A política escreve por linhas tortas. O Congresso poderá ganhar alguma relevância graças ao desprezo de Dilma pela atividade parlamentar e ao fato de que, na ponta do lápis, ela dispõe de maioria para aprovar o que quiser.
Há tempos o Senado e a Câmara têm papel cartorial. Só carimbam aquilo que o Executivo embala. Os lobbies migraram para a Casa Civil.
Por 16 anos, porém, os congressistas tiveram uma missão que lhes tomava tempo e energia: um lado cuidava de defender o governo; o outro, de fustigá-lo sem clemência.
Ainda que FHC e Lula se esforcem em manter vivo esse dualismo, ele já não mobiliza as duas Casas.
Primeiro, porque a oposição saiu numericamente reduzida da eleição de 2010 -e continua diminuindo, no rastro de Kassab & cia.
Segundo, porque Dilma se apropriou de bandeiras dos adversários (rigor fiscal, privatização), diluindo as diferenças programáticas.
Terceiro, porque o perfil dos líderes tucanos mudou. Aécio Neves não crê na eficácia do enfrentamento nem tem vocação para a tribuna.
E, quarto, porque o Planalto não traçou uma pauta legislativa. Confia em poder governar por meio de decretos e medidas provisórias.
Por isso tudo -e por achar que os congressistas são, em regra, picaretas-, Dilma desencanou de vez.
Nomeou um ministro sem projeção para tratar com o Congresso. Bloqueou as emendas parlamentares. Não abriu interlocução com os caciques da base (PT incluído).
A tática do desdém pode eventualmente dar certo. Em Brasília, não há força maior que a da inércia.
Mas, aos poucos, os governistas se incomodam. Percebem que não há mais um Artur Virgílio para rebater. Que nem veteranos como José Sarney e Renan Calheiros têm acesso ao Planalto. Que o presidente do PT caiu em crise depressiva.
Nada apavora mais o político do que um horizonte de irrelevância. Um jeito de o Congresso aparecer? Reaprender a legislar e a fiscalizar.
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
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