O PMDB não é mais aquele. Adivinha o que Dilma fez com ele...
Se um dia, pelo menos, freou-lhe a intenção malsã, o pudor de crescente número de políticos esvai-se, agora, sem encontrar resistência, assim como a lama que arremeteu morro abaixo na região serrana do Rio. Jamais se saberá quantos mortos são devidos à inépcia dos governantes. No caso de reputações que derretem como gelo, quem se importa?
Nossa expectativa é quase nenhuma. Nosso conformismo, pleno. Indignar-se? Quem há de? Desde que não mexam para pior em nossos bolsos... Se algo nos atazana, para que existe afinal a internet? Basta aderir a algum manifesto de ocasião, repassá-lo à nossa rede de contactos e tocar a vida adiante. Ela, por si, já é severa em excesso.
A mais recente eleição se deu há menos de quatro meses. A próxima será daqui a dois anos. Estamos prontos a renovar a confiança no mesmo tipo de gente, alvo, amiúde, de nossa repulsa retórica. O paradoxo não nos atormenta. O argumento é simples: em que parte do mundo é diferente? No Egito? Nos Estados Unidos? Na China? Na Rússia?
Simplicidade e verdade rimam, mas isso, convenhamos, está longe de ser uma solução. Richard Nixon renunciou à Presidência dos Estados Unidos porque mentiu ao país. Há pouco, deputados ingleses foram obrigados a devolver benefícios ilegalmente auferidos. De resto, sabe o que mais? Quer saber? Às favas com os maus exemplos alheios.
Por serem tolerados em tantos sítios, não deveríamos nos sentir forçados a tolerá-los por aqui. Parece distante o tempo em que padecíamos do complexo de cão vira-lata, feliz expressão cunhada nos anos 50 do século passado pelo escritor Nelson Rodrigues. Na política, admita-se, o complexo ainda sobrevive e estamos confortáveis com ele.
Quem liga se deputados do Mato Grosso pelejam por aposentadorias vitalícias? Se as presidências das mais importantes comissões permanentes da Câmara dos Deputados estão reservadas para sujeitos protagonistas de escândalos? Se o governador de um dos Estados mais pobres do país ganha mais do que o governador do Estado mais rico?
Quem liga se o recém-eleito presidente da Câmara dos Deputados promete a construção de novos gabinetes para colegas que mal ocupam os seus durante três dias por semana? Se às vésperas da instalação do novo Congresso descobre-se que o governo novinho em folha garantiu a fidelidade do PMDB à custa de maciça liberação de verbas?
Quem liga para a guerra entre os partidos pela ocupação de cargos estratégicos no segundo escalão do governo? Quem se pergunta quais são os planos do PMDB para a Fundação Nacional de Saúde, dona de 250 cargos de confiança, e que somente este ano poderá investir R$ 1,3 bilhão? Na partilha de cargos, a fundação coube ao PMDB.
Bendizemos o gesto da presidente Dilma Rousseff, que negou ao PMDB do deputado Eduardo Cunha (RJ) o controle de Furnas Centrais Elétricas (orçamento de R$ 1,4 bilhão). Pouco se nos damos se uma fatia vital do setor de energia do país foi entregue aos cuidados do prestativo senador José Sarney (PMDB-AP).
Por décadas, o autor de Maribondos de Fogo e Brejal dos Guajas, livros que lhe garantiram o ingresso na Academia Brasileira de Letras, mandou e desmandou na Superintendência da Receita Federal em São Paulo. Por quê? E para quê? Na oposição, o PT perdeu a voz de tanto cobrar respostas. No governo, o PT sabe todas as respostas.
Jaz nos arquivos da Receita Federal, em Brasília, uma carta do deputado Waldemar Costa Neto, ex-presidente do PL, partido cujo apoio à candidatura de Lula em 2002 custou ao PT a módica quantia de R$ 6 milhões. Costa Neto comunicou à Receita que o inspetor do aeroporto de Cumbica, em São Paulo, perdera a sua confiança.
Chocado? Por suposto que não. Quem liga? Um pouco entediado, talvez, com a natureza de um reles texto destinado a ser esquecido daqui a instantes. Assim como gorda parcela de vocês já esqueceu em quais candidatos votou em outubro último.
FONTE: O GLOBO
Se um dia, pelo menos, freou-lhe a intenção malsã, o pudor de crescente número de políticos esvai-se, agora, sem encontrar resistência, assim como a lama que arremeteu morro abaixo na região serrana do Rio. Jamais se saberá quantos mortos são devidos à inépcia dos governantes. No caso de reputações que derretem como gelo, quem se importa?
Nossa expectativa é quase nenhuma. Nosso conformismo, pleno. Indignar-se? Quem há de? Desde que não mexam para pior em nossos bolsos... Se algo nos atazana, para que existe afinal a internet? Basta aderir a algum manifesto de ocasião, repassá-lo à nossa rede de contactos e tocar a vida adiante. Ela, por si, já é severa em excesso.
A mais recente eleição se deu há menos de quatro meses. A próxima será daqui a dois anos. Estamos prontos a renovar a confiança no mesmo tipo de gente, alvo, amiúde, de nossa repulsa retórica. O paradoxo não nos atormenta. O argumento é simples: em que parte do mundo é diferente? No Egito? Nos Estados Unidos? Na China? Na Rússia?
Simplicidade e verdade rimam, mas isso, convenhamos, está longe de ser uma solução. Richard Nixon renunciou à Presidência dos Estados Unidos porque mentiu ao país. Há pouco, deputados ingleses foram obrigados a devolver benefícios ilegalmente auferidos. De resto, sabe o que mais? Quer saber? Às favas com os maus exemplos alheios.
Por serem tolerados em tantos sítios, não deveríamos nos sentir forçados a tolerá-los por aqui. Parece distante o tempo em que padecíamos do complexo de cão vira-lata, feliz expressão cunhada nos anos 50 do século passado pelo escritor Nelson Rodrigues. Na política, admita-se, o complexo ainda sobrevive e estamos confortáveis com ele.
Quem liga se deputados do Mato Grosso pelejam por aposentadorias vitalícias? Se as presidências das mais importantes comissões permanentes da Câmara dos Deputados estão reservadas para sujeitos protagonistas de escândalos? Se o governador de um dos Estados mais pobres do país ganha mais do que o governador do Estado mais rico?
Quem liga se o recém-eleito presidente da Câmara dos Deputados promete a construção de novos gabinetes para colegas que mal ocupam os seus durante três dias por semana? Se às vésperas da instalação do novo Congresso descobre-se que o governo novinho em folha garantiu a fidelidade do PMDB à custa de maciça liberação de verbas?
Quem liga para a guerra entre os partidos pela ocupação de cargos estratégicos no segundo escalão do governo? Quem se pergunta quais são os planos do PMDB para a Fundação Nacional de Saúde, dona de 250 cargos de confiança, e que somente este ano poderá investir R$ 1,3 bilhão? Na partilha de cargos, a fundação coube ao PMDB.
Bendizemos o gesto da presidente Dilma Rousseff, que negou ao PMDB do deputado Eduardo Cunha (RJ) o controle de Furnas Centrais Elétricas (orçamento de R$ 1,4 bilhão). Pouco se nos damos se uma fatia vital do setor de energia do país foi entregue aos cuidados do prestativo senador José Sarney (PMDB-AP).
Por décadas, o autor de Maribondos de Fogo e Brejal dos Guajas, livros que lhe garantiram o ingresso na Academia Brasileira de Letras, mandou e desmandou na Superintendência da Receita Federal em São Paulo. Por quê? E para quê? Na oposição, o PT perdeu a voz de tanto cobrar respostas. No governo, o PT sabe todas as respostas.
Jaz nos arquivos da Receita Federal, em Brasília, uma carta do deputado Waldemar Costa Neto, ex-presidente do PL, partido cujo apoio à candidatura de Lula em 2002 custou ao PT a módica quantia de R$ 6 milhões. Costa Neto comunicou à Receita que o inspetor do aeroporto de Cumbica, em São Paulo, perdera a sua confiança.
Chocado? Por suposto que não. Quem liga? Um pouco entediado, talvez, com a natureza de um reles texto destinado a ser esquecido daqui a instantes. Assim como gorda parcela de vocês já esqueceu em quais candidatos votou em outubro último.
FONTE: O GLOBO
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