Algumas imagens falam mais que mil palavras. A foto de Lula e Collor em Palmeira dos Índios, Alagoas, é tão expressiva que não precisaria de legenda. Olho no olho, sorriso autêntico de afeto, abraço forte e cúmplice sem constrangimento. Não foi uma foto posada ou armada. Era o lançamento da obra de uma adutora, do PAC. Sem necessidade, Lula reforçou o gesto com palavras: “Quero fazer justiça aos senadores Fernando Collor e Renan Calheiros, que têm dado uma sustentação muito grande aos trabalhos do governo no Senado”.
Mesmo que a memória do Brasil seja curta, mesmo que você não tenha pintado a cara de verde e amarelo e saído às ruas em 1992 para pedir o impeachment do presidente Collor por corrupção, esse momento histórico está impresso na retina dos brasileiros. Houve um surto de patriotismo ético. O país apeara do poder o falso caçador de marajás, o defensor ilusório dos descamisados. Um populista de direita que tinha construído jardins babilônicos em sua residência em Brasília, com cinco cachoeiras acionadas por mecanismo eletrônico. Algo comparável, em cafonice e megalomania, ao castelo do deputado mineiro Edmar Moreira, o bom companheiro avesso a julgamentos entre iguais.
Collor já tinha envergonhado a nação em 1989, na campanha para a Presidência, ao aplicar golpe baixo no adversário do PT, Luiz Inácio Lula da Silva. Exibira na televisão o depoimento de Miriam Cordeiro, ex-namorada de Lula, acusando-o de pressão para abortar a filha dos dois.
Mesmo depois da eleição e do impeachment de Collor, Lula foi implacável – e com muita propriedade. Em 1994, quando Collor foi absolvido pelo STF, o petista disse: “Como cidadão brasileiro que tanto lutou para fazer a ética prevalecer na política, estou frustrado, possivelmente como milhões de brasileiros. Só espero que não apareça um trambiqueiro querendo anistiar Collor da condenação imposta pelo Senado”. A condenação era a inelegibilidade por oito anos.
Foi autêntico o abraço afetuoso de Lula e Collor. A palavra “ética” sumiu dos discursos do presidente
A palavra “ética” sumiu do discurso de Lula. Hoje, seus compadres e amigos pertencem às oligarquias que combateu como inimigas do povo.
O comício da semana aconteceu num estádio de futebol para 500 sem- -terra, agricultores, funcionários públicos, donas de casa, prefeitos e políticos de Alagoas. Dilma Rousseff, no palanque, exaltou a origem nordestina de Lula. Lula comparou Collor a Juscelino Kubitschek. Um jornal distribuído no evento deu manchete com o apoio de Lula ao candidato Collor.
Houve gente que sentiu nojo. Petistas se sentiram traídos e se perguntaram até onde Lula pode ir em nome da tal governabilidade. Mas é tudo tática. O rol de notícias da semana nos faz crer que assistimos a um gigantesco Casseta & planeta.
Edmar Moreira foi absolvido. O filho de Sarney, Fernando, foi indiciado por desvio e formação de quadrilha. A filha, Roseana, pagou R$ 4,3 milhões – de verba pública – por uma exposição do banqueiro amigo Edemar Cid Ferreira. O governo Lula assumiu o comando da CPI da Petrobras. E, de quebra, o Conselho de Ética do Senado, que blindará Sarney. O novo presidente do Conselho, indicado por Renan Calheiros, é o peemedebista Paulo Duque, de 81 anos: “Será que Renan me escolheu por meus olhos azuis?” Duque não teme cobranças e diz não dar muita importância à opinião pública, porque “ela é muito volúvel”.
Lula provocou os senadores da oposição: “São bons pizzaiolos”. A categoria dos pizzaiolos profissionais reagiu irada: “Não roubamos dinheiro público”.
Com o forno quente na cozinha da Casa-grande, é compreensível o alívio de Sarney diante do recesso: “Graças a Deus”. Será que o presidente do Senado vai interromper nas férias sua coluna na Folha de S.Paulo? Seria uma pena. A última foi sobre “a guerra de titãs entre Windows e Google”. Sarney se espanta com os chips e a teia de aranha virtual. E saúda como “um milagre” o Google Earth, “com sua capacidade de mostrar na tela a casa de todo mundo no mundo, inclusive a minha”. Aquela de R$ 4 milhões em Brasília também, senador? Encerra seu artigo com a máxima: “Aos vencedores, as batatas”. Seria melhor “aos vencedores, a pizza”. De lulla.
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