DEU EM O GLOBO
O historiador americano Henry Brook Adams cunhou a definição de prática política como sendo a arte de "ignorar fatos". O presidente Lula, provavelmente por intuição, há muito tempo adota esse comportamento, e parece cada vez mais convicto de que sua popularidade inabalável o protegerá até mesmo da sua própria língua. Já se dá ao desplante de falar palavrões em comício e, modestamente, garante que a Conferência do Clima em Copenhague ganhou nova dimensão depois que o Brasil saiu na frente dos países desenvolvidos e anunciou metas de redução das emissões de carbono na atmosfera.
Como a revista inglesa "The Economist" previu, parece que o pecado da "hubris" - que na mitologia grega representa o excesso, a arrogância - está tomando conta do "filho do Brasil".
O problema climático não constava da pauta de prioridades do governo Lula, e só passou a fazer parte dela quando a senadora Marina Silva colocou-o na agenda da sucessão presidencial, ela mesma saída do Ministério do Meio Ambiente por absoluta impossibilidade de fazer com que a questão ambiental fosse uma política de governo.
Colocada lá ainda no primeiro ministério, Marina não aceitou ser apenas um símbolo, depois de diversas derrotas na tentativa de impor uma agenda ecológica ao governo.
Lula fazia blague com a proteção dos "bagrinhos" e, mais que isso, ele e a candidata oficial à sua sucessão, ministra Dilma Rousseff, consideravam que os ambientalistas atrasavam as obras do PAC e o progresso do país.
Até o último momento o governo hesitou em fixar metas para a redução do efeito estufa, e o "compromisso voluntário" só saiu a muito custo. Pois agora Lula arvora-se a ecologista pioneiro, em mais um ato explícito de oportunismo político.
Não foi outro o espírito da legislação que enviou ao Congresso supostamente para combater a corrupção no país. Transformar em hediondo os crimes de corrupção não fará diferença alguma se a postura dos governantes continuar sendo de leniência com os corruptos, e a Justiça não os colocar na cadeia.
O Lula que discursou sobre os males da corrupção, afirmando num ato falho que os que mais gritam contra ela geralmente são os mais corruptos, é o mesmo Lula que durante mais de 20 anos perambulou pelo país com a bandeira da corrupção como sua principal arma eleitoral.
Chegou a afirmar que a chegada do PT ao poder central reduziria de imediato a corrupção. Sabe-se hoje que o PT, enquanto se colocava como exemplo de moral e bons costumes, fazia uma política corrupta nas prefeituras para as quais elegia seus filiados, montando um esquema de caixa dois que financiaria as diversas campanhas presidenciais do próprio Lula.
Quando estourou o escândalo do mensalão, em 2005, o ponto mais dramático foi o depoimento do marqueteiro Duda Mendonça na CPI da Câmara, na qual confessou que seu trabalho na campanha eleitoral de Lula em 2002 foi pago em parte com dinheiro ilegal depositado no exterior.
Um depoimento que ligava diretamente o candidato à corrupção de sua campanha eleitoral, da mesma maneira que a formação do caixa dois na campanha para o governo de Minas de 1998 levou o hoje senador Eduardo Azeredo a ser incluído no processo aberto pelo Supremo Tribunal Federal.
Lula livrou-se do processo do Supremo sobre o mensalão, que identificou uma "quadrilha" atuando a partir do gabinete do então ministro José Dirceu no Palácio do Planalto, por um detalhe político: a oposição ficou com receio de pedir seu "impeachment", ou pelo menos de tentar ouvi-lo na CPI.
Mas, para quem não tem memória curta, é uma ousadia, que talvez só a "hubris" explique, Lula encher a boca para falar em combate à corrupção.
Sua tentativa de tirar proveito político da acusação contra o governador José Roberto Arruda, de Brasília, que é do DEM, quando se portou de maneira leniente e conivente com os políticos de sua base congressual acusados de participar do mensalão, é um sinal dos tempos em que, incentivados pela impunidade, todos fazem como ele, falam uma coisa e fazem outra, na certeza de que o cidadão comum perdeu o discernimento do que é certo e errado. É assim que os chamados "movimentos sociais", os mesmos que ameaçavam sair às ruas não para protestar contra o mensalão, mas para defender o mandato de Lula, agora estão nas ruas de Brasília contra o mensalão do DEM.
Não se mobilizaram também contra Renan Calheiros nem contra José Sarney, apadrinhados de Lula, mas estão indignados com Arruda.
O sinal trocado dos tempos também faz com que o governador do Distrito Federal, apanhado com a boca na botija com direito a vídeo e áudio, ainda tenha forças para reprimir as manifestações contra ele.
E se sinta em condições políticas de tentar se manter à frente do governo, apoiado por uma maioria de deputados distritais envolvidos nas mesmas tenebrosas transações, todos flagrados em vídeo. E ainda falando em mudar "os hábitos políticos".
Quando prenderam aquele petista com dólares na cueca, não houve imagens. Desta vez, temos imagens e som de deputados e jornalista colocando bolos de Real na cueca, nas meias, nos bolsos. E estão todos soltos.
Ao mesmo tempo em que o presidente Lula se mostra indignado seletivamente com a corrupção dos outros, o PT faz uma festa para seus ex-presidentes e consuma a reabilitação de todos os mensaleiros, a começar pelo que está sendo julgado pelo Supremo como o "chefe da quadrilha", o ex-ministro José Dirceu, identificado como figura "imprescindível" na campanha presidencial de Dilma Rousseff.
Que, por sinal, deu entrevistas classificando de "chocantes" as imagens do mensalão do DEM para, em seguida, confraternizar com os mensaleiros do PT.
O historiador americano Henry Brook Adams cunhou a definição de prática política como sendo a arte de "ignorar fatos". O presidente Lula, provavelmente por intuição, há muito tempo adota esse comportamento, e parece cada vez mais convicto de que sua popularidade inabalável o protegerá até mesmo da sua própria língua. Já se dá ao desplante de falar palavrões em comício e, modestamente, garante que a Conferência do Clima em Copenhague ganhou nova dimensão depois que o Brasil saiu na frente dos países desenvolvidos e anunciou metas de redução das emissões de carbono na atmosfera.
Como a revista inglesa "The Economist" previu, parece que o pecado da "hubris" - que na mitologia grega representa o excesso, a arrogância - está tomando conta do "filho do Brasil".
O problema climático não constava da pauta de prioridades do governo Lula, e só passou a fazer parte dela quando a senadora Marina Silva colocou-o na agenda da sucessão presidencial, ela mesma saída do Ministério do Meio Ambiente por absoluta impossibilidade de fazer com que a questão ambiental fosse uma política de governo.
Colocada lá ainda no primeiro ministério, Marina não aceitou ser apenas um símbolo, depois de diversas derrotas na tentativa de impor uma agenda ecológica ao governo.
Lula fazia blague com a proteção dos "bagrinhos" e, mais que isso, ele e a candidata oficial à sua sucessão, ministra Dilma Rousseff, consideravam que os ambientalistas atrasavam as obras do PAC e o progresso do país.
Até o último momento o governo hesitou em fixar metas para a redução do efeito estufa, e o "compromisso voluntário" só saiu a muito custo. Pois agora Lula arvora-se a ecologista pioneiro, em mais um ato explícito de oportunismo político.
Não foi outro o espírito da legislação que enviou ao Congresso supostamente para combater a corrupção no país. Transformar em hediondo os crimes de corrupção não fará diferença alguma se a postura dos governantes continuar sendo de leniência com os corruptos, e a Justiça não os colocar na cadeia.
O Lula que discursou sobre os males da corrupção, afirmando num ato falho que os que mais gritam contra ela geralmente são os mais corruptos, é o mesmo Lula que durante mais de 20 anos perambulou pelo país com a bandeira da corrupção como sua principal arma eleitoral.
Chegou a afirmar que a chegada do PT ao poder central reduziria de imediato a corrupção. Sabe-se hoje que o PT, enquanto se colocava como exemplo de moral e bons costumes, fazia uma política corrupta nas prefeituras para as quais elegia seus filiados, montando um esquema de caixa dois que financiaria as diversas campanhas presidenciais do próprio Lula.
Quando estourou o escândalo do mensalão, em 2005, o ponto mais dramático foi o depoimento do marqueteiro Duda Mendonça na CPI da Câmara, na qual confessou que seu trabalho na campanha eleitoral de Lula em 2002 foi pago em parte com dinheiro ilegal depositado no exterior.
Um depoimento que ligava diretamente o candidato à corrupção de sua campanha eleitoral, da mesma maneira que a formação do caixa dois na campanha para o governo de Minas de 1998 levou o hoje senador Eduardo Azeredo a ser incluído no processo aberto pelo Supremo Tribunal Federal.
Lula livrou-se do processo do Supremo sobre o mensalão, que identificou uma "quadrilha" atuando a partir do gabinete do então ministro José Dirceu no Palácio do Planalto, por um detalhe político: a oposição ficou com receio de pedir seu "impeachment", ou pelo menos de tentar ouvi-lo na CPI.
Mas, para quem não tem memória curta, é uma ousadia, que talvez só a "hubris" explique, Lula encher a boca para falar em combate à corrupção.
Sua tentativa de tirar proveito político da acusação contra o governador José Roberto Arruda, de Brasília, que é do DEM, quando se portou de maneira leniente e conivente com os políticos de sua base congressual acusados de participar do mensalão, é um sinal dos tempos em que, incentivados pela impunidade, todos fazem como ele, falam uma coisa e fazem outra, na certeza de que o cidadão comum perdeu o discernimento do que é certo e errado. É assim que os chamados "movimentos sociais", os mesmos que ameaçavam sair às ruas não para protestar contra o mensalão, mas para defender o mandato de Lula, agora estão nas ruas de Brasília contra o mensalão do DEM.
Não se mobilizaram também contra Renan Calheiros nem contra José Sarney, apadrinhados de Lula, mas estão indignados com Arruda.
O sinal trocado dos tempos também faz com que o governador do Distrito Federal, apanhado com a boca na botija com direito a vídeo e áudio, ainda tenha forças para reprimir as manifestações contra ele.
E se sinta em condições políticas de tentar se manter à frente do governo, apoiado por uma maioria de deputados distritais envolvidos nas mesmas tenebrosas transações, todos flagrados em vídeo. E ainda falando em mudar "os hábitos políticos".
Quando prenderam aquele petista com dólares na cueca, não houve imagens. Desta vez, temos imagens e som de deputados e jornalista colocando bolos de Real na cueca, nas meias, nos bolsos. E estão todos soltos.
Ao mesmo tempo em que o presidente Lula se mostra indignado seletivamente com a corrupção dos outros, o PT faz uma festa para seus ex-presidentes e consuma a reabilitação de todos os mensaleiros, a começar pelo que está sendo julgado pelo Supremo como o "chefe da quadrilha", o ex-ministro José Dirceu, identificado como figura "imprescindível" na campanha presidencial de Dilma Rousseff.
Que, por sinal, deu entrevistas classificando de "chocantes" as imagens do mensalão do DEM para, em seguida, confraternizar com os mensaleiros do PT.
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