhor. É parte da vida, não há por que se preocupar.
FOLHA - O sr. está disposto a abandonar a proposta do referendo sobre a Constituição?
ZELAYA - Essa não é uma decisão minha, é uma decisão jurídica. É preciso buscar uma decisão jurídica. É um problema de vontade política, não posso trair o povo inteiro e deixar o processo.
FOLHA - A principal acusação contra o sr. é a de que queria a reeleição. Qual é sua posição sobre o tema?
ZELAYA - O governo não tem nenhuma possibilidade de fazer o processo de reeleição. É problema de uma Assembleia Constituinte que se estabeleça noutro governo, não no meu.
FOLHA - Mas o sr. não tem uma posição sobre a reeleição?
ZELAYA - Não tenho hoje nenhum interesse nisso. Acho que é um tema de discussão futura, não no meu governo.
FOLHA - O sr. foi eleito por um dos partidos mais tradicionais de Honduras, e a sua cúpula deixou de apoiá-lo e respalda o golpe. Quem mudou, o sr. ou o seu partido?
ZELAYA - Não há uma ruptura total com a cúpula, só parte dela. Há deputados e prefeitos que me apoiam; tenho 70% da base política. Ou seja, talvez seja um grupo de ultradireita conservadora que, com o tempo, se acomoda no poder.
FOLHA - Mas o sr. não mudou a sua ideologia, a forma de ver o país durante o mandato?
ZELAYA - Fui coerente com a minha campanha. A minha proposta tinha um slogan que se converteu em ideologia: o "poder cidadão". Dar poder ao cidadão para que ele seja protagonista do seu destino. A primeira lei que aprovei foi de participação cidadã, e o que estava fazendo agora é um processo de participação. Tenho sido coerente com as minhas posições.
FOLHA - Mas a convocação de uma Constituinte não estava em sua proposta de campanha.
ZELAYA - O mecanismo não é importante, mas o objetivo. O objetivo de transformação é o que tem de valer. A Constituinte é um processo de mudança que surge do pedido do povo. O que faz um governante é escutar o seu povo. Não estava propondo uma Constituinte para o meu governo. A única coisa que propus é que era preciso escutar o povo. O povo enviou ao meu gabinete 500 mil assinaturas que diziam: "Queremos ser consultados". E estabelecemos um processo de consulta para ver a opinião pública. E isso foi o que provocou a ruptura e o golpe. Não temem a consulta. O que eles temem é que o povo se organize, que tenha voz, que possa tomar decisões. Isso lhes causa terror. Porque, se o povo começa a tomar decisões, é preciso haver justiça e igualdade.
FOLHA - Por que o sr. decidiu levar adiante a consulta de 28 de junho apesar da proibição da Justiça e do Congresso?
ZELAYA - Um juiz de segunda instância suspendeu um decreto feito pelo governo. Não declarou ilegal, mas suspendeu. O primeiro decreto se chamava "consulta popular". O Conselho de Ministros se reuniu e fez outro decreto, que não foi suspenso. Esse outro decreto se chama "pesquisa de opinião", não estava suspenso e não tinha nenhuma ilegalidade. Todo o resto é uma invenção da conspiração.
FOLHA - Um dos pontos mais criticados é a sua aliança com Hugo Chávez. Houve influência dele no processo constituinte e há alguma influência durante as negociações?
ZELAYA - O único país que realmente tem influência em Honduras são os EUA. O presidente Chávez não tem nenhuma influência em Honduras. Ele tem o reconhecimento hondurenho de sua liderança como democrata e como um presidente muito ativo na América Latina. É um preconceito querer converter os processos naturais de mudança em Honduras em processos ideológicos.
FOLHA - O Brasil suspendeu vários acordos após o golpe, entre os quais a cooperação em saúde. O sr. defende que as sanções incluam medidas em áreas sociais?
ZELAYA - A comunidade internacional está tomando medidas, mas são insuficientes. O povo está nas ruas resistindo, a comunidade internacional está pressionando, mas os golpistas são intransigentes.
FOLHA - No caso do Brasil, o sr. acha que governo pode fazer mais do que já anunciou?
ZELAYA - Até o momento, estamos atuando nos organismos multilaterais. Acho que devemos continuar chegando a um consenso. Com o governo brasileiro, estou muito satisfeito.
FOLHA - Com relação aos EUA, por que o sr. pediu o bloqueio das contas e bens dos envolvidos no golpe?
ZELAYA - A comunidade internacional, com esse golpe, deve ter a lição de que não bastam medidas diplomáticas, mas mecanismos efetivos que realmente os afetem, tais como medidas econômicas e restrições à sua circulação em diferentes países.
FOLHA - Como o sr. imagina que será lembrado na história?
FOLHA - A principal acusação contra o sr. é a de que queria a reeleição. Qual é sua posição sobre o tema?
ZELAYA - O governo não tem nenhuma possibilidade de fazer o processo de reeleição. É problema de uma Assembleia Constituinte que se estabeleça noutro governo, não no meu.
FOLHA - Mas o sr. não tem uma posição sobre a reeleição?
ZELAYA - Não tenho hoje nenhum interesse nisso. Acho que é um tema de discussão futura, não no meu governo.
FOLHA - O sr. foi eleito por um dos partidos mais tradicionais de Honduras, e a sua cúpula deixou de apoiá-lo e respalda o golpe. Quem mudou, o sr. ou o seu partido?
ZELAYA - Não há uma ruptura total com a cúpula, só parte dela. Há deputados e prefeitos que me apoiam; tenho 70% da base política. Ou seja, talvez seja um grupo de ultradireita conservadora que, com o tempo, se acomoda no poder.
FOLHA - Mas o sr. não mudou a sua ideologia, a forma de ver o país durante o mandato?
ZELAYA - Fui coerente com a minha campanha. A minha proposta tinha um slogan que se converteu em ideologia: o "poder cidadão". Dar poder ao cidadão para que ele seja protagonista do seu destino. A primeira lei que aprovei foi de participação cidadã, e o que estava fazendo agora é um processo de participação. Tenho sido coerente com as minhas posições.
FOLHA - Mas a convocação de uma Constituinte não estava em sua proposta de campanha.
ZELAYA - O mecanismo não é importante, mas o objetivo. O objetivo de transformação é o que tem de valer. A Constituinte é um processo de mudança que surge do pedido do povo. O que faz um governante é escutar o seu povo. Não estava propondo uma Constituinte para o meu governo. A única coisa que propus é que era preciso escutar o povo. O povo enviou ao meu gabinete 500 mil assinaturas que diziam: "Queremos ser consultados". E estabelecemos um processo de consulta para ver a opinião pública. E isso foi o que provocou a ruptura e o golpe. Não temem a consulta. O que eles temem é que o povo se organize, que tenha voz, que possa tomar decisões. Isso lhes causa terror. Porque, se o povo começa a tomar decisões, é preciso haver justiça e igualdade.
FOLHA - Por que o sr. decidiu levar adiante a consulta de 28 de junho apesar da proibição da Justiça e do Congresso?
ZELAYA - Um juiz de segunda instância suspendeu um decreto feito pelo governo. Não declarou ilegal, mas suspendeu. O primeiro decreto se chamava "consulta popular". O Conselho de Ministros se reuniu e fez outro decreto, que não foi suspenso. Esse outro decreto se chama "pesquisa de opinião", não estava suspenso e não tinha nenhuma ilegalidade. Todo o resto é uma invenção da conspiração.
FOLHA - Um dos pontos mais criticados é a sua aliança com Hugo Chávez. Houve influência dele no processo constituinte e há alguma influência durante as negociações?
ZELAYA - O único país que realmente tem influência em Honduras são os EUA. O presidente Chávez não tem nenhuma influência em Honduras. Ele tem o reconhecimento hondurenho de sua liderança como democrata e como um presidente muito ativo na América Latina. É um preconceito querer converter os processos naturais de mudança em Honduras em processos ideológicos.
FOLHA - O Brasil suspendeu vários acordos após o golpe, entre os quais a cooperação em saúde. O sr. defende que as sanções incluam medidas em áreas sociais?
ZELAYA - A comunidade internacional está tomando medidas, mas são insuficientes. O povo está nas ruas resistindo, a comunidade internacional está pressionando, mas os golpistas são intransigentes.
FOLHA - No caso do Brasil, o sr. acha que governo pode fazer mais do que já anunciou?
ZELAYA - Até o momento, estamos atuando nos organismos multilaterais. Acho que devemos continuar chegando a um consenso. Com o governo brasileiro, estou muito satisfeito.
FOLHA - Com relação aos EUA, por que o sr. pediu o bloqueio das contas e bens dos envolvidos no golpe?
ZELAYA - A comunidade internacional, com esse golpe, deve ter a lição de que não bastam medidas diplomáticas, mas mecanismos efetivos que realmente os afetem, tais como medidas econômicas e restrições à sua circulação em diferentes países.
FOLHA - Como o sr. imagina que será lembrado na história?
ZELAYA - Como quem luta por causas justas e não aceitou a submissão e a imposição.
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