DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Semana passada voltei a Criciúma, em Santa Catarina, para participar de um evento. Foi um prazer rever uma região pujante, de bons empreendedores, de gente simpática. Entretanto, a viagem reservou-me uma grande surpresa, a condição da BR 101, a rota mais importante na ligação do Sudeste ao Sul do país e daí ao Mercosul.
Explico-me: minha última viagem a Criciúma foi em 2005; naquela ocasião havia grande expectativa com relação à duplicação da estrada, pois o Presidente de República havia há pouco estado na região dando início às obras. Eis o que encontro em novembro de 2010: a duplicação da BR 101 se inicia no trevo de Palhoça, município bem próximo de Florianópolis. De lá até o trevo de Içara e Criciúma há uma distância de, aproximadamente, 185 quilômetros.
Nos primeiros 70 quilômetros até Garopaba existem apenas três pequenos trechos duplicados e liberados. Dali até Laguna são mais 40 quilômetros em pista dupla. De Laguna a Jaguaruna volta-se à pista simples, por algo como 30 quilômetros. Finalmente, pegamos um trecho duplicado de uns 45 quilômetros até o trevo de Içara-Criciúma.
Além dos desvios e trechos a serem duplicados, acrescentaria duas observações: indo e voltando, não cruzei com mais de 100 pessoas trabalhando no trecho todo. Além disso, existem três estrangulamentos cujas obras não foram sequer licitadas: os túneis previstos nos morros do Formigão (Tubarão) e dos Cavalos (Palhoça) e a nova ponte em Laguna. Levei três horas e meia, tanto na ida como na volta, para fazer o trecho desde o aeroporto, sem que tivesse perdido muito tempo para passar pela ponte na entrada de Florianópolis.
Na melhor das hipóteses, teremos ainda algo como dois anos para o término total da duplicação das pistas. Nesse caso serão sete anos para completar uma obra de menos de 190 quilômetros, numa das estradas mais importantes do Brasil!
A parte aérea de minha viagem foi feita via Florianópolis. Numa área onde a disputa é feroz, o aeroporto da cidade é uma das grandes "não realizações" da Infraero: pequeno e acanhado, uma enorme injustiça que se faz a Santa Catarina.
Não é preciso ser técnico para antever grandes congestionamentos a partir de dezembro, quando se inicia a temporada de verão.
Mais uma vez tenho a oportunidade de observar a oceânica distância entre o ufanismo das autoavaliações do PAC e o que acontece no mundo real.
Política macroeconômica. Em nosso último artigo ("Cenário desafiante para 2011") mostrou-se a complexidade da agenda econômica que o governo deve enfrentar nos próximos anos. Por isso mesmo chama a atenção a distância entre o discurso correto e certos eventos como a reedição da CPMF, a reafirmação do trem-bala (mesmo tendo sido adiada a licitação), a retirada da Eletrobrás do cálculo do superávit fiscal (ocasião em que a estatal talvez se possa lançar ao programa de se tornar a Petrobrás da energia elétrica, sem ter a saúde financeira da petroleira) e o medíocre resultado primário de outubro, especialmente quando expurgado de truques.
Enquanto isto, o ministro da Fazenda manifestou mais recentemente o desejo de realizar um forte ajuste fiscal no próximo ano, embora não tenha ficado claro que o número buscado (3,1% do PIB) incorpore ou não os truques fiscais crescentemente utilizados.
Tal manifestação poderia ter tido alguma influência positiva nas expectativas, não fosse a sugestão de se criar um novo índice de preços, que não incorporasse elementos voláteis, como alimentação e energia. Essa ideia é um desastre, inclusive para as expectativas, pelas seguintes razões:
O índice pretendido já existe e é calculado pelo Bacen e por todos os analistas e instituições, que é o núcleo por exclusão. Lembre-se, ademais, que os preços de energia, exceto etanol, são regulados pelo governo e agências, como a Aneel.
Na mesma entrevista em que culpa os alimentos pela inflação recente, o ministro admite que ainda existe uma indexação parcial na economia. Tal lembrança é particularmente útil para entender por que os aluguéis subiram algo como 1% no último mês.
Da mesma forma, seria estimulante lembrar que há meses o item serviços vem subindo a uma taxa anual superior a 7%, o que tem tudo a ver com o excesso de aquecimento do mercado de trabalho e da economia brasileira, e pouco com os "especuladores" globais de alimentos.
Finalmente, em país de contabilidade criativa, falar de novo índice de preços chama de imediato o espectro do Indec argentino, um especialista no ramo.
Geografia econômica. Em junho passado, publiquei uma coluna falando do que me parece virá a ser uma nova geografia econômica a dominar o espaço brasileiro. Entre outras propostas, estou convencido de que a Região Sudeste vai voltar a puxar o crescimento brasileiro, se considerarmos a concentração esperada da expansão do investimento e do crescimento da produtividade aqui. Em particular, creio que São Paulo vai liderar esse movimento, pela concentração de serviços de alta geração de renda, tanto serviços para os negócios como serviços para os consumidores.
Esta proposição voltou à minha cabeça ao observar o que aconteceu aqui durante o mês de novembro. Tivemos na cidade três grandes festivais de música: F1 Rocks (Atrações: Eminem e N.E.R.D.); Ultra Musica Festival (Atrações: Fatboy Slim, Carl Cox, Moby, Above & Beyond, etc.); Planeta Terra (Atrações: Empire of the Sun, Girl Talk, Holger, Hurtmold, etc.), que mobilizaram 72 mil expectadores.
Além dos festivais, tivemos a apresentação de quatro megashows internacionais: Black Eyed Peas, Jonas Brothers, Norah Jones (o único espetáculo gratuito do período) e culminando com os grandes espetáculos de Paul McCartney. Shows menores (com menos de 6 mil espectadores cada) contaram com Tókio Hotel, Rammstein e Echo & The Bunnymen. Esses eventos tiveram um público de 240 mil pessoas.
O Salão do Automóvel, turbinado por muitos veículos importados, levou ao Anhembi nada menos que 750 mil pessoas. Por sua vez a 34.ª Mostra Internacional de Cinema teve um público de 220 mil pessoas. Finalmente, a corrida de Fórmula 1 levou a Interlagos 140 mil pessoas.
O conjunto dessas atrações teve um público total de quase um milhão e meio de pessoas, vindas de muitos lugares e movimentando fortemente a atividade econômica.
A taxa de ocupação hoteleira na cidade ficou acima de 80% na média e próxima a 100% nas áreas mais nobres, na primeira semana do mês, quando ocorreu a concentração de cinco eventos (Salão, Fórmula, etc).
Acredito que, dada a situação econômica atual, nem Nova York conseguiria atrair um movimento dessa natureza, num único mês.
Embora não se tenha números para o ano, parece seguro que o número de turistas nacionais e estrangeiros visitando a cidade, a negócio ou passeio, será pela primeira vez superior a 12 milhões de pessoas.
Peço aos eventuais leitores que não me tomem por conhecedor de bandas, pois minha modernidade se esgota no Paul McCartney. Tive, na verdade, a competente assistência do jovem Celso Florêncio de Souza.
Semana passada voltei a Criciúma, em Santa Catarina, para participar de um evento. Foi um prazer rever uma região pujante, de bons empreendedores, de gente simpática. Entretanto, a viagem reservou-me uma grande surpresa, a condição da BR 101, a rota mais importante na ligação do Sudeste ao Sul do país e daí ao Mercosul.
Explico-me: minha última viagem a Criciúma foi em 2005; naquela ocasião havia grande expectativa com relação à duplicação da estrada, pois o Presidente de República havia há pouco estado na região dando início às obras. Eis o que encontro em novembro de 2010: a duplicação da BR 101 se inicia no trevo de Palhoça, município bem próximo de Florianópolis. De lá até o trevo de Içara e Criciúma há uma distância de, aproximadamente, 185 quilômetros.
Nos primeiros 70 quilômetros até Garopaba existem apenas três pequenos trechos duplicados e liberados. Dali até Laguna são mais 40 quilômetros em pista dupla. De Laguna a Jaguaruna volta-se à pista simples, por algo como 30 quilômetros. Finalmente, pegamos um trecho duplicado de uns 45 quilômetros até o trevo de Içara-Criciúma.
Além dos desvios e trechos a serem duplicados, acrescentaria duas observações: indo e voltando, não cruzei com mais de 100 pessoas trabalhando no trecho todo. Além disso, existem três estrangulamentos cujas obras não foram sequer licitadas: os túneis previstos nos morros do Formigão (Tubarão) e dos Cavalos (Palhoça) e a nova ponte em Laguna. Levei três horas e meia, tanto na ida como na volta, para fazer o trecho desde o aeroporto, sem que tivesse perdido muito tempo para passar pela ponte na entrada de Florianópolis.
Na melhor das hipóteses, teremos ainda algo como dois anos para o término total da duplicação das pistas. Nesse caso serão sete anos para completar uma obra de menos de 190 quilômetros, numa das estradas mais importantes do Brasil!
A parte aérea de minha viagem foi feita via Florianópolis. Numa área onde a disputa é feroz, o aeroporto da cidade é uma das grandes "não realizações" da Infraero: pequeno e acanhado, uma enorme injustiça que se faz a Santa Catarina.
Não é preciso ser técnico para antever grandes congestionamentos a partir de dezembro, quando se inicia a temporada de verão.
Mais uma vez tenho a oportunidade de observar a oceânica distância entre o ufanismo das autoavaliações do PAC e o que acontece no mundo real.
Política macroeconômica. Em nosso último artigo ("Cenário desafiante para 2011") mostrou-se a complexidade da agenda econômica que o governo deve enfrentar nos próximos anos. Por isso mesmo chama a atenção a distância entre o discurso correto e certos eventos como a reedição da CPMF, a reafirmação do trem-bala (mesmo tendo sido adiada a licitação), a retirada da Eletrobrás do cálculo do superávit fiscal (ocasião em que a estatal talvez se possa lançar ao programa de se tornar a Petrobrás da energia elétrica, sem ter a saúde financeira da petroleira) e o medíocre resultado primário de outubro, especialmente quando expurgado de truques.
Enquanto isto, o ministro da Fazenda manifestou mais recentemente o desejo de realizar um forte ajuste fiscal no próximo ano, embora não tenha ficado claro que o número buscado (3,1% do PIB) incorpore ou não os truques fiscais crescentemente utilizados.
Tal manifestação poderia ter tido alguma influência positiva nas expectativas, não fosse a sugestão de se criar um novo índice de preços, que não incorporasse elementos voláteis, como alimentação e energia. Essa ideia é um desastre, inclusive para as expectativas, pelas seguintes razões:
O índice pretendido já existe e é calculado pelo Bacen e por todos os analistas e instituições, que é o núcleo por exclusão. Lembre-se, ademais, que os preços de energia, exceto etanol, são regulados pelo governo e agências, como a Aneel.
Na mesma entrevista em que culpa os alimentos pela inflação recente, o ministro admite que ainda existe uma indexação parcial na economia. Tal lembrança é particularmente útil para entender por que os aluguéis subiram algo como 1% no último mês.
Da mesma forma, seria estimulante lembrar que há meses o item serviços vem subindo a uma taxa anual superior a 7%, o que tem tudo a ver com o excesso de aquecimento do mercado de trabalho e da economia brasileira, e pouco com os "especuladores" globais de alimentos.
Finalmente, em país de contabilidade criativa, falar de novo índice de preços chama de imediato o espectro do Indec argentino, um especialista no ramo.
Geografia econômica. Em junho passado, publiquei uma coluna falando do que me parece virá a ser uma nova geografia econômica a dominar o espaço brasileiro. Entre outras propostas, estou convencido de que a Região Sudeste vai voltar a puxar o crescimento brasileiro, se considerarmos a concentração esperada da expansão do investimento e do crescimento da produtividade aqui. Em particular, creio que São Paulo vai liderar esse movimento, pela concentração de serviços de alta geração de renda, tanto serviços para os negócios como serviços para os consumidores.
Esta proposição voltou à minha cabeça ao observar o que aconteceu aqui durante o mês de novembro. Tivemos na cidade três grandes festivais de música: F1 Rocks (Atrações: Eminem e N.E.R.D.); Ultra Musica Festival (Atrações: Fatboy Slim, Carl Cox, Moby, Above & Beyond, etc.); Planeta Terra (Atrações: Empire of the Sun, Girl Talk, Holger, Hurtmold, etc.), que mobilizaram 72 mil expectadores.
Além dos festivais, tivemos a apresentação de quatro megashows internacionais: Black Eyed Peas, Jonas Brothers, Norah Jones (o único espetáculo gratuito do período) e culminando com os grandes espetáculos de Paul McCartney. Shows menores (com menos de 6 mil espectadores cada) contaram com Tókio Hotel, Rammstein e Echo & The Bunnymen. Esses eventos tiveram um público de 240 mil pessoas.
O Salão do Automóvel, turbinado por muitos veículos importados, levou ao Anhembi nada menos que 750 mil pessoas. Por sua vez a 34.ª Mostra Internacional de Cinema teve um público de 220 mil pessoas. Finalmente, a corrida de Fórmula 1 levou a Interlagos 140 mil pessoas.
O conjunto dessas atrações teve um público total de quase um milhão e meio de pessoas, vindas de muitos lugares e movimentando fortemente a atividade econômica.
A taxa de ocupação hoteleira na cidade ficou acima de 80% na média e próxima a 100% nas áreas mais nobres, na primeira semana do mês, quando ocorreu a concentração de cinco eventos (Salão, Fórmula, etc).
Acredito que, dada a situação econômica atual, nem Nova York conseguiria atrair um movimento dessa natureza, num único mês.
Embora não se tenha números para o ano, parece seguro que o número de turistas nacionais e estrangeiros visitando a cidade, a negócio ou passeio, será pela primeira vez superior a 12 milhões de pessoas.
Peço aos eventuais leitores que não me tomem por conhecedor de bandas, pois minha modernidade se esgota no Paul McCartney. Tive, na verdade, a competente assistência do jovem Celso Florêncio de Souza.
Nenhum comentário:
Postar um comentário