DEU NO VALOR ECONÔMICO
Leandra Peres Para o Valor, de Washington
A derrota do presidente Barack Obama nas eleições para o Congresso e o crescimento do movimento conservador Tea Party nada têm a ver com um suposto fracasso das políticas keynesianas, diz o professor James Galbraith, da Universidade do Texas. "O erro do governo Obama foi ter salvado os bancos e acreditar que eles iriam salvar o país", diz Galbraith - filho de John Kenneth Galbraith (1908-2006) e, como o pai, seguidor do pensamento de John Maynard Keynes.
No início do governo, Obama socorreu a economia com um programa de US$ 800 bilhões em gastos federais, mas mesmo assim a taxa de desemprego continuou alta, e se mantém em torno de 9,6%, o que frustrou os eleitores americanos. A bancada do Partido Democrata foi drasticamente reduzida e os republicanos se elegeram prometendo cortes de gastos e de impostos.
Galbraith acredita que a recente decisão do Federal Reserve (o banco central americano) de injetar US$ 600 bilhões no sistema financeiro até meados de 2011, mediante compra mensal de títulos públicos em poder dos bancos, para a retomada do crescimento, não terá efeito relevante, além de ser uma solução "muito arriscada". Ele acha possível que os Estados Unidos passem por uma década de estagnação e defende soluções como a redução da idade de aposentadoria. A seguir, a entrevista que Galbraith concedeu ao Valor.
Valor: A derrota de Obama nas eleições representa uma rejeição às políticas econômicas keynesianas
James Galbraith: Não acho que tenha nada a ver com Keynes. O erro do governo Obama foi ter salvado os bancos e acreditar que eles iriam salvar o país. Isso não aconteceu. Durante um período, os bancos anunciaram lucros altos, bônus foram pagos e fraudes ficaram sem investigação. E todo mundo se perguntava: "Cadê o meu emprego?" Se queriam tomar um empréstimo, não era possível, porque os bancos não estavam emprestando. Isso leva ao repúdio a qualquer governo.
Valor: Qual seria a alternativa para as políticas de Obama?
Galbraith: Compare com o governo brasileiro. Quando o presidente Lula tomou posse, anunciou medidas claramente ortodoxas, até mais do que o esperado, e baixou as expectativas da população. Depois, as pessoas se impressionaram com a diminuição da pobreza, ampliação da classe média etc. O governo Obama fez exatamente o contrário. Tomou posse dizendo que os problemas econômicos seriam resolvidos e implementou uma política inadequada. Obama foi eleito com o slogan de acreditar na mudança e do ponto de vista da política econômica é um governo tão dominado por banqueiros quanto o governo Bush. Ou até mais.
Valor: Os bancos não deveriam ter sido socorridos?
Galbraith: Os bancos estavam falidos. A lei determina, e ela é aplicada rotineiramente no caso de bancos menores, que se feche a instituição. Poderiam ter feito isso, mas preferiram fingir que os bancos estavam em situação sólida.
Valor: Se os grandes bancos tivessem quebrado, a economia estaria melhor?
Galbraith: Estaríamos agora numa situação diferente. As expectativas seriam diferentes desde o começo. As pessoas teriam visto o novo presidente reconhecer que a situação era muito, muito ruim e qualquer melhora seria vista como positiva e não como uma recuperação inadequada ou insuficiente.
Valor: O pacote de US$ 600 bilhões em estímulo monetário anunciado pelo Fed vai resolver?
Galbraith: Haverá pouquíssimo efeito prático. Se muito, algum impacto sobre o valor do dólar, o que é uma solução muito arriscada para buscar a retomada do crescimento. Não que seja necessária uma dose maior do que já vem sendo feito. Na minha opinião, as medidas são mal concebidas.
Valor: Por que a desvalorização do dólar seria arriscada?
Galbraith: É um jogo de soma zero. Se os Estados Unidos desvalorizam o dólar, os europeus, por exemplo, se sentirão ameaçados e podem fazer o mesmo. Além do mais, o comércio mundial é feito em dólares e se você começa a mexer com o valor da moeda pode ter um impacto desestabilizador.
Valor: É possível uma solução para a guerra de moedas no G-20?
Galbraith: Não há a menor esperança. Os europeus participam do G-20 pró-forma. Estão claramente mais preocupados com seus problemas internos. Fala-se da China, mas o país não vai adotar uma política mais expansionista. E, se fizesse isso, o efeito no mundo seria um aumento do preço das commodities, já que a China importa petróleo, trigo e não manufaturados. Me parece meio louco dizer que isso esse seria bom para a economia americana. Seria positivo para a América Latina.
Valor: A adoção de controles ao fluxo de capitais se justifica nesse contexto?
Galbraith: Qualquer país com alguma sensibilidade vai se proteger desses movimentos de capital.
Valor: Há risco de uma dupla recessão?
Galbraith: Acho pouco provável. Os problemas de verdade são estagnação, incapacidade de reduzir o desemprego e uma redução contínua da classe média.
Valor: Teremos uma década de crescimento baixo e desemprego elevado nos Estados como no Japão dos anos 90?
Galbraith: Sim.Mesmo que o país volte a criar empregos agora, os primeiros a voltar para o mercado de trabalho serão os mais jovens. Uma geração inteira será submetidas a uma década de dificuldades.
Valor: O que pode ser feito para acelerar esse ajuste?
Galbraith: Proponho reduzir a idade para a aposentadoria integral, de 65 para 62 anos, ao longo de um período de, digamos, três anos. As pessoas acima dessa idade sairiam do mercado de trabalho, teriam uma renda garantida e estariam gerando demanda por uma série de serviços. Nessa transição, os postos de trabalho que ficassem vagos seriam ocupados por trabalhadores mais novos.
Valor: Como essa conta seria paga?
Galbraith: Assinando um cheque. Nós somos os Estados Unidos, assinamos cheques. O país também deixaria de pagar o auxílio-desemprego, para pagar uma aposentadoria.
Valor: Por que o estímulo monetário não está funcionando?
Galbraith: Quando você se pergunta porque as empresas americanas estão sentadas em cima de US$ 1 trilhão, a única resposta é que estão igualmente com medo de deflação como de inflação. Se há receio de deflação, as pessoas ficam com dinheiro em caixa. Os preços vão cair e todo mundo que tiver moeda estará mais rico. Então, a economia para. O mercado imobiliário para, porque, com o preço das casas caindo, você pode esperar três semanas e comprar o mesmo imóvel pagando menos. Isso está claramente acontecendo..
Leandra Peres Para o Valor, de Washington
A derrota do presidente Barack Obama nas eleições para o Congresso e o crescimento do movimento conservador Tea Party nada têm a ver com um suposto fracasso das políticas keynesianas, diz o professor James Galbraith, da Universidade do Texas. "O erro do governo Obama foi ter salvado os bancos e acreditar que eles iriam salvar o país", diz Galbraith - filho de John Kenneth Galbraith (1908-2006) e, como o pai, seguidor do pensamento de John Maynard Keynes.
No início do governo, Obama socorreu a economia com um programa de US$ 800 bilhões em gastos federais, mas mesmo assim a taxa de desemprego continuou alta, e se mantém em torno de 9,6%, o que frustrou os eleitores americanos. A bancada do Partido Democrata foi drasticamente reduzida e os republicanos se elegeram prometendo cortes de gastos e de impostos.
Galbraith acredita que a recente decisão do Federal Reserve (o banco central americano) de injetar US$ 600 bilhões no sistema financeiro até meados de 2011, mediante compra mensal de títulos públicos em poder dos bancos, para a retomada do crescimento, não terá efeito relevante, além de ser uma solução "muito arriscada". Ele acha possível que os Estados Unidos passem por uma década de estagnação e defende soluções como a redução da idade de aposentadoria. A seguir, a entrevista que Galbraith concedeu ao Valor.
Valor: A derrota de Obama nas eleições representa uma rejeição às políticas econômicas keynesianas
James Galbraith: Não acho que tenha nada a ver com Keynes. O erro do governo Obama foi ter salvado os bancos e acreditar que eles iriam salvar o país. Isso não aconteceu. Durante um período, os bancos anunciaram lucros altos, bônus foram pagos e fraudes ficaram sem investigação. E todo mundo se perguntava: "Cadê o meu emprego?" Se queriam tomar um empréstimo, não era possível, porque os bancos não estavam emprestando. Isso leva ao repúdio a qualquer governo.
Valor: Qual seria a alternativa para as políticas de Obama?
Galbraith: Compare com o governo brasileiro. Quando o presidente Lula tomou posse, anunciou medidas claramente ortodoxas, até mais do que o esperado, e baixou as expectativas da população. Depois, as pessoas se impressionaram com a diminuição da pobreza, ampliação da classe média etc. O governo Obama fez exatamente o contrário. Tomou posse dizendo que os problemas econômicos seriam resolvidos e implementou uma política inadequada. Obama foi eleito com o slogan de acreditar na mudança e do ponto de vista da política econômica é um governo tão dominado por banqueiros quanto o governo Bush. Ou até mais.
Valor: Os bancos não deveriam ter sido socorridos?
Galbraith: Os bancos estavam falidos. A lei determina, e ela é aplicada rotineiramente no caso de bancos menores, que se feche a instituição. Poderiam ter feito isso, mas preferiram fingir que os bancos estavam em situação sólida.
Valor: Se os grandes bancos tivessem quebrado, a economia estaria melhor?
Galbraith: Estaríamos agora numa situação diferente. As expectativas seriam diferentes desde o começo. As pessoas teriam visto o novo presidente reconhecer que a situação era muito, muito ruim e qualquer melhora seria vista como positiva e não como uma recuperação inadequada ou insuficiente.
Valor: O pacote de US$ 600 bilhões em estímulo monetário anunciado pelo Fed vai resolver?
Galbraith: Haverá pouquíssimo efeito prático. Se muito, algum impacto sobre o valor do dólar, o que é uma solução muito arriscada para buscar a retomada do crescimento. Não que seja necessária uma dose maior do que já vem sendo feito. Na minha opinião, as medidas são mal concebidas.
Valor: Por que a desvalorização do dólar seria arriscada?
Galbraith: É um jogo de soma zero. Se os Estados Unidos desvalorizam o dólar, os europeus, por exemplo, se sentirão ameaçados e podem fazer o mesmo. Além do mais, o comércio mundial é feito em dólares e se você começa a mexer com o valor da moeda pode ter um impacto desestabilizador.
Valor: É possível uma solução para a guerra de moedas no G-20?
Galbraith: Não há a menor esperança. Os europeus participam do G-20 pró-forma. Estão claramente mais preocupados com seus problemas internos. Fala-se da China, mas o país não vai adotar uma política mais expansionista. E, se fizesse isso, o efeito no mundo seria um aumento do preço das commodities, já que a China importa petróleo, trigo e não manufaturados. Me parece meio louco dizer que isso esse seria bom para a economia americana. Seria positivo para a América Latina.
Valor: A adoção de controles ao fluxo de capitais se justifica nesse contexto?
Galbraith: Qualquer país com alguma sensibilidade vai se proteger desses movimentos de capital.
Valor: Há risco de uma dupla recessão?
Galbraith: Acho pouco provável. Os problemas de verdade são estagnação, incapacidade de reduzir o desemprego e uma redução contínua da classe média.
Valor: Teremos uma década de crescimento baixo e desemprego elevado nos Estados como no Japão dos anos 90?
Galbraith: Sim.Mesmo que o país volte a criar empregos agora, os primeiros a voltar para o mercado de trabalho serão os mais jovens. Uma geração inteira será submetidas a uma década de dificuldades.
Valor: O que pode ser feito para acelerar esse ajuste?
Galbraith: Proponho reduzir a idade para a aposentadoria integral, de 65 para 62 anos, ao longo de um período de, digamos, três anos. As pessoas acima dessa idade sairiam do mercado de trabalho, teriam uma renda garantida e estariam gerando demanda por uma série de serviços. Nessa transição, os postos de trabalho que ficassem vagos seriam ocupados por trabalhadores mais novos.
Valor: Como essa conta seria paga?
Galbraith: Assinando um cheque. Nós somos os Estados Unidos, assinamos cheques. O país também deixaria de pagar o auxílio-desemprego, para pagar uma aposentadoria.
Valor: Por que o estímulo monetário não está funcionando?
Galbraith: Quando você se pergunta porque as empresas americanas estão sentadas em cima de US$ 1 trilhão, a única resposta é que estão igualmente com medo de deflação como de inflação. Se há receio de deflação, as pessoas ficam com dinheiro em caixa. Os preços vão cair e todo mundo que tiver moeda estará mais rico. Então, a economia para. O mercado imobiliário para, porque, com o preço das casas caindo, você pode esperar três semanas e comprar o mesmo imóvel pagando menos. Isso está claramente acontecendo..
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