DEU NO VALOR ECONÔMICO
Não há como não ser repetitivo no Brasil pois cometemos os mesmos erros repetidamente. Entramos novamente na armadilha que bloqueia a transição da economia brasileira para um processo de crescimento mais acelerado e estável. Antes da taxa de investimento chegar à casa dos 20% do PIB, para poder acelerar o crescimento do PIB potencial, surge a ameaça de inflação e do déficit excessivo nas transações correntes. Daí, ao invés de contermos os gastos correntes do governo aumentamos a taxa de juros. Aí está o erro. A inflação pode ser contida, em grande parte em função da apreciação da taxa de câmbio, mas o déficit em transações corrente dispara anunciando dificuldades ou crise no médio prazo. Se as autoridades decidirem evitar antecipadamente a crise terão que frear ainda mais o crescimento e depreciar a taxa de câmbio.
Vivenciamos esse erro de 1995 a 1999 e tivemos a crise cambial. Novamente em 2008, enquanto o Banco Central aumentava a taxa de juros a partir do mês de abril, o governo praticava política fiscal fortemente expansionista. Nesse caso o script final mudou por que fomos atropelados no último trimestre pela forte contração de crédito pelos bancos brasileiros em função do pânico gerado nos Estados Unidos com a quebra do Lehman " s Brothers. Este ano, mal iniciamos a recuperação dos investimentos o Banco Central novamente iniciou a elevação da taxa de juros em função do aumento da expectativa de inflação. A política fiscal expansionista plenamente justificável no final de 2008 e primeiro semestre de 2009, pois foi uma ação contracíclica, não se justifica há muito tempo. Deveríamos ter uma coordenação entre a política fiscal e monetária de forma que neste ano a política fiscal deveria ser contracionista para conter o excesso de demanda e conter tanto déficit em transações correntes quando eliminar a ameaça de inflação. Nesse caso a política monetária poderia ser passiva de forma a não bloquear o aumento na taxa de investimento. Assim a expansão do produto potencial decorrente poderia acompanhar o crescimento da demanda agregada, mais moderada em função da política fiscal contracionista.
O efeito perverso da atual elevação da taxa de juros é que ao atrair fluxo de capitais do exterior e gerar novas pressões para apreciar a taxa de câmbio, agrava ainda mais o crescente déficit em transações corrente. Basta lembrar que o volume de importações cresceram 41,5% até maio deste ano, comparado ao mesmo período de 2009. Neste mesmo período o volume de importações de bens duráveis aumentou 77,1%.
É verdade que temos hoje quase US$ 250 bilhões de reservas cambiais, mas o estoque de ativos líquidos no Brasil é muito maior de forma que uma vez instalada a desconfiança de que a taxa de câmbio deverá depreciar, a probabilidade de interrompe-las será muito pequena. Só os recursos aplicados no overnight e nas operações com compromisso de recompra pelo Banco Central podem esgotar com as reservas cambiais. Pior, como nesses casos há sempre um "overshooting" o impacto sobre a taxa de câmbio deverá ser desnecessariamente forte.
O resultado desse processo é um crescimento médio moderado com fortes instabilidades tanto no produto como na taxa de inflação, na melhor das hipóteses. No longo prazo deverá resultar num crescimento medíocre quando finalmente a economia brasileira adquirir dinamismo e puder voltar a crescer aceleradamente como fizemos de 1940 a 1980 quando crescemos uma média anual de 7%. Para perceber as nossas possibilidades basta lembrar que apesar da taxa de câmbio apreciada, a indústria de transformação voltou a liderar o crescimento alimentada por um crescimento doméstico da demanda, por sua vez sustentada pelo aumento da massa real de salário que deverá ser superior a 5,5% este ano. É fundamental lembrar que este aumento vem acompanhado de aumento maior da produtividade do trabalho de forma que o custo unitário do trabalho está caindo. Portanto, a redução do desemprego e o aumento de salário real não exercem pressão inflacionária.
Como este é um ano eleitoral a questão fica para o próximo presidente: se quisermos transitar para um crescimento mais acelerado e estável não há outra saída senão reduzir relativamente ao PIB a despesa corrente do governo de forma a abrir espaço no PIB para que a taxa de investimento aumente para mais do que 25% do PIB. Isso não significa que a despesa corrente tenha que ser reduzida em termos absolutos, ela tem que crescer menos do que o PIB ao longo de anos. Não há outra opção pois a soma dos componentes da demanda agregada não pode ser maior do que o PIB. Para ampliar o investimento privado concomitantemente com a redução da despesa, a carga tributária terá que ser reduzida devolvendo renda a este setor. Nesse processo o déficit público deverá ser eliminado de forma que a taxa de juros possa convergir para níveis internacionais e a taxa de câmbio possa ser mantida mais competitiva. Essa transição para o crescimento mais rápido pode ser feito ao longo do primeiro mandato e o próximo Presidente ser reeleito, ou mais lentamente, com redução da probabilidade de ser reeleito.
Yoshiaki Nakano, ex-secretário da Fazenda do governo Mário Covas (SP), professor e diretor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas - FGV/EESP.
Não há como não ser repetitivo no Brasil pois cometemos os mesmos erros repetidamente. Entramos novamente na armadilha que bloqueia a transição da economia brasileira para um processo de crescimento mais acelerado e estável. Antes da taxa de investimento chegar à casa dos 20% do PIB, para poder acelerar o crescimento do PIB potencial, surge a ameaça de inflação e do déficit excessivo nas transações correntes. Daí, ao invés de contermos os gastos correntes do governo aumentamos a taxa de juros. Aí está o erro. A inflação pode ser contida, em grande parte em função da apreciação da taxa de câmbio, mas o déficit em transações corrente dispara anunciando dificuldades ou crise no médio prazo. Se as autoridades decidirem evitar antecipadamente a crise terão que frear ainda mais o crescimento e depreciar a taxa de câmbio.
Vivenciamos esse erro de 1995 a 1999 e tivemos a crise cambial. Novamente em 2008, enquanto o Banco Central aumentava a taxa de juros a partir do mês de abril, o governo praticava política fiscal fortemente expansionista. Nesse caso o script final mudou por que fomos atropelados no último trimestre pela forte contração de crédito pelos bancos brasileiros em função do pânico gerado nos Estados Unidos com a quebra do Lehman " s Brothers. Este ano, mal iniciamos a recuperação dos investimentos o Banco Central novamente iniciou a elevação da taxa de juros em função do aumento da expectativa de inflação. A política fiscal expansionista plenamente justificável no final de 2008 e primeiro semestre de 2009, pois foi uma ação contracíclica, não se justifica há muito tempo. Deveríamos ter uma coordenação entre a política fiscal e monetária de forma que neste ano a política fiscal deveria ser contracionista para conter o excesso de demanda e conter tanto déficit em transações correntes quando eliminar a ameaça de inflação. Nesse caso a política monetária poderia ser passiva de forma a não bloquear o aumento na taxa de investimento. Assim a expansão do produto potencial decorrente poderia acompanhar o crescimento da demanda agregada, mais moderada em função da política fiscal contracionista.
O efeito perverso da atual elevação da taxa de juros é que ao atrair fluxo de capitais do exterior e gerar novas pressões para apreciar a taxa de câmbio, agrava ainda mais o crescente déficit em transações corrente. Basta lembrar que o volume de importações cresceram 41,5% até maio deste ano, comparado ao mesmo período de 2009. Neste mesmo período o volume de importações de bens duráveis aumentou 77,1%.
É verdade que temos hoje quase US$ 250 bilhões de reservas cambiais, mas o estoque de ativos líquidos no Brasil é muito maior de forma que uma vez instalada a desconfiança de que a taxa de câmbio deverá depreciar, a probabilidade de interrompe-las será muito pequena. Só os recursos aplicados no overnight e nas operações com compromisso de recompra pelo Banco Central podem esgotar com as reservas cambiais. Pior, como nesses casos há sempre um "overshooting" o impacto sobre a taxa de câmbio deverá ser desnecessariamente forte.
O resultado desse processo é um crescimento médio moderado com fortes instabilidades tanto no produto como na taxa de inflação, na melhor das hipóteses. No longo prazo deverá resultar num crescimento medíocre quando finalmente a economia brasileira adquirir dinamismo e puder voltar a crescer aceleradamente como fizemos de 1940 a 1980 quando crescemos uma média anual de 7%. Para perceber as nossas possibilidades basta lembrar que apesar da taxa de câmbio apreciada, a indústria de transformação voltou a liderar o crescimento alimentada por um crescimento doméstico da demanda, por sua vez sustentada pelo aumento da massa real de salário que deverá ser superior a 5,5% este ano. É fundamental lembrar que este aumento vem acompanhado de aumento maior da produtividade do trabalho de forma que o custo unitário do trabalho está caindo. Portanto, a redução do desemprego e o aumento de salário real não exercem pressão inflacionária.
Como este é um ano eleitoral a questão fica para o próximo presidente: se quisermos transitar para um crescimento mais acelerado e estável não há outra saída senão reduzir relativamente ao PIB a despesa corrente do governo de forma a abrir espaço no PIB para que a taxa de investimento aumente para mais do que 25% do PIB. Isso não significa que a despesa corrente tenha que ser reduzida em termos absolutos, ela tem que crescer menos do que o PIB ao longo de anos. Não há outra opção pois a soma dos componentes da demanda agregada não pode ser maior do que o PIB. Para ampliar o investimento privado concomitantemente com a redução da despesa, a carga tributária terá que ser reduzida devolvendo renda a este setor. Nesse processo o déficit público deverá ser eliminado de forma que a taxa de juros possa convergir para níveis internacionais e a taxa de câmbio possa ser mantida mais competitiva. Essa transição para o crescimento mais rápido pode ser feito ao longo do primeiro mandato e o próximo Presidente ser reeleito, ou mais lentamente, com redução da probabilidade de ser reeleito.
Yoshiaki Nakano, ex-secretário da Fazenda do governo Mário Covas (SP), professor e diretor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas - FGV/EESP.
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